Título: Aspectos legais das operações de private equity
Autor: Rosenbaum, Léo
Fonte: Valor Econômico, 19/10/2006, Legislação & Tributos, p. E2

Estima-se que as operações de private equity e venture capital no mercado doméstico movimentarão aproximadamente US$ 1 bilhão nos anos de 2006 e 2007 e a expectativa é que este volume triplique até 2010. O aumento da importância dessas operações no âmbito da economia mundial e, conseqüentemente, da brasileira, demanda a necessidade de um maior esclarecimento quanto ao seu adequado enquadramento jurídico.

O termo private equity, usualmente utilizado no jargão de mercado, se traduzido literalmente ao nosso idioma não apresentaria uma definição apropriada do instituto. Na prática as operações de private equity envolvem um determinado investidor/sócio capitalista (geralmente fundos de investimento) que adquire a participação em uma empresa através da subscrição das quotas/ações em uma operação particular entre as partes, que, via de regra, não envolve o mercado de títulos e valores mobiliários.

Nessas operações há um considerável aporte de capital na empresa receptora do investimento e o atrativo está no baixo custo financeiro do capital, já que o investidor ingressa na empresa como sócio ou acionista com todos os direitos que lhe são inerentes, inclusive assumindo responsabilidades na gestão da empresa e o interesse primordial é, logicamente, o de atingir o maior índice de retorno do investimento com o menor risco possível.

O que diferencia as operações de private equity das de venture capital (em português capital de risco) é que aquelas são geralmente efetuadas em empresas que já se encontram em fase operacional, enquanto que estas geralmente são efetuadas em empresas cujo estágio é pré-operacional ("start-ups") envolvendo, assim, um maior risco ao investidor. Na prática, ambos os termos denotam operações jurídicas semelhantes.

-------------------------------------------------------------------------------- As operações de private equity e venture capital são feitas basicamente através da celebração de contratos atípicos --------------------------------------------------------------------------------

No Brasil a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), através da Instrução nº 391, regulamentou a constituição e o funcionamento dos fundos de investimento em participações, concedendo importantes instrumentos para o fomento destas operações em nosso país. As operações de private equity e de venture capital são efetuadas, basicamente, através da celebração de contratos atípicos, segundo as regras ordinárias de nossa legislação substantiva - artigo 425 do Código Civil. Inicialmente as partes firmam um contrato que pode possuir diversas denominações - "term sheet", memorando de entendimentos, protocolo de intenções ou outras - que basicamente tem o objetivo de estabelecer o "affectio societatis" inicial, em que se estabelecem as vigas mestras que regerão a relação jurídica entre as partes e que prevêem os principais interesses e preocupações do sócio-investidor e dos fundadores da empresa. A natureza jurídica deste contrato é a de um contrato preliminar, regulado pelos artigos 462 a 465 do Código Civil.

Geralmente nestes contratos são previstas as condições do due dilligence (auditoria legal e contábil) em que se apuram todas as contingências da empresa receptora do investimento e se permite o "valuation" da empresa (avaliação econômico-financeira) que então municiará o investidor com as informações necessárias para elaborar a sua proposta de aquisição de participação. Muitas vezes os sócios/acionistas das empresas receptoras já procedem com esses trabalhos preliminares, elaborando um business plan (plano de negócios) e estabelecendo o valor estimado da empresa, para então propor a potenciais investidores a aquisição de parcela de seu capital social.

A etapa posterior à do contrato preliminar é a da elaboração do próprio contrato de investimento ("investment agreement"), outro contrato atípico, que, com a aplicação do princípio "pacta sunt servanda", concede às partes a liberdade de estruturar as operações sob as mais diversas modalidades jurídicas, considerando questões relacionadas ao direito societário, tributário, civil, trabalhista etc. Através deste contrato é que é realizado o aporte de capital.

Com a assinatura do contrato de investimento, serão elaborados os documentos que serão levados ao registro público para dar o caráter público à participação do novo sócio. Neste particular, dependendo da modalidade societária (sociedade anônima, limitada ou outra), as atas, estatutos sociais e demais livros societários deverão ser adaptados da forma como prevista no contrato de investimento, sendo que em muitos casos são elaborados acordos de acionistas/quotistas para estabelecer questões relacionadas ao direito de preferência na venda de ações/quotas, quórum de votação de determinados assuntos estratégicos (por exemplo, "special majority vote" ou voto afirmativo), opções de compra/venda de participação, possibilidades de saída do investidor e outras.

Inúmeros são os detalhes de tais operações, que, entretanto, quando encaradas sob o prisma da simplicidade jurídica, traduzem basicamente a venda de participação societária a investidores profissionais, aplicando-se às operações as regras previstas no Código Civil e na legislação societária.

Léo Rosenbaum é advogado e sócio-titular do escritório Rosenbaum Advocacia

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