Título: Justiça barra plano do MEC para nova prova
Autor: Leite, Larissa
Fonte: Correio Braziliense, 18/11/2010, Brasil, p. 12

Em mais uma reviravolta, juíza determina que qualquer candidato que tenha se sentido prejudicado pelos erros admitidos pelo ministério pode refazer o exame, diferentemente do que defendia Haddad. AGU avisa que vai recorrer outra vez

Os participantes prejudicados pela edição 2010 do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) estão à mercê de um imbróglio judicial. Ontem, uma nova decisão trouxe ainda mais dúvidas ao trâmite que envolve a reaplicação da prova: uma liminar da 7ª Vara da Justiça Federal do Ceará determinou que qualquer candidato que se sinta prejudicado pelos dois erros já reconhecidos pelo Ministério da Educação (MEC) ¿ a inversão dos cabeçalhos no cartão-resposta e os erros de impressão na prova amarela ¿ terão o direito de fazer uma prova substituta (leia fac-símile abaixo). Com isso, o MEC, que teria o controle de quais alunos poderiam refazer o teste, agora não sabe quantos estudantes, de fato, têm direito à reaplicação, nem tampouco para quando o novo exame poderá ser marcado. No fim das contas, o ministério anunciou ontem mesmo que vai recorrer da decisão, por meio da Advocacia-Geral da União (AGU).

A liminar pegou o MEC de surpresa. O ministério já havia anunciado de que forma os alunos prejudicados seriam identificados: primeiro, apenas quem fez uma marcação completamente invertida no cartão-resposta, seguindo a orientação errada do cabeçalho, teria direito a preencher um requerimento no site do Enem requisitando uma nova correção. O requerimento estaria disponível até as 23h59 de amanhã. Na decisão liminar, porém, a juíza determina ainda que o sistema fique em funcionamento até as 23h59 de 26 de novembro, ampliando, assim, o prazo em uma semana.

Não só isso: o MEC também informou que estava esperando análise das mais de 128 mil atas dos locais de prova do Enem 2010, que está sendo realizada pelo consórcio (formado por Cespe e Cesgranrio) responsável por aplicar e corrigir o exame. A partir da apuração das atas, seriam destacados todos os erros objetivos assinalados e, assim, os estudantes que pediram o registro de tais falhas teriam o direito à nova prova ¿ segundo o MEC, as atas já trariam a informação de quais estudantes não tiveram a prova com erro de impressão trocada, um número estimado em 2 mil alunos. Com a decisão da juíza Karla de Almeida Miranda Maia, essa conta desaparece.

A magistrada se baseou em uma ação ordinária apresentada pelo procurador Oscar Costa Filho, o mesmo que já propôs a suspensão e a anulação da prova. Segundo a petição do procurador, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) ¿dispensou tratamento discriminatório na solução dos problemas pontuais que prejudicaram os candidatos¿.

Ao Correio, ele criticou a postura do MEC, que ¿adotou uma conduta administrativa pela qual escolhe quem são os prejudicados, e os procedimentos para identificá-los¿: ¿O MEC está fazendo a coisa na marra. Ele não está dando a menor satisfação para o direito. O ministério tem interesse em diminuir ao máximo o número de prejudicados para conseguir cumprir o calendário. Essa decisão pode criar problemas de caldendário? Talvez¿, disse Costa Filho. Para o procurador, as soluções encontradas pelo ministério ainda agridem os direitos subjetivos dos candidatos.

Prejuízo O recebimento de centenas de e-mails foi citado na decisão da juíza Karla Maia, para embasamento de sua decisão favorável ao Ministério Público da União (MPU). A magistrada cita que, nos depoimentos, os estudantes afirmaram que ¿foram orientados pelos fiscais de sala a marcar os cartões-respostas seguindo a ordem cronológica das questões e, em seguida, quando já havia sido iniciada a marcação do cartão-resposta, foram orientados tardiamente a proceder de outra maneira¿. A juíza diz ainda que a presença de itens proibidos por edital nos locais de prova evidenciam o ¿despreparo dos fiscais e o seu desconhecimento das normas do edital¿. Assim, Karla Maia conclui que não há razão para que alunos sejam submetidos a uma triagem prévia, ¿ainda mais quando esse juízo de valor está calcado em atas de salas redigidas por fiscais, cuja falta de preparo restou evidenciada¿.

Em nota publicada no site do MEC, a AGU informa que vai recorrer da nova liminar, pois ¿entende que a providência adotada pelo Ministério da Educação (¿) é a medida mais justa para assegurar o direito aos alunos prejudicados, sem prejuízo daqueles que fizeram a prova regularmente, ou da apuração de outras ocorrências registradas em ata¿.

Na Câmara, discrição Quatro horas antes da nova decisão da Justiça a respeito do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), o ministro da Educação, Fernando Haddad, passava por uma segunda sabatina no Congresso Nacional, para dar explicações relacionadas às falhas do exame. Em audiência pública na Comissão de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados, o ministro foi mais econômico nas explanações do que no dia anterior, quando se apresentou ao Senado Federal. Além disso, o ministério poupou a imagem do presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Joaquim José Soares Neto, que ficou sentado em cadeira reservada aos parlamentares ¿ longe dos holofotes e livre do constrangimento e das explicações.

Na audiência, o ministro não foi questionado sobre os procedimentos adotados para a identificação dos estudantes prejudicados. Assim, ao fim da audiência, Haddad limitou-se a informar que faria uma reunião com o consórcio formado por Cespe e Cesgranrio amanhã, a partir do qual o Ministério da Educação poderia ter um levantamento dos problemas detectados nas atas ¿ um passo necessário para a marcação das novas provas. Questionado por jornalistas, o ministro ainda adiantou a apuração do consórcio afirmando que, de acordo com a Cesgranrio, o lote provas com erros se concentrava na Região Sul do país. ¿As provas com erro de impressão tiveram uma concentração mais no Paraná, menos em Santa Catarina e menos no Rio Grande do Sul¿, limitou-se a dizer. No dia anterior, na audiência realizada no Senado, o ministro chegou a afirmar que não seria possível abrir a prova para quem quisesse refazer por que isso, supostamente, feriria o edital: ¿Tenho que apurar objetivamente. Senão, é um novo exame para todos. Não se trata disso, mas de uma convocação direcionada para aqueles que foram prejudicados¿, afirmou. (LL)