Título: O ministro contra-ataca
Autor: Leite, Larissa
Fonte: Correio Braziliense, 17/11/2010, Brasil, p. 11

Ponto a ponto Fernando Haddad

Titular da Educação aproveita audiência no Senado para defender o exame e projetar 2011, mas admite: houve falhas em todas as edições

Era para ser uma manhã de explicações sobre os erros ocorridos durante a última edição do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), realizada em 6 e 7 de novembro. Mas na audiência pública de ontem, na Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado Federal, o ministro da Educação, Fernando Haddad, aproveitou boa parte das quase quatro horas de ¿sabatina¿ para reiterar que o direito de todos os estudantes inscritos no Enem 2010 está assegurado e fazer previsões sobre o Enem 2011 ¿ as principais mudanças são a possibilidade da realização de dois exames anuais, a partir do ano que vem, e uma alteração no período de validade da prova, que passaria a ser de dois anos (atualmente, a nota obtida é válida por um ano).

Em declaração, no mínimo, polêmica, o ministro afirmou que houve falhas em todas as 13 edições do exame. ¿Não houve uma única edição em que não tivemos de enfrentar problemas técnicos. Mas sempre que há um problema, há uma solução cabível. A questão é que, antes de 2009, o Enem não tinha comparabilidade. Hoje, ele responde por 83 mil vagas de universidades e 150 mil vagas por meio do Prouni¿, afirmou.

Em relação ao Enem 2010, o ministro assumiu a existência de dois erros: ¿Um aparentemente é de responsabilidade do Inep e o outro, de responsablidade da gráfica, assumidamente¿. O primeiro erro citado por Haddad diz respeito à troca de cabeçalhos no cartão-resposta, em relação ao caderno das provas. A respeito disso, o ministro afirmou que já foi aberta uma sindicância para apurar as responsabilidades dentro do instituto. ¿A sindicância já iniciou, e o problema vai ser apurado com toda a transparência. O procedimento no Inep é sempre o mesmo: faz-se a apuração e dá-se o direito de defesa. Apura-se a responsabilidade, que pode ser coletiva, e não individual, e manda-se para os órgãos de controle¿, explicou. O ministro não soube dizer, no entanto, qual procedimento ocasionou a falha, e ainda não deu uma previsão de quando a sindicância teria um resultado.

O segundo erro citado foram as falhas de impressão no caderno amarelo do Enem 2010, que foram assumidas pela gráfica RR Donnelley, em carta enviada ao Ministério da Educação (MEC). O ministério calcula que cerca de 2 mil estudantes podem ter sido prejudicados por este problema ¿ esse também seria o número de estudantes que, em princípio, teriam direito a fazer um novo exame. Ontem, no entanto, o ministro informou que o consórcio formado pelas instituições Cespe e Cesgranrio, responsável pela aplicação e avaliação da prova, estão analisando as 113 mil atas de prova e somente a partir da apuração dessa análise, o MEC poderá estimar quantos e quais alunos deverão refazer a prova. Segundo o ministro, qualquer falha objetiva assinalada nas atas será considerada para a realização de novo exame. Assim, não apenas estudantes que não tiveram a prova amarela trocada poderão fazer a prova, ainda sem data ainda definida. ¿A orientação que foi dada ao consórcio é que todas as ocorrências passem por um pente-fino. Se houver registro em ata de que faltou cartão de respostas para substituir o cartão que foi entregue, ou uma ocorrência dessa natureza, será considerada¿, disse Haddad.

Dois exames A partir de 2010, já teria sido possível fazer dois exames. Só não foi feito por causa da espera do resultado de um inquérito da Polícia Federal sobre o vazamento do gabarito da prova da OAB, no início do ano. Como era o Cespe quem havia aplicado a prova, tivemos de esperar a investigação. Mas não tenho dúvida de que a saída é essa. Se diminui o número de inscritos, aumenta o número de instituições que podem participar da aplicação, da impressão, da distribuição, e dilui qualquer tipo de risco. Em 2011, possivelmente teremos duas provas. Vai depender muito da decisão que for tomada em janeiro. Mas entendo que temos que fazer um esforço para realizar mais de uma edição. A manutenção de um modelo de prova única por ano é muito difícil. Tem que ser superado definitivamente.

Nova prova Temos agora um trabalho de garimpagem para verificar o número de alunos que vão ser atendidos por uma segunda edição do Enem 2010. A orientação que foi dada ao consórcio é que todas as ocorrências passem por um pente-fino. Se houver registro em ata de que faltou cartão de respostas para substituir o cartão que foi entregue, ou uma ocorrência dessa natureza, será considerado. Tudo o que for possível apurar objetivamente, vai ser considerado. Não posso fechar um número de alunos afetados. Essa é uma semana de apuração, já que todo o material administrativo de sala de aula retornou à base, tanto da Cesgranrio quanto do Cespe. Eles estão registrando todas as ocorrências, para fazer um levantamento, uma apuração, a mais rigorosa possível, para não prejudicar nenhum estudante.

Data Sem um balanço do número de estudantes e dos estados mais atingidos, fica difícil anunciar uma nova data, porque os locais terão que ser alocados, e as datas terão que ser conferidas com o calendário universitário e acadêmico. Quero crer que até o começo da semana que vem, talvez até o fim desta semana, já exista um anúncio oficial por parte do Inep. A prova será possivelmente em um único dia, mas não necessariamente. Vamos verificar se teve alguma outra ocorrência, de alguém que no domingo tenha tido alguma dificuldade. Temos compromisso, o que será mantido, de entregar as notas no prazo combinado. Isso tudo será necessariamente feito em dezembro. O Cespe e a Cesgranrio têm que verificar as 113 mil atas de prova. Isso leva alguns dias.

Convocação Os alunos vão ser convocados como na primeira fase, por um procedimento relativamente padrão. Depois que fechar o número e apurar os alunos prejudicados, eles serão imediatamente notificados por todos os canais de comunicação, que são o celular, o e-mail e os Correios, da data e do local de realização da prova. Não é possível abrir a prova para quem quiser refazer porque isso fere o edital. Tenho que apurar objetivamente, é uma orientação da própria Advocacia-Geral da União. Tenho que ter critérios objetivos. Senão, é um novo exame para todos. Não se trata disso, se trata de uma apuração objetiva, e de uma convocação direcionada para aqueles que foram prejudicados.

Inep O Inep corresponde por 1% do orçamento do MEC, que atinge cerca de R$ 60 bilhões. O orçamento do Inep chega a cerca de R$ 600 milhões. Com esse orçamento, faz ações importantes e complexas, com serviços que não têm paralelo em nenhum país. O Inep realiza um caminhão de outras tarefas além do Enem, e pagou um preço muito alto em 2009, quando foi vítima. Não existe conflito de interesse no fato do Joaquim Soares Neto presidir o Inep, porque ele não tem nada a esconder. É professor titular da Universidade de Brasília, ex-diretor do Cespe, e um especialista em avaliação educacional. Tem experiência em sigilo e logística. Não conheço pessoa que tenha um currículo superior.

Responsabilidade O procedimento no Inep é sempre o mesmo. No ano passado, os documentos foram todos enviados para os órgãos de controle. Sobre isso, não há questão a se discutir. A sindicância já iniciou, e o problema (do erro no cabeçalho do cartão de respostas) vai ser apurado com toda a transparência. A cadeia de responsabilidade, por qualquer erro, é apurada até as últimas consequências. Isso você poder ter certeza.

Empresas A sociedade não pode colocar a reputação de importantes empresas em dúvida, por causa de um equívoco. Essas instituições fizeram o seu melhor e continuam preparadas para desafios. As instituições precisam ser preservadas. Os indivíduos, nós apuramos e punimos. Mas as instituições fizeram tudo o que lhes cabe fazer. São instituições que têm compromisso com o Brasil, elas precisam ser olhadas à luz da sua história. Contratamos a maior gráfica do mundo para imprimir o Enem, uma empresa que tem um faturamento de R$ 20 bilhões por ano. O erro no Enem aconteceu por excesso de segurança, porque eles não permitiram que funcionários vissem a chapa do conteúdo que seria impresso, e a autorização para impressão teve que ser feita por meio de um código. É uma empresa com cultura de sigilo.

Em recuperação O Inep melhorou muito em relação ao ano passado, no que diz respeito à qualidade da prova, à distribuição dos estudantes pela sala de aula, à logística de distribuição. Houve um aspecto pior, que é a questão do erro gráfico. Mas tivemos dois erros no Enem. Um aparentemente é de responsabilidade do Inep e outro, de responsablidade da gráfica, assumidamente. Aparentemente, o erro de impressão do caderno é maior.