Título: PAC: mais debate técnico, menos questões partidárias
Autor: Valor Online
Fonte: Valor Econômico, 09/02/2007, Opinião, p. A14

Se governo e Congresso usarem de alguma habilidade política estratégica para conservar o perfil federativo do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), eles poderão barrar as tentativas dos governadores de compartimentar o programa e tirar-lhe a lógica integrativa. A república dispõe hoje, bem ou mal, de um Congresso renovado e de um Executivo que mostra maior disposição a executar do que no primeiro mandato. Os dois poderes, por si, representam os interesses amplos da Federação, que deveriam ser contemplados no plano de desenvolvimento. Fora isso, no primeiro mandato de Lula consolidou-se como fórum de debates o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), que, se teve resultados positivos ao formular consensos intersetoriais e sociais, amarga uma grande frustração por não ter produzido nada (ou muito pouco) que fosse levado a sério no debate de políticas públicas e ou no foro parlamentar.

Congresso e CDES, juntos e em teoria, representam a maior síntese do Brasil político, econômico e social. O Legislativo é representado por todas as unidades da Federação e, nas comissões temáticas por onde certamente passarão as propostas do PAC que dependem de aprovação legislativa terão que fazer concessões obrigatórias que contemplem todas as unidades federativas - e não apenas as doze que se uniram na "frente de governadores". Os gargalos infra-estruturais aos quais o PAC deu grande importância teriam, na avaliação final, uma enorme contribuição do CDES, onde os setores produtivos e os trabalhadores, vítimas diretas da estagnação econômica, podem dar uma visão muito mais real. Se os dois trabalhassem juntos, o Congresso não apenas seria obrigado a dar uma trégua na luta político-partidária e olhar o país de frente, como poderia aproveitar a visão do Brasil real e o exercício de consenso que o CDES fez todo esse período.

Se o Legislativo tomar para si a discussão do PAC como um simples exercício de poder de veto político, ou de interesses estaduais, locais ou mesmo pessoais, o plano corre o risco de tornar-se um calhamaço de papel sem valor, mas um entre os muito acumulados em décadas perdidas. Talvez a melhor forma de despartidarizar - e até mesmo de tornar o governo Lula o único beneficiário dessas ações - é privilegiar a avaliação da realidade e as soluções técnicas e apenas a partir daí propor soluções alternativas.

Seria uma mudança e tanto na ação parlamentar. Afinal, todo o ano passado foi tomado por uma política maniqueísta, onde o mal era qualquer proposta que viesse do governo e o bem qualquer uma que se contrapusesse a ela - ou vice-versa, dependendo do personagem em questão. Passado o período eleitoral, e feito um balanço do que o país andou no ano passado, é de se concluir que baixar os ânimos e racionalizar o debate - isso o quanto antes, já que daqui a pouco as eleições municipais tenderão a radicalizar de novo as posições - pode ser um bom conselheiro. O fato que diz respeito a todos, afinal, é que o país sofre grandes gargalos ao crescimento, as regiões mais pobres estão isoladas de qualquer alternativa de desenvolvimento e até o simples acesso à população de baixa renda a serviços mais sofisticados - como uma viagem de avião - criam uma demanda impossível de atender na atual situação.

Quando foi criado o CDES, ele foi imediatamente esvaziado pelo medo de que tinham os parlamentares de serem substituídos por conselhos informais da sociedade civil. Talvez tenha chegado a hora de o Congresso, depois dos dois péssimos anos que viveu na legislatura passada, tenha agora algumas atitudes de humildade e olhe o Brasil que abriga gente, fabrica pobres e distribuiu mal a renda. E certamente não vai conseguir isso se se radicalizarem as lutas por espaço político no Legislativo e a disputa fratricida por lugares no ministério de Lula. Talvez uma forma de neutralizar isso seja a de anunciar logo as mudanças ministeriais, curar de imediato as feridas e propor um diálogo entre brasileiros. Quanto mais brasileiros participarem de um diálogo organizado, mais se terá condições de avaliar a qualidade e as deficiências do Programa de Aceleração do Crescimento.