Título: STF julgará petistas às vésperas do 1º turno
Autor: Basile , Juliano
Fonte: Valor Econômico, 20/09/2012, Política, p. A12

O ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu será julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) pelo crime de corrupção na semana que antecede o primeiro turno das eleições porque a Corte decidiu, ontem, fatiar ainda mais o julgamento do mensalão. O relator, ministro Joaquim Barbosa, e o revisor, ministro Ricardo Lewandowski, verificaram que o item sobre compra de votos é muito extenso, com 23 réus. Eles optaram por julgar primeiro aqueles que são acusados de corrupção passiva - receber dinheiro indevidamente - e, depois, aqueles que teriam cometido corrupção ativa - organizar o envio dos repasses e os nomes dos beneficiários. A justificativa foi a de que é preciso racionalizar os trabalhos. "Combinei com o revisor de tratar na próxima semana os crimes de corrupção ativa", afirmou Barbosa aos demais ministros da Corte, que não fizeram objeção à proposta.

Na prática, a decisão de fatiar o já fatiado julgamento faz com que o Supremo analise primeiro a situação dos políticos que receberam saques no Banco Rural através de autorizações feitas pelas agências do publicitário Marcos Valério. Pela estimativa de Barbosa, apenas a partir de quinta-feira da semana que vem a Corte vai julgar se houve ou não ordens de Dirceu, do ex-presidente do PT José Genoino e do ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares para orientar os repasses. A votação sobre esses três réus vai entrar pela primeira semana de outubro. O julgamento do mensalão está dividido em sete itens e o STF está no quarto, que foi, portanto, subdividido.

Ontem, Barbosa pediu a condenação dos réus do PL (atual PR) e do PTB. Na lista do PL estão o deputado Valdemar Costa Neto (PR-SP), o ex-deputado Bispo Rodrigues (RJ) e o ex-tesoureiro da legenda Jacinto Lamas. Na lista do PTB há os nomes de Roberto Jefferson, presidente da legenda, do ex-deputado Romeu Queiroz (MG) e do ex-tesoureiro Emerson Palmieri. Segundo o voto de Barbosa, todos devem ser condenados por corrupção passiva. No caso de Valdemar e de Lamas, também devem ser impostas punições por formação de quadrilha e lavagem de dinheiro. No caso de Bispo Rodrigues, acusado de receber R$ 150 mil, a de lavagem. O ministro interrompeu seu voto na hora em que votaria a acusação de lavagem contra os réus do PTB, o que será feito hoje, quando ele também vai votar a acusação de lavagem contra o ex-deputado José Borba (PMDB-PR) - a última antes de ele entrar na análise da antiga cúpula do PT. Borba recebeu R$ 200 mil da agência SMP&B, de Marcos Valério. Na segunda-feira, o relator pediu a condenação dos réus do PP.

Barbosa derrubou a tese de que o dinheiro recebido pelos políticos foi destinado ao pagamento de campanhas e fez uma crítica direta à antiga cúpula petista. "Partidos políticos não são doadores universais de dinheiro para outros partidos políticos especialmente por longo tempo e por sistemática tão suspeita", disse o relator. "Se os réus pretendessem pagar dívidas de campanha, por que receber os recursos de maneira tão sofisticada?", indagou o ministro, referindo-se aos réus do antigo PL. "Trata-se de grave interferência da função parlamentar", enfatizou.

Ao explicar a sistemática sofisticada de repasses, Barbosa afirmou que Valdemar recebeu R$ 8,8 milhões com a ajuda de Jacinto Lamas e da empresa Guaranhuns, valendo-se de mecanismos ilegais e sem deixar rastros no sistema financeiro. Lamas recebia o dinheiro de Simone Vasconcelos, ex-diretora financeira da SMP&B. Já a Guaranhuns teria simulado uma operação financeira com a agência e, depois, um empréstimo a Costa Neto, o qual, segundo a defesa do parlamentar, teria sido concedido para o pagamento de dívidas de campanhas. "O argumento é completamente inconsistente", avaliou o ministro. "A Guaranhuns seria uma espécie de vidro pouco transparente."

Barbosa disse que Jefferson confirmou em depoimentos que recebeu R$ 4 milhões do PT por meio das empresas de Valério. "Jefferson sabia da existência do que ele chamou de mesada. Mais do que isso: ele sabia que José Carlos Martinez (ex-presidente do PTB) vinha recebendo recursos em espécie desse mesmo esquema. Por fim, quando ele passou a ser o beneficiário, tinha consciência de que esses pagamentos eram feitos em troca da consolidação da base aliada do governo. Ele negou os crimes, mas admitiu que tinha conhecimento", concluiu Barbosa.

Já Romeu Queiroz "solicitou vantagem indevida ao então ministro dos Transportes", acrescentou o relator, referindo-se a Anderson Adauto, que teria encaminhado o pedido a Delúbio Soares e é acusado de corrupção ativa e lavagem de dinheiro no processo.

O único voto pela absolvição foi dado a Antonio Lamas, responsável por entregar a Valdemar Costa Neto um dos repasses feitos a mando do PT. "Ocasionalmente lhe pediram um favor. Ele fez e não se ouviu mais falar dele", comentou Joaquim Barbosa. O julgamento será retomado hoje às 14h.