Título: Nova CPMF pode render R$ 65 bi
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Fonte: Correio Braziliense, 14/11/2010, Economia, p. 18

Segundo o IBPT, o desembolso médio do trabalhador com impostos chegaria a R$ 7.035

A criação de um imposto inspirado na Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), extinta no fim de 2007, poderá representar um acréscimo de R$ 65 bilhões na arrecadação federal, se for reeditada a alíquota de 0,38%. Para o contribuinte, isso significaria uma elevação da carga tributária per capita paga anualmente de R$ 6.700 para R$ 7.035. Os cálculos são do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT). Se a taxação com o tributo, que passaria a se chamar Contribuição Social para a Saúde (CSS), for de 0,10%, como os defensores de sua aprovação advogam publicamente, o incremento nas receitas será de R$ 40 bilhões, conforme estimativa da agência de classificação de riscos Austin Rating.

O retorno da contribuição, possibilidade admitida pela presidente eleita, Dilma Rousseff, logo após a eleição, terá maior impacto no bolso dos trabalhadores que movimentam intensamente a conta bancária e tomam empréstimos. ¿A grande massa da população brasileira está no sistema financeiro e terá que pagar o tributo. Mas os mais prejudicados serão os consumidores da classe média emergente, que estão entrando agora no mercado de consumo¿, diz Silvânia Araújo, economista-chefe da Federação do Comércio do Estado de Minas Gerais (Fecomércio). Segundo ela, essa camada da sociedade já paga altas taxas de juros para ter acesso ao crédito e verá a renda disponível para o consumo ou para a poupança reduzida.

Nas empresas, quanto maior o número de elos da cadeia produtiva, maior será a arrecadação final com a contribuição. Segundo cálculos do IBPT, o tributo aumenta os custos dos produtos no país, na média, em 1,5%. O preço de um automóvel Gol 1.0 total flex, quatro portas, que custa R$ 29.640 na tabela Fipe, poderá subir para R$ R$ 31.122 com a recriação da CPMF. Do mesmo modo, uma calça jeans de R$ 160 passará a custar R$ 162,40. O impacto sobre o preço final é maior do que a alíquota porque o cálculo é feito de maneira embutida e incide, em cascata, em todas as etapas de produção.

Medieval ¿Esse é um tributo medieval, porque não é aplicado sobre a geração de riquezas e sim sobre a circulação do dinheiro. Por isso, distorce a economia e reduz a eficácia do sistema tributário¿, avalia o economista Cláudio Gontijo, professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). A projeção do IBPT é que a arrecadação de impostos no país chegue a R$ 1,270 trilhão neste ano. O impacto de R$ 65 bilhões, portanto, aumentaria a carga tributária em 5,12% em 2011, com as receitas subindo para R$ 1,335 trilhão.

A volta da CPMF foi articulada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva com o apoio de vários governadores, sob o argumento de aumentar os recursos para a saúde. Mas causou indignação no setor produtivo e na sociedade civil. A Confederação Nacional das Indústrias (CNI) se declarou ¿radicalmente contra¿. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL) aderiram às manifestações contrárias ao retorno do tributo. O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, afirmou que a possibilidade de recriar o tributo deve sair da pauta das discussões. ¿A Dilma já disse que não vai mandar proposta para o Congresso e se ninguém falar mais nesse assunto, acho que ele acabou¿, disse.

Peso maior em itens populares

O presidente da fabricante de malhas Colortêxtil, Flávio Roscoe, explica que o impacto da CPMF pode chegar a 1,3% do preço do produto final na cadeia de confecções. Segundo ele, no varejo, em roupas destinadas à população de menor poder aquisitivo, a margem de lucro gira em torno de 50%. Mas, quando se trata de marcas renomadas, pode chegar a 300% ou mais. ¿No mercado da moda, a CPMF representa percentualmente menos em relação aos ganhos¿, disse. Isso significa que, nos produtos de maior valor agregado, a contribuição é diluída. Naqueles com margem apertada, ela pesa mais no bolso dos fabricantes e revendedores.

¿Nas empresas que trabalham com maior percentual de lucro, ninguém vai mudar preço por causa da CPMF. Mas, no caso dos populares, fica difícil não repassar para os preços¿, observou o empresário. Se o tributo for recriado, o aperto tributário será acrescido com o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), cuja alíquota foi elevada pelo governo como forma de compensar as perdas de arrecadação originadas com o fim da cobrança da CPMF a partir de janeiro de 2008. ¿Sobre isso, ninguém está falando¿, lembrou Roscoe.

Edwaldo Almada, presidente do Conselho de Política Tributária da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), explica que, numa cadeia longa como a automotiva, é praticamente impossível calcular os impactos da CMPF se a conta for feita a partir da primeira etapa de produção. Ela começa com a extração do minério, que é matéria-prima do aço, e da borracha, insumo para os pneus.

¿Simplificando, e sem levar em conta as etapas anteriores à produção do minério, são oito elos. Como a contribuição é cumulativa, o impacto é considerável¿, observou Almada. ¿Toda vez que cria um tributo, o governo reduz a capacidade de consumo.¿ Além disso, a contribuição compõe o preço dos produtos, que serve de base para a incidência de outros impostos, aumentando ainda mais os custos finais. (ZF)