Título: Partidos aceleram fusões e criam novas legendas
Autor: Jayme, Thiago Vitale
Fonte: Valor Econômico, 20/10/2006, Política, p. A9

Os 14 partidos que não alcançaram a cláusula de barreira e correm o risco de desaparecer nos próximos anos já se movimentam em busca da sobrevivência. As últimas semanas foram decisivas para a definição de fusões e incorporações. A união de maior importância é aquela a ser sacramentada por PPS e PV. As duas siglas, e mais o PHS, já têm uma carta de intenções a ser assinada nos próximos dias para formar uma agremiação de esquerda com 37 deputados.

O documento, redigido nessa semana pelas lideranças dos três partidos, determina a criação de uma nova legenda - com nome provisório de Democráticos de Esquerda - com a manutenção de certa independência entre eles. Seria uma federação de partidos maquiada juridicamente para ser uma fusão. Nos primeiros anos, os recursos do fundo partidário, o tempo de televisão e a distribuição de cargos seriam feitos proporcionalmente ao tamanho das bancadas dessas três legendas.

A saída jurídica foi encontrada diante do temor de que a adoção das federações partidárias não seja regulamentada até fevereiro, quando o novo Congresso toma posse. Os partidos formarão uma só legenda, mas terão divisões internas para manter certa autonomia. O item 2 da carta de intenções é claro: "Manter a plena autonomia de cada agremiação, para que cada uma continue na sua atividade própria, mantenha sua identidade e busque a integração. No caso de surgirem dificuldades, que se estabeleça um prazo para reexame, inclusive que haja espaço para dissolução".

A cláusula de barreira estabelece que apenas as legendas com mais de 5% dos votos válidos para a Câmara dos Deputados em todo o país - com 2% em pelo menos nove estados -, poderão ter funcionamento parlamentar, receber recursos do fundo partidário e dividir o tempo de televisão. Só PT, PMDB, PSDB, PFL, PP, PSB e PDT atingiram os limites. As siglas que não alcançarem a cláusula terão participação residual no fundo partidário, apenas dois minutos por semestre na televisão e não terão cargos no Congresso.

Juridicamente, há diferentes interpretações da lei. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ainda não decidiu entre três caminhos, cada um deles excluindo um determinado número de partidos. Não há prazo para definições. Mas as legendas não pretendem esperar o lento ritmo da Justiça, nem a lenta negociação da reforma política, que poderá regulamentar as federações partidárias.

PPS e PV movimentam-se para ultrapassar essa barreira e sobreviver de olho no futuro. "A presidência seria alternada entre PPS e PV. Seríamos um partido de porte médio, com uma imagem excelente de ética e seriedade. Acho que poderíamos atrair uma grande fatia de descontentes com o que está por aí", avalia ontem o deputado e vice-líder do PPS Raul Jungmann (PE).

A fusão vem sendo discutida desde o resultado do primeiro turno das eleições. Algumas arestas vêm sendo aparadas paulatinamente. Mas a melhor notícia dos últimos dias, do ponto de vista do PV, foi a desfiliação do governador do Mato Grosso, Blairo Maggi, do PPS. Ao apoiar a candidatura de Lula no segundo turno, Maggi desobedeceu a Executiva Nacional da sigla e foi desligado. O PV, sobretudo o deputado Fernando Gabeira (RJ), rejeitava fazer qualquer união com o partido de Maggi, maior produtor de soja do mundo e alvo de diversas acusações por desmatamento predatório.

"A presença dele (Maggi) era uma dificuldade enorme, praticamente um veto. Como ele mesmo se expeliu do partido, as coisas ficaram mais fáceis", reconhece Jungmann. Os partidos negociam, ainda, com o PMN. Se esse partido for incorporado à fusão, a bancada chega aos 40 deputados.

Outras legendas também se movimentam para ultrapassar a cláusula de barreira. O PL anunciará na quinta-feira, dia 26, a fusão oficial com PSC, Prona e PTdoB. O nome provisório da nova legenda é Partido Republicano, mas há sugestões como Partido Democrático Republicano ou apenas Partido Democrático. O primeiro nome, porém, tem mais chances de prevalecer para batizar a nova bancada de 35 deputados.

"Trabalhamos muito nos últimos dias. Já temos o estatuto concluído e vamos fazer a convenção conjunta no dia 26", revela o líder do PL, Luciano Castro (RR).

O partido ainda negocia com o PTC, do costureiro e deputado eleito Clodovil Herdandez (SP), que elegeu três parlamentares. "Seria bom para nós. Mas as negociações não evoluíram. Vamos ver", diz Castro. Quem também se movimenta é o PTB. Com seus 22 deputados eleitos, a legenda chegou muito perto de alcançar a cláusula de barreira. O partido anunciou a incorporação do PAN - que elegeu um deputado -, o suficiente para ultrapassar a cláusula.

Com tais articulações, restariam apenas PCdoB, P-SOL e PRB fora da cláusula (no caso de PMN aderir à fusão com PPS e o PTC se unir ao PL). Essas três legendas juntas têm apenas 17 parlamentares e dificilmente teriam força para tentar acabar com a cláusula de barreira, como se comenta na Câmara. "Ouvimos coisas do tipo, mas seria um total retrocesso. Sou contra", diz o líder do PTB na Câmara, José Múcio Monteiro (PE). "O PL é a favor da cláusula e lutaremos para ela ser mantida. Com a nossa fusão, estamos exercendo a exigência imposta pela cláusula, que é saudável", diz Luciano Castro.