Título: Jader afasta-se da política nacional e prepara filho para sucedê-lo no Pará
Autor: Junqueira, Caio
Fonte: Valor Econômico, 24/09/2012, Política, p. A5

Uma das mais longevas e resistentes lideranças políticas do país anuncia a aposentadoria. Não para agora. Jader Fontenelle Barbalho, 67 anos, vai terminar seu mandato de senador em 2018 e deixar a política. Antes disso, todo o seu esforço político, outrora realizado alternando funções e mandatos regionais com os nacionais, vai se restringir a conduzir sua sucessão política no Estado por meio de seu filho Helder Zahluth Barbalho, 33 anos, prefeito de Ananindeua, o segundo maior colégio eleitoral do Pará.

Afastado do Palácio do Planalto desde que Luiz Inácio Lula da Silva passou a faixa a Dilma Rousseff, Jader afirma não ter mais nenhuma cota no governo. Um cenário diferente, para quem, desde a redemocratização, ocupou os espaços mais variados na máquina pública federal de todos os presidentes eleitos, em especial nas Centrais Elétricas do Norte do Brasil S.A. (Eletronorte), na Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam) e no Banco da Amazônia (Basa).

"Não tenho nada no governo federal, não quero nada e não estou mais aqui mais para pedir emprego a ninguém", afirmou ao Valor, na ampla sala de seu escritório político no centro de Belém. Essa condição, garante, lhe confere mais liberdade nas votações no Senado. "Voto com o governo quando precisar. Se achar que um projeto não é bom, não voto com o governo."

Foi assim na votação da Lei Geral da Copa, por exemplo, um dos projetos em que o governo mais penou para mobilizar sua base a aprová-lo. Votou "não". Também se ausentou na votação de medidas provisórias relevantes para o governo, o que não destoa de sua postura em geral neste ano no Senado: não há registros de pronunciamentos, apartes e proposições de sua autoria.

Comportamento que aumentou especulações sobre seu estado de saúde, já que neste ano passou por uma cirurgia de próstata. "Acho que estou bem. Faz um ano e meio que não faço check-up. Vou fazer depois da eleição. Mas um sujeito que faz o que eu tenho feito todos os dias, dormido às 3h da manhã depois de percorrer dez cidades, só pode estar bem."

A intensa rotina que o presidente estadual do PMDB do Pará tem se deve ao trabalho para conduzir o filho Helder, o vice-presidente regional da legenda, ao maior número possível dos 143 municípios paraenses neste período eleitoral. Trata-se do escolhido para ser seu sucessor no Estado, tendo em vista que o primogênito, Jader Filho, é o escolhido para cuidar dos negócios da família: comanda a ampla rede de comunicação que inclui o jornal "Diário do Pará", três rádios e uma retransmissora da TV Bandeirantes, cujo jornalismo policial não economiza no sensacionalismo e alavanca a audiência, com programas como "Barra Pesada", "Cidade Contra o Crime", "Metendo Bronca" e "Rota Cidadã 190".

"Minha ideia é não concorrer a eleição mais nenhuma. As lideranças de minha época no Estado desapareceram. Está se extinguindo o processo de uma geração inteira e terá de vir uma nova geração. O Helder se deu conta disso e é hoje a grande liderança da renovação política do Pará", afirma Jader, que jura que o filho tem independência política em relação a ele. "Ele tem autonomia. Tem temperamento de não pedir licença, é bom de bico, muito hábil."

A independência do filho, porém, ainda não é plena. Tanto o pai, quanto a mãe, a deputada federal Elcione Barbalho (PMDB-PA), ajudam em Brasília a canalizar verbas aos cofres da prefeitura do filho a partir de emendas parlamentares e da articulação para a assinatura de convênios da União com a cidade. Só neste ano eleitoral foram 17 convênios oriundos dos ministérios da Agricultura (PMDB), Cidades (PP), Cultura (PT), Educação (PT), Esportes (PCdoB) e Saúde (PT) que somam R$ 84,9 milhões. Em 2011 foram sete, no montante de R$ 11,6 milhões.

O esforço ocorre a despeito de Helder não ser candidato neste ano. Ele conclui seu segundo mandato em dezembro, para o qual foi reeleito em 2008. Mas tenta eleger Chicão (PMDB), seu vice no primeiro mandato e ex-presidente da Câmara Municipal no seu segundo mandato. O embate é duro. O ex-prefeito por sete anos Pioneiro (PSDB), que dominou a cena política local até a chegada de Helder, é o principal adversário. Uma derrota de Helder pode atrapalhar os planos da família para 2014.

São três as hipóteses colocadas para ele: o Senado, o governo do Estado ou a vaga de vice na chapa à reeleição do governador Simão Jatene (PSDB). "A única certeza é a participação ativa nas eleições majoritárias", afirmou Helder ao Valor em Ananindeua, minutos antes de participar, ao lado da mãe, do lançamento de programa piloto do governo federal de doação de próteses dentárias à população de baixa renda. Do ato também participou a primeira-dama, Daniela, secretária de assistência social.

