Título: De volta para o futuro
Autor: Cotias, Adriana
Fonte: Valor Econômico, 19/10/2006, EU & Investimentos, p. D1

Aos 24 anos, o estudante de engenharia da Escola Politécnica da USP Daniel Matsumara já se tornou um especialista no mercado futuro. Há três meses, ele se candidatou a um estágio na Dibran DTVM para operar minicontratos de dólar e Ibovespa e hoje atua como consultor financeiro. Na distribuidora, Matsumara tem iniciado jovens como ele, fornecendo a orientação necessária para que negociem os minis pelo WebTrading, o sistema de negociação da Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F) pela internet. Na sua carteira há, por exemplo, um estudante de administração, de 20 anos.

Esse é um retrato do público que começa a experimentar o complexo mundo dos derivativos, até pouco tempo restrito a tesourarias de bancos e fundos de pensão. É também um reflexo dos esforços da BM&F para chegar até o varejo. Algumas iniciativas já aparecem nas estatísticas. Um ano após aderir à onda do "market maker" (formador de mercado) e credenciar mais de uma dezena de corretoras para dar liquidez aos minis, o número de contratos negociados quase quintuplicou - foram mais de 700 mil em setembro - e o giro mensal encosta nos R$ 13 bilhões.

Pode ser pouco se comparado ao mercado americano - a Chicago Mercantile Exchange, por exemplo, movimenta cerca de US$ 1 bilhão diariamente só nos minis do S&P 500 -, mas já é um sinal de que os derivativos começam a cair no gosto do aplicador local. Com a segurança de que há propostas de compra e venda firmes, o pequeno investidor já se sente mais à vontade para usar os minis para proteger a carteira ou para alavancar seus rendimentos.

"Com os juros caindo, o investidor começa a olhar os mercados futuros com outra atenção", diz o presidente da Dibran, Carlos Zapparoli. E com o Brasil galgando o "investment grade" (grau de investimento, o selo de baixo risco conferido pelas agências de classificação de crédito), a capacidade de atração do pequeno investidor estrangeiro é grande também, acrescenta o gerente de BM&F da SLW Corretora, Raffi Ohanes Dokuzian.

Ele cita o caso de um americano radicado em Juazeiro (BA) que já tinha operado derivativos nos Estados Unidos e manifestou interesse de fazer o mesmo por aqui. E com uma avalanche de lançamentos de ações, o investidor que negocia papéis pelo home broker da Bovespa naturalmente começa a incluir os minis de Ibovespa nas suas transações. Para o diretor de pregão da BM&F, José Carlos Branco, em alguns anos, o giro da bolsa de futuros pode abocanhar a mesma fatia de pessoas físicas que hoje se vê na Bovespa, de cerca de 30%.

Para tanto, o programa de "market maker" acabou de ser calibrado e agora as 18 corretoras participantes terão direito a créditos em dinheiro não só pelo desempenho operacional, mas também pelo ingresso de novos clientes. A previsão é de que os incentivos acabem em setembro do ano que vem. "É prerrogativa da bolsa estender o programa por mais tempo, mas o que se espera é que ele fique inócuo o quanto antes", diz Branco.

As corretoras eleitas se comprometem a negociar um mínimo de 150 contratos ao dia, mantendo ofertas de compra e venda para pelo menos 10 contratos nos minis de Ibovespa, boi gordo e café e de 20 no dólar. "O formador tem sido fundamental para dar condições de liquidez para o pequeno investidor, é a segurança de que ele pode entrar ou sair do mercado a um preço justo", diz o diretor da Interfloat Roberto Lombardi de Barros. "Os minis podem ser instrumentos importantes de gerenciamento de risco no dia-a-dia, além de dar oportunidades nos momentos de maior volatilidade."

No WebTrading já são quase 1,5 mil investidores cadastrados, contabiliza Branco. A BM&F criou uma cartilha com todos os meandros dos minicontratos e na internet já é possível simular as operações, apurando ganhos e perdas conforme a aposta.

Um investidor que depositasse R$ 20 mil em garantia para comprar 10 contratos (abril de 2006) de Ibovespa em 13 de março, aos 37.370 pontos, e vendesse dois dias depois teria embolsado R$ 1,14 mil, quando o contrato atingiu 37.940 pontos. Se nesse mesmo intervalo, estivesse num fundo passivo que acompanha o Ibovespa à vista, perderia 0,26%.

O simulador está sendo aprimorado e num futuro próximo, conta Branco, o sistema vai usar as cotações em tempo real, dando toda a dimensão para o investidor das suas escolhas.

Por enquanto, quem tem usado os minis são investidores que fazem apostas direcionais. Mas a previsão é de que com a democratização do mercado futuro, estratégias de proteção também sejam montadas. "Isso será fruto de um processo educativo, é uma questão de tempo", diz o gerente da Coinvalores Otávio Sant'Anna.

Ele dá o exemplo: se um aplicador com uma carteira de ações de R$ 19,8 mil no início de setembro, composta por Petrobras, Vale e Gerdau fizesse hedge no mini de Ibovespa vendendo três contratos teria blindado o revés da Bovespa que sucedeu o escândalo do dossiê. Em 25 de setembro, ele teria perdido 6,65% no mercado à vista, mas embolsado R$ 1,32 mil no Ibovespa futuro e preservando o valor que tinha no começo do mês.