Título: Empresas tentam evitar devolução de benefícios inconstitucionais
Autor: Baeta, Zínia
Fonte: Valor Econômico, 20/10/2006, Legislação & Tributos, p. E1

Em 2002, o governo do Pará concedeu às empresas instaladas no Estado isenção do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) na importação de máquinas e equipamentos, além de uma série de benefícios fiscais em operações que envolvem o pagamento do imposto. Os benefícios vigoraram até abril deste ano, quando foram considerados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal (STF) durante o julgamento de uma ação proposta pela Procuradoria-Geral da República (PGR). Os ministros derrubaram os benefícios por não terem sido aprovados pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz). A decisão do Supremo deixou em alerta as empresas que aproveitaram as reduções de alíquotas, pois elas correm o risco de grandes prejuízos em suas operações. Isso acontece porque a partir do momento em que há a declaração da inconstitucionalidade do benefício - com o chamado efeito "ex tunc", ou retroativo - o Estado que o concede, em tese, é obrigado a cobrar o imposto que deixou de ser recolhido. No caso do Pará, o ICMS dos últimos quatro anos. A ação ainda não terminou porque há um recurso do Estado, a ser analisado, que pede a aplicação da decisão apenas para o futuro. Assim, os contribuintes não seriam obrigados a recolher o imposto do qual haviam sido liberados.

A situação descrita acima começa a tornar-se comum e vem motivando diversas associações de empresas a ingressarem no Supremo com pedidos para participar das ações por meio de um instrumento jurídico denominado "amicus curiae". O advogado Eduardo Salusse, do escritório Neumman, Salusse, Marangoni Advogados, afirma que as empresas prejudicadas pelas ações diretas de inconstitucionalidade (Adins) partem agora para uma nova estratégia de atuação. Segundo ele, não adianta mais os contribuintes interessados irem ao Supremo defender os benefícios, pois a jurisprudência da corte é a de considerar inconstitucional todas as concessões não aprovadas pelo Confaz. Por isso, diz o advogado, a linha adotada agora é a de ir à corte defender nos processos a aplicação futura da decisão, seja a partir da publicação da mesma ou em data definida pelo Supremo. Essa medida minimizaria os prejuízos desses contribuintes.

Uma pesquisa do diretor jurídico da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Helcio Honda, mostra que desde 1995 foram propostas 44 Adins contra benefícios fiscais oferecidos por Estados. Do total, apenas 12 foram julgadas - três delas procedentes e o restante das ações não conhecidas pela perda de objeto, quando a lei questionada já não estava em vigor na data do julgamento. Nas três ações julgadas, o Supremo determinou que o efeito fosse retroativo. Honda defende que esses julgamentos de inconstitucionalidade não devem ter efeito retroativo. De acordo com ele, a Lei das Adins - a Lei nº 9.868, de 1999 - permite ao Supremo estipular a eficácia da decisão a partir do trânsito em julgado ou em outro momento, por razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social. "O efeito retroativo é muito perverso. Quando a empresa se instala no Estado, a lei já está em vigor e uma decisão assim prejudica todo o investimento realizado", diz.

O consultor jurídico da Federação das Indústrias do Estado do Pará (Fiepa), Eduardo Klautau, diz que a decisão do Supremo atinge cerca de 183 empresas no Estado. Ele afirma que, se permanecer a retroatividade da decisão, elas serão obrigadas a contabilizar o passivo tributários formado a partir da cobrança dos impostos passados. Segundo Klautau, a Fiepa chegou a pedir ao Supremo para fazer parte da Adin, referente à Lei nº 6.489, de 2002, e defender a constitucionalidade do benefícios oferecidos. A partir da decisão do Supremo, ele afirma que o Estado editou em setembro quatro novas leis com benefícios. Se as normas forem questionadas, ele diz que a federação pretende oferecer representações ao Ministério Público Federal (MPF) contra 50 leis e decretos de outros Estados que dão benefícios fiscais. O objetivo é questionar as normas no Supremo.

A integrante da comissão de assuntos jurídicos da Associação Nacional dos Distribuidores de Autopeças (Andap), Sandra Camargo, afirma que nessa guerra fiscal os grandes prejudicados são as empresas, pois elas ficam em uma situação de completa indefinição. Por isso, diz, as entidades em geral estão se organizando para buscar no Supremo algumas definições, como por exemplo o Estado que deve receber o imposto - o que concedeu o benefício ou o prejudicado. "A melhor solução seria a aprovação de uma verdadeira reforma tributária", afirma o diretor executivo da Associação Brasileira do Atacado Farmacêutico (Abafarma), Jorge Froes Aguiar.