Ocorre que, na tentativa de obter a dimensão estadual de que precisa, Helder partiu para a política municipalista. Aproveitou-se do fato de o PMDB ser o partido com o maior número de prefeituras no Estado (40 de 143) e se elegeu, em 2009, presidente da Federação das Associações de Municípios do Estado do Pará (Famep). Um importante instrumento político, na medida em que 80,3% do eleitorado paraense se concentra nas 141 cidades do interior.

O grande lance, porém, foi sua reeleição como presidente da Famep em 2011. Isso lhe garantiu um pretexto para rodar o Estado em campanha sem ser prefeito até junho de 2014, às vésperas, portanto, da sucessão estadual. "Meu papel na federação dos municípios é articular ações junto ao governo do Estado que fortaleçam os municípios. Neste momento, meu foco é eleger meu sucessor e, depois, prosseguir com a política municipalista. Hoje as atribuições dos municípios foram potencializadas e praticamente todas as cidades vivem com dificuldades", disse Helder.

Neste período eleitoral, Jader o acompanha praticamente todos os dias pelo Estado. No fim de semana anterior ao da entrevista, passaram por quinze municípios. O alto número de visitas decorre não só do fato de o PMDB ter o maior número não só de candidaturas próprias, mas também de coligações. "Decidimos não impor restrições a alianças em respeito às realidades locais", disse.

Tal postura explica também o apoio do PMDB do Pará ao governo Simão Jatene (PSDB) e ao da presidente Dilma Rousseff (PT). Por outro lado, evidencia a mais gritante distinção entre Jader e Helder. O afastamento do pai do Palácio do Planalto o aproximou do governo tucano em Belém. Mas a dependência do filho dos recursos federais o aproximou dos petistas.

Um episódio de 2010 demonstra bem isso -e também quem predomina na relação. No segundo turno das eleições presidenciais, a então candidata a presidente Dilma Rousseff foi a Ananindeua fazer seu único comício no Estado naquele ano. Helder, apesar de ser um dos coordenadores de Dilma no Estado, não pôde subir ao palanque devido a Jader ter decidido apoiar o tucano Jatene contra Ana Júlia no segundo turno da disputa estadual. "As parcerias com o governo federal foram fundamentais para o meu governo", disse.

Assim, por ele, afirmam interlocutores, a opção prioritária é o Senado ou o governo do Estado. Jader já preferiria uma composição na vice de Jatene em 2014 com o compromisso do apoio do PSDB a Helder na sucessão em 2018, quando seu filho estará com 39 anos -a mesma idade que Jader tinha quando foi eleito governador pela primeira vez, em 1982.

Ao lado de sua sucessão política no Estado, Jader se concentra também em alguns dos julgamentos por corrupção que tem pela frente. São dois os mais relevantes. A ação penal 398 corre no Supremo Tribunal Federal e resulta das denúncias de desvio de recursos do Banco do Estado do Pará (Banpará) quando Jader era governador. A outra acusação, exposta na ação penal 397, é o ponto final das denúncias de desvios de recursos na Sudam. Nas duas, o relator é o ministro Ricardo Lewandowski.

À época que o escândalo da Sudam estourou, Jade era presidente do Senado. Mas não resistiu ao tiroteio e acabou por renunciar ao mandato em outubro de 2011. Quatro meses depois, já em 2012, foi preso em decorrência de outra investigação também referente à irregularidades na Sudam.

Sua morte política chegou a ser declarada. Mas no mesmo ano elegeu-se deputado federal, com 344.018 votos, a maior votação do Estado. Foi reeleito em 2006, com 311.526 votos. Entretanto, voltou a renunciar a um mês de terminar o mandato. O gesto foi visto como uma manobra para atrasar o julgamento dos processos no STF, que teve que remetê-los à primeira instância. Acabaram retornando ao tribunal após Jader assumir o Senado em dezembro de 2011 aquele que ele diz ser seu último cargo público, depois de uma longa batalha judicial para ser diplomado.

Jader atribui todos os seus processos ao enfrentamento com o então senador Antonio Carlos Magalhães (PFL), em 2000 e 2001, que era contrário à sua candidatura a presidente do Senado. Mas afirma que o maior adversário que teve na vida não foi um político. "Foi o presidente do Tribunal Regional Eleitoral ir à televisão na campanha ao Senado em 2010 dizer que meus votos não seriam contabilizados", disse. A razão era seu possível enquadramento na Lei Ficha Limpa, pela renúncia ao cargo de deputado em 2010. O STF, contudo, permitiu que ele fosse empossado.

Nem esse último duelo jurídico, contudo, o motiva a retomar a linha de frente em Brasília. Diz ser cedo para tratar da sucessão na Casa e ter dúvidas sobre a real efetivação das sinalizações do governo de apoiar o PMDB na presidência simultânea da Câmara e do Senado a partir de 2013. "Não sei se esse jogo vai ser concretizado. Uma semana em política é muito tempo."