Título: Velhas promessas de novos hospitais esbarram no custeio
Autor: Máximo , Luciano
Fonte: Valor Econômico, 25/09/2012, Especial, p. A14

A construção de um hospital municipal na Brasilândia, bairro da periferia da zona norte de São Paulo, virou uma espécie de lenda urbana entre moradores. A transformação de um hospital privado falido em uma unidade pública é assunto que faz bocejar comerciantes da Vila Carrão, na zona leste. Gera indignação falar na chegada de um novo hospital da prefeitura na Capela do Socorro, uma das regiões mais pobres da cidade, no extremo da zona sul.

Promessas eleitorais até agora não cumpridas pela gestão do prefeito Gilberto Kassab (PSD), os três hospitais permeiam a lista de propostas para a área de saúde dos principais candidatos à sucessão municipal em São Paulo. Em busca de votos em outras cidades brasileiras, políticos também recorrem à velha promessa de fazer novos hospitais, geralmente em áreas com carência de oferta de serviços públicos. Mas projetos desse tipo são apresentados de forma superficial nas campanhas e dificilmente acabam sendo executados, principalmente pela falta de planejamento e insuficiência de recursos.

A oferta de leitos hospitalares nas capitais de Estado está abaixo da recomendação do Ministério da Saúde: a média é 2,13 leitos por mil habitantes, mas o ideal é um índice de 3. A médica sanitarista Aparecida Linhares Pimenta, secretária municipal de Saúde de Diadema (SP) e vice-presidente do Conselho Nacional dos Secretários Municipais de Saúde (Conasems), conta que o Hospital Municipal de Diadema, na região metropolitana de São Paulo, aberto em 1992 após reforma de uma unidade privada fechada por má administração, consome R$ 70 milhões por ano, mais de 25% de tudo que a cidade aplica em saúde. "Qualquer candidato em sã consciência, fazendo a conta de quanto vai gastar com custeio, não fará promessa. A decisão é mais política", diz Aparecida.

O problema é que promessas não cumpridas dificilmente são esquecidas e influenciam negativamente o voto. Quem o diga o candidato José Serra (PSDB), que terá de se esforçar para ganhar a confiança de quem espera há quatro anos os hospitais prometidos por Kassab, aliado do tucano.

"Se o Kassab falou que ia fazer e não fez, quem garante que o Serra vai fazer? Por que votaria nele?", questiona a dona de casa Penha Silva, moradora da Brasilândia. "Precisamos do hospital prometido, por isso vou dar meu voto de confiança pro [Celso] Russomanno; o Kassab teve sua chance e não fez", acrescenta o metalúrgico Ronald Ferreira de Araújo, da mesma vizinhança. O dono de bar Sebastião Ramos acredita que nenhum candidato à prefeitura de São Paulo reabrirá o antigo Hospital e Maternidade Carrão, na zona leste. Fechado há seis anos por problemas de gestão, a antiga unidade particular fica na mesma rua de seu estabelecimento. "Vêm aqui e falam que vão abrir e nada. Deve ficar mais uns dez anos assim, fechado e pichado e fechado", reclama o comerciante, sem esperança.

A construção dos três hospitais na periferia paulistana (215 leitos) faz parte do conjunto de 75 metas assumidas por Kassab para a área da saúde no início do mandato, em 2008. Segundo a ONG Nossa São Paulo, só oito dessas metas foram cumpridas, com a entrega de 19 Centros de Atenção Psicossocial (Caps) para tratamento de deficientes mentais e viciados. A administração atual informa que trabalha para entregar os três hospitais até 31 de dezembro, mas a situação de abandono dos imóveis torna a missão impossível. Além da necessidade de adaptação e reformas há pouco tempo hábil para a contratação de profissionais e compra de equipamentos.

"O status desses hospitais é de desespero, para ser bem sincero. Quando uma coisa não está na minha governança mas a meta está na minha área, eu fico desesperado", admite Januário Montone, secretário municipal de Saúde de São Paulo. Segundo ele, os projetos estão prontos, têm custo de cerca de R$ 90 milhões e serão conduzidos por organizações sociais (OSs), como ocorre em 610 serviços de saúde da cidade. O problema é que ainda aguardam aprovação da secretaria municipal de Negócios Jurídicos.

