Título: Sob pressão, Rural recebe aporte de R$ 100 milhões
Autor: Travaglini, Fernando
Fonte: Valor Econômico, 24/09/2012, Finanças, p. C1

Sob dupla pressão, de um lado com a condenação de sua principal acionista, Kátia Rabello, pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do mensalão e de outro com o Banco Central (BC) fazendo um pente-fino nos números do banco, o Rural publica nos próximos dias o balanço do primeiro semestre com novo prejuízo, da ordem de R$ 32 milhões. Ao mesmo tempo, os sócios se veem obrigados a realizar nova injeção de recursos, de R$ 100 milhões, para manter a instituição funcionando.

O aporte foi uma exigência do BC, que identificou deficiências no capital necessário para sustentar as operações do banco, com a necessidade de ajustes que somam R$ 84 milhões.

A exigência resultou da segunda etapa de uma supervisão mais rigorosa do BC sobre os bancos pequenos e médios, iniciada após as fraudes no PanAmericano. Em 2011, o BC havia determinado acerto de R$ 183 milhões no balanço do Rural, fruto de provisões abaixo do exigido e que obrigou os sócios a injetar R$ 65 milhões. Dessa vez, o foco foram os limites operacionais, ou seja, o índice de Basileia, que mede a capacidade de empréstimo frente ao patrimônio.

O Rural espera reverter parte das exigências (R$ 28 milhões), a exemplo dos R$ 30 milhões contestados na verificação anterior e cujas ponderações foram aceitas pela autoridade monetária. Mesmo que o BC mantenha a exigência total, o aporte já é suficiente, diz João Heraldo Lima, presidente do banco. (De 2007 a 2010, os acionistas colocaram R$ 125 milhões).

A injeção de recursos, segundo ele, mostra o "compromisso firme e definitivo" dos acionistas em meio a pressões sofridas pela instituição desde que uma série de escândalos envolveu o Rural. O caso mais famoso é o do mensalão, cujo julgamento já levou à condenação por gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro da acionista e ex-presidente do banco Kátia Rabello e dos ex-vice-presidentes José Roberto Salgado e Vinícius Samarane - que pediu desligamento há cerca de três semanas, segundo Lima. Ayanna Tenório foi absolvida.

Perguntado sobre os efeitos do julgamento no banco, Lima diz que "o impacto é sobre a vida das pessoas". "O banco mantém sua regularidade operacional, atendendo nossos clientes. A fidelidade e a confiança permanecem." Ele diz não ter havido resgate de aplicações após as condenações. Nos últimos 12 meses até junho, antes, portanto, do começo do julgamento, os depósitos recuaram 4%, para R$ 4,593 bilhões.

"Acho que todos conseguem ver que a decisão, como tudo na esfera penal, atinge pessoas. E essas pessoas já vinham num processo, que antecede o julgamento, de desligamento do banco. O banco vem há alguns anos passando por um processo de profissionalização."

Lima, que está no Rural desde 1999, assumiu a presidência em 2008, com a saída de Kátia Rabello da gestão. A instituição é controlada pela família Rabello e nenhum dos acionistas pessoa física detém mais de 27% do controle.

Ele diz ainda que a instituição não está à venda. "Não há nenhum tipo de conversa nesse sentido, mas o banco sempre estuda todos os negócios que chegam".

Segundo ele, o atraso na publicação do balanço de junho se deve a ajustes exigidos pelo BC. Mas o resultado não será afetado diretamente, pois a correção é referente à alavancagem. Ainda assim, o Rural fechou o primeiro semestre com prejuízo de R$ 32 milhões, número que ainda está em avaliação pela auditoria externa. "Tudo indica que vamos fechar este ano com prejuízo, mas bem menor que em 2011, quando as perdas somaram R$ 83 milhões", afirma.

O vilão, mais uma vez, foi o aumento das provisões para créditos, que foram de R$ 169 milhões no semestre, alta de 72% em 12 meses. Boa parte se deve ao processo de saída do crédito consignado, cuja carteira acumula R$ 700 milhões em transações geradas até meados de 2011 e que deve ser totalmente encerrada em dois ou três anos.

Os empréstimos para médias empresas, foco único desde então, também decresceu 18% em 12 meses, para R$ 2,27 bilhões. As receitas de intermediação recuaram menos, 12%, o que "mostra vitalidade no manejo não apenas do credito, mas das taxas", diz Lima.