Título: Autoprodutor quer fim de tarifa para participar de leilão
Autor: Capela, Maurício
Fonte: Valor Econômico, 07/02/2007, Especial, p. A16

O próximo leilão de geração de energia nova, que acontece em maio próximo, pode marcar a volta dos autoprodutores aos lances. Responsáveis por um investimento anual superior aos R$ 3 bilhões entre o fim da década de 90 e início dos anos 2000, os autoprodutores, que são grandes companhias como Votorantim e Vale do Rio Doce, pedem o fim da cobrança de um valor adicional embutido no preço de seus empreendimentos, conhecido como Fator Alpha.

O pleito foi detectado pela Câmara Americana de Comércio (Amcham), que pela quarta vez realiza um estudo onde avalia a atuação da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), governo federal e Legislativo. O trabalho ouviu representantes de 42 companhias da área de energia, como distribuidoras, geradoras, transmissoras e comercializadoras do insumo. Apesar de convidadas, as empresas estatais do setor não participaram da coleta de dados.

David Waltemberg, sócio da Advocacia Waltemberg e presidente do Comitê de Energia da Amcham, explicou que o relatório foi entregue à Aneel e à Casa Civil. "Na Aneel, fomos recebidos pelo Jerson Kelman e superintendentes. O encontrou durou mais de duas horas e foi positivo", conta Waltemberg. Kelman confirma o recebimento do estudo, mas não cabe à agência a mudança na regra pedida pelos autoprodutores. Ela depende de uma decisão do poder Legislativo.

O subchefe-adjunto de análise e acompanhamento de políticas governamentais da Casa Civil, Roberto Rodrigues, recebeu o estudo, mas diz que a reivindicação dos autoprodutores não chegou a ser debatida. A entidade representante dos autoprodutores, porém, encaminhou a demanda ao Ministério de Minas e Energia.

A boa impressão do encontro com a Aneel, contudo, refletiu o que o estudo da Amcham também já demonstrava. Em linhas gerais, o trabalho mostrou que os agentes do setor avaliam positivamente a agência, apesar de considerarem que há um excessivo grau de interferência do governo na agência reguladora. "A agência mantém seu caráter autônomo", diz Kelman.

"Para nós, essa ingerência pôde ser vista na questão da existência ou não de gás para a geração termelétrica", comenta Waltemberg. Já Rodrigues, da Casa Civil, defende que o governo atue nos limites do estabelecimento das políticas do setor. "Nossa interpretação diverge do mercado e às agências cabe somente regular e fiscalizar segundo a política estabelecida pelo governo."

O fato é que o governo é avaliado negativamente no segmento de energia, por conta de sua interferência e por contingenciar recursos da Aneel. Rodrigues concorda com o problema, mas argumenta que o contingenciamento de gastos faz parte de uma política que atinge todos os órgãos de governo. "De fato o contingenciamento limita em parte a capacidade de fiscalização da agência, mas toda a despesa do governo passa por isso", diz.

A agência, porém, foi melhor avaliada em relação aos critérios usados nos reajustes tarifários, na agilidade e na clareza dos atos normativos, na capacitação do corpo técnico e na capacidade de atuar na solução de disputas. "Hoje, estão sendo contratados 800 funcionários concursados para trabalhar na agência", lembra Waltemberg.

No entanto, os agentes do setor ainda apontam a falta de uma melhor adequação da metodologia e parâmetros na elaboração dos regulamentos e na participação efetiva da sociedade no processo regulatório. Além disso, a regulação de livre acesso ao sistema de transmissão e distribuição por parte dos consumidores livres ainda não estaria adequada.

"Quanto ao Legislativo, pensamos que é necessário melhorar o acesso dos investidores autoprodutores aos leilões de energia. Isso aumentaria a competição", afirma o presidente do Comitê de Energia da Amcham.

Segundo Rodrigues, a reivindicação do setor sobre a necessidade de maior espaço de participação dos agentes é contemplada pelo projeto de lei 3337, que torna obrigatória a todas as agências reguladoras a realização de audiências públicas em caso de alteração da regulação existente.