Título: Desenvolvimento agrícola e meio ambiente
Autor: Buranello, Renato
Fonte: Valor Econômico, 07/02/2007, Legislação & Tributos, p. E2

O direito ambiental relaciona-se com o conjunto de condições, normas, influências e interações de ordem física, química e social, que, permite, abriga e rege a relação das pessoas físicas e das empresas com o meio ambiente em todas as suas formas, segundo o artigo 3º da Lei nº 6.938, de 1981. Entre seus princípios, destacam-se o da preservação, da participação, do desenvolvimento sustentável e da responsabilidade civil objetiva. A adequada regulação e determinação de competências na proteção do meio ambiente representam um fator condicionante entre o desenvolvimento econômico e a sua efetiva proteção. A busca deste ponto de equilíbrio exige um adequado planejamento que tenha por critério os limites da sustentabilidade.

Dentro deste contexto, o complexo da atividade agroindustrial ganha enorme relevo no desenvolvimento do agronegócio brasileiro. Importa destacar a compatibilidade que deve existir entre as ações de política agrícola, cujo escopo visa proteger o meio ambiente, garantir o seu uso racional e estimar a recuperação dos recursos naturais e o efetivo planejamento agrícola das atividades agroindustriais, agropecuárias, pesqueiras e florestais, segundo o artigo 187 da Constituição Federal.

Para tanto, incumbe ao poder público exigir, na forma da lei, para a instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de degradação do meio ambiente, um estudo prévio de impacto ambiental, como também controlar a produção, comercialização e emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco ao meio ambiente, nos termos da Constituição Federal. É nesse contexto que o licenciamento ambiental torna-se um instrumento eficaz de prevenção à degradação irresponsável do meio ambiente.

Trata-se de um procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e operação de empreendimentos e atividades que utilizem recursos naturais consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possuam causar degradação ambiental.

O licenciamento é dividido em três fases: 1) Licença prévia; 2) Licença de instalação ou de operação; e 3) Licença de funcionamento. Em todas elas é comum a elaboração do estudo prévio de impacto ambiental e o seu respectivo relatório (EIA/Rima). Ocorre que, atualmente, a competência para outorgar a licença ambiental é comum à União, aos Estados e aos municípios, o que torna o processo para a sua obtenção confuso e inseguro, eis que, a rigor, todos estes entes governamentais podem intervir na atividade empreendedora independentemente do seu tamanho ou impacto ambiental.

Entretanto, um importante passo para a melhoria do sistema jurídico voltado a esta área já foi iniciado. A regulamentação do artigo 23 da Constituição Federal certamente impulsionará os investimentos e dará segurança jurídica para que surjam novos empreendimentos, pois eliminará a competência concorrente que traz inúmeros entraves à ordem econômica e ao crescimento sustentável. Todavia, qualquer mudança deve ser encarada com cautela, pois não poderá ferir o direito adquirido de alguns setores que já iniciaram suas atividades econômicas.

-------------------------------------------------------------------------------- Um processo ágil e desprovido de rompantes ideológicos deve permear a atuação dos agentes públicos competentes --------------------------------------------------------------------------------

O processo para obtenção da licença ambiental em si - e, em especial, os prazos para a sua respectiva concessão - deve, necessariamente passar por uma reformulação sem que a licença ambiental se transforme em autorização pública para a pilhagem dos recursos naturais existentes no Brasil. Naturalmente que as boas experiências advindas do atual modelo devem ser preservadas. Contudo, entendemos que um processo ágil e desprovido de rompantes ideológicos deve permear a atuação dos agentes públicos competentes para este mister.

Entendemos que a adoção de um sistema eletrônico reduzirá drasticamente o tempo que atualmente se despende, além do que, ressalvados os casos de imperativa segurança nacional, imprimirá uma maior transparência para um setor onde ainda impera o viés político em detrimento do técnico. Ademais, é um equívoco imaginar que a sistematização de um processo eletrônico para a obtenção da licença ambiental seja um disparate, até porque importantes iniciativas já estão sendo implementadas em outros órgãos governamentais, como por exemplo, os processos para registro de marcas e concessão de patentes junto ao Instituto Nacional da Propriedade Intelectual (INPI) e a recente execução fiscal virtual divulgada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Neste diapasão, cumpre-nos reafirmar que de nada adianta a implantação de um processo nestes moldes se persistir a mentalidade que permeia as decisões sobre a concessão da licença. Como bem ressaltado, vigora ainda, nos órgãos competentes, um viés político que deve ser expurgado caso se pretenda melhorar, efetivamente, o sistema. Com o ingresso de pessoal técnico capacitado e a medida ora proposta, não resta dúvida de que o processo para a obtenção da licença irá atingir os patamares de celeridade que tanto almejam os investidores. É de suma importância ainda que práticas de gestão ambiental se viabilizem junto aos empreendedores, em especial políticas de governança corporativa que privilegiem as pessoas envolvidas direta ou indiretamente em todo o processo empreendedor a fim de garantir-lhes qualidade de vida.

Cabe assinalar, finalmente, que toda e qualquer mudança deve guardar uma profunda relação com as determinações constitucionais, em especial o princípio contido no artigo 170 e seus respectivos incisos, cuja redação determina como um dos pilares para uma ordem econômica coesa a preservação do meio ambiente.

Renato Buranello e Rafael Spadotto são advogados e, respectivamente, sócio e coordenador da área de direito ambiental do escritório Buranello & Passos Advogados

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações