Título: Inflação ficará abaixo de 5% só em 2013
Autor: Safatle, Claudia
Fonte: Valor Econômico, 21/09/2012, Colunas, p. A2

Num cenário onde o crescimento da economia global será muito baixo ainda por uns dois anos, o governo brasileiro admite que a inflação, este ano, poderá ficar próxima dos 5,3% que o mercado prevê - por causa do choque das commodities - mas conta com um IPCA abaixo de 5% para o ano que vem.

Dos cálculos e prognósticos sobre a evolução dos preços não constam reajuste dos combustíveis para o consumidor - afinal, a gasolina brasileira é a mais cara de toda a América Latina - nem uma eventual flexibilização da meta de superávit primário para algo inferior aos 3,1% do Produto Interno Bruto (PIB) para aumentar o gasto público. O impacto direto de 0,54 ponto percentual no IPCA do próximo ano, decorrente da queda nas tarifas de energia elétrica, já está na conta.

O superávit poderá ser até menor, desde que a decisão seja de desonerar mais a economia dos pesados tributos que lhe retiram competitividade. E, nesse aspecto, não se descarta a possibilidade, inclusive, de tornar duradouro o incentivo da redução do IPI para os automóveis.

Tudo o que puder ser feito para desobstruir a atividade econômica da excessiva cunha fiscal e ajudar no controle da inflação será analisado com boa vontade pela área econômica. Mas a política fiscal deve estar associada ao ciclo econômico: mais restrita em períodos de crescimento e mais expansionista nos tempos de vacas magras.

O IPCA -15 de 0,48% em setembro sobre agosto veio acima do que esperava o governo. O entendimento, porém, é que o maior peso do aumento dos preços internacionais das commodities agrícolas concentrou-se no índice deste mês. Em outubro ele deve vir menor.

No balanço de riscos da inflação, a nova rodada de expansão monetária patrocinada pelo Federal Reserve americano (QE3) pode ser fonte de pressão nos próximos meses, mas uma desaceleração mais acentuada da China seria um neutralizador. O governo brasileiro está atento para o fato de que a transição chinesa talvez não seja tão suave quanto se imaginava e as autoridades, lá, não estão demonstrando disposição para evitar isso. Se os dados do governo da China não são confiáveis, a queda de preços do minério de ferro é um sinal inquestionável da desaceleração, avalia uma fonte graduada.

A reação da atividade econômica interna, finalmente, começou a aparecer nos indicadores e o crescimento no terceiro trimestre vai ser mais reforçado do que foi nos dois primeiros. É bastante provável que o PIB cresça 1% ou até um pouquinho mais sobre o segundo trimestre e já indique uma taxa anualizada de 4%, performance que o Banco Central esperava só para o quarto trimestre.

Para alívio dos principais gestores da política econômica, o conjunto de incentivos - fiscais, monetários e financeiros - tardou, mas não falhou. Começam a aparecer resultados concretos. A retomada da produção industrial, depois da redução dos estoques, ainda é liderada pelo setor de automóveis, mas começa a se disseminar. Esse movimento está na origem da melhora dos indicadores de confiança dos empresários e dos consumidores domésticos, assim como a visão do país no exterior.

O governo fez um trabalho para remover o mau humor que começou a contaminar os ânimos dos investidores internacionais com o Brasil nos últimos meses - motivado pela percepção de que a capacidade de a economia crescer mais do que 2% ao ano estava se esgotando.

Autoridades locais se deslocaram para os Estados Unidos e Europa, numa operação para "separar o que era conjuntural do que era estrutural" no comportamento do PIB e indicar os passos que o governo preparava para incentivar o investimento - das concessões de serviços públicos para o setor privado à redução das tarifas de energia.

"O crescimento através da expansão do consumo não se esgotou, mas governo está mudando seu foco para o investimento", comentou a fonte.

A necessidade de proceder a essa transição - do incentivo ao consumo para medidas de estímulo ao aumento da oferta - começou a ficar clara para o governo no primeiro trimestre deste ano. Em janeiro já estava nítido que, diante da crise instalada, os países maduros estavam fazendo coisas que jamais fariam em tempos de normalidade, como, por exemplo, subtrair da população parte da rede de benefícios sociais. Eles vão sair da crise, portanto, mais competitivos do que entraram.

"Se estamos chorando hoje, vamos chorar muito mais lá na frente", resumiu uma alta fonte do governo, para retratar a discussão naquele momento.

A partir desse debate, entraram na agenda do Planalto temas que entendeu-se necessário para o país avançar, como a redução do "spread" bancário e retomada da expansão da oferta de crédito pelos bancos públicos e privados, a reforma nas regras de correção da caderneta de poupança, o corte nas tarifas de energia, assim como a criação de programas de qualificação da mão de obra e tudo o mais que for preciso para melhorar a competitividade.

Os juros básicos (taxa Selic) estavam em queda desde agosto do ano anterior e o câmbio começou a se desvalorizar de março em diante. Mas foi ficando mais visível para todos, no governo, que isso não seria suficiente para colocar a economia brasileira nos trilhos.

A redução da taxa Selic de 12,5% para 7,5% ao ano pôs os juros no Brasil em um outro padrão. "Tivemos condições de convergir (para taxas reais internacionais), porque tem uma crise internacional. Agora, os outros países foram muito mais longe com a taxa de juros", comentou a fonte. Isso está sendo, de qualquer forma, um importante aprendizado. O mercado, resistente, se convenceu de que é possível o país viver num ambiente de juros em patamares mais razoáveis.

Por outro lado, para o governo também foi pedagógico, pois mostrou que juros mais baixos não é tudo, assim como desvalorização da taxa de câmbio. Há outras questões que emperram as engrenagens da economia e que precisam ser tratadas.

Agora, se a Selic vai ficar estável por um bom tempo ou não, quem dirá é a inflação, concluiu a fonte.