Mesmo com todos os obstáculos, os principais candidatos em São Paulo prometem inaugurar os hospitais emperrados de Kassab. O candidato do PRB, Celso Russomanno, não detalha sua proposta. Diz apenas que a cidade precisa de mais leitos. Serra destaca que os imóveis já foram declarados de utilidade pública e se esforçará para tirá-los do papel. "Estão sendo elaborados os projetos de adaptação dos prédios e vou manter isso, até porque se tem uma coisa que eu sei fazer é hospital", gaba-se o tucano.

Fernando Haddad, candidato do PT, e a médica Marianne Pinotti, vice na chapa de Gabriel Chalita (PMDB), argumentam que conseguirão erguer os equipamentos com parcerias estadual e federal, rejeitando as PPPs. O petista vai além e promete outros três hospitais. A candidatura pemedebista tem um bloco de quatro unidades no plano de governo. "Faltou planejamento e parcerias [para a gestão atual]", critica Marianne. "Construir hospital não tem nada de diferente de outras obras, a diferença é o custeio. Mas isto não é impeditivo tendo em vista a parceria que pode ser feita tanto com o governo federal quanto com o estadual", argumenta Haddad.

Imóvel na zona norte de São Paulo onde a prefeitura promete abrir um hospital de 90 leitos até 31 de dezembro

No litoral paulista, um dos maiores desafios do novo prefeito de Santos será manter o Hospital Conselheiro Nébias, antigo Hospital dos Estivadores, comprado pela Prefeitura em 2011 e atualmente em reforma. A estimativa é que o equipamento precise de R$ 60 milhões por ano para seu custeio, quase um terço do total das despesas com saúde da prefeitura.

Atualmente, a unidade está em reforma. Quando voltar a operar, serão 276 leitos. O hospital dos Estivadores de Santos foi inaugurado em 1970 pelo sindicato da categoria, muito forte na época. Em 2008 a posse do imóvel foi transferida ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em decorrência de pendências previdenciárias. Finalmente, deixou de funcionar em outubro de 2010. No ano seguinte, a prefeitura arrematou o imóvel por R$ 13 milhões. Os candidatos a prefeito de Santos afastam a possibilidade de privatização ou de gestão por organizações sociais. Buscarão, admitem, entendimentos com Estado e União.

Em Salvador, a única capital do país sem hospital municipal, a construção de uma unidade na periferia voltou a ser bandeira na campanha atual. O eleitor soteropolitano mal consegue diferenciar o discurso atual daqueles de quatro ou cinco eleições anteriores. Líder nas pesquisas de intenção de voto, o deputado federal ACM Neto (DEM) promete, finalmente, tirar a promessa do papel no bairro do Pau do Lima por meio de PPP.

Reunido no mês passado com representantes do Fórum Inter-Religioso de Saúde de Salvador, o candidato Nelson Pelegrino (PT) ouviu muitas queixas sobre o setor, entre elas a ausência de um hospital. Alegando falta de dinheiro, ele foi pé no chão: "Salvador é pobre, tem R$ 100 milhões por ano para investir." O petista promete cortar despesas com custeio para melhorar o caixa do setor.

Os dois principais candidatos à Prefeitura de Recife também se comprometem a erguer novos hospitais. Tanto o ex-ministro da Saúde Humberto Costa (PT) como Geraldo Julio (PSB) garantem que, se eleitos, vão construir um hospital exclusivamente feminino, equipado com maternidade de alto risco. O petista se compromete a erguer um hospital para a terceira idade e outro para as crianças.

Quase tudo será pago com recursos municipais, mediante a elevação do percentual do orçamento da saúde. Ambos declaram que aumentarão a fatia dos atuais 15% para 20% das receitas totais, o que elevará os gastos anuais do setor entre R$ 130 milhões e R$ 150 milhões. O restante do dinheiro para os novos investimentos virá de parcerias com os governos federal e estadual, que os dois candidatos prometem intensificar.