Título: Disputa pelo gás novo vai aumentar nos próximos anos
Autor: Silva , Carlos
Fonte: Valor Econômico, 25/09/2012, Especial, p. F8

Os quase 180 milhões de m3 por dia de gás natural previstos para serem ofertados nos próximos anos a partir da produção dos campos do pré-sal, pós-sal, GNL e de áreas onshore vão encontrar um mercado consumidor com forte demanda reprimida. A disputa mais significativa será entre indústrias e termelétricas, que demandam grandes volumes de gás. Mas também não ficam de fora os planos das distribuidoras para atendimento do varejo - residências, comércio e veículos.

O estrangulamento da oferta é mais representativo na região Sul. Lá calcula-se uma demanda reprimida de cerca de 3,5 milhões de m3 /dia. As distribuidoras da região estão limitadas à capacidade do Gasbol (gasoduto Brasil-Bolívia) para ampliar o atendimento a seus mercados. Some-se a isso o fato de não haver oferta argentina para importação.

A SCGás é uma das empresas que vivem essa situação. A distribuidora catarinense tem um potencial de crescimento de 1,1 milhão de m3 /dia até 2020, que não pode ser atendido em função de restrições na capacidade do gasoduto que vem da Bolívia. O contrato de suprimento assinado entre a Petrobras e a SCGás prevê volumes de 2 milhões de m3 /dia à distribuidora catarinense até 2019.

Hoje, a demanda no Estado é de 1,89 milhão de m3 /dia, já tendo atingido picos superiores ao volume contratado. "Assim como a Compagas e Sulgás, estamos chegando ao limite e precisamos achar uma alternativa. A solução da equação da região Sul precisa ser trabalhada com múltiplas inteligências", comenta o presidente da SCGás, Cosme Polese.

A Sulgás vive situação semelhante. A capacidade máxima de fornecimento ao mercado gaúcho é de 2,8 milhões de m3 /dia, volume insuficiente para atender a distribuidora, que vem registrando recordes de vendas, em patamares superiores a 2 milhões de m3 /dia, e a UTE Sepé Tiaraju (251 MW), que pode consumir até 1,2 milhão de m3 /dia. A Sulgás acredita que a oferta do Gasbol não será suficiente para atender o crescimento do mercado não termelétrico a partir de 2015.

De olho nessa situação, as federações das indústrias dos três estados da Região Sul assinaram um manifesto conjunto requisitando ao governo federal mais investimentos na logística de transporte de gás da região. Outra alternativa proposta pelo grupo de trabalho formado pelas três federações seria a instalação de um terminal de GNL no Rio Grande do Sul. Mas mesmo esse plano parece estar subindo no telhado. Estudo promovido por um comitê formado pela Petrobras, Samsung, Hyundai e o governo gaúcho concluiu que o empreendimento não é viável com as premissas atuais. Uma segunda rodada de estudos, com novas premissas, deve ser elaborada.

Se no Sul a oferta está estrangulada, o mesmo não acontece no Sudeste. A Comgás, distribuidora que atende à Região Metropolitana de São Paulo, Baixada Santista, Vale do Paraíba e interior paulista, tem à sua disposição três pontos de suprimento. A empresa tem hoje um mercado potencial em condições capturáveis de 3 milhões a 4 milhões de novos clientes.

A concessionária tem planos de incluir 110 mil a 115 mil novos clientes por ano, em todos os segmentos. Em termos de número de clientes, a maior parte desse potencial é na área residencial. Mas não ficam de fora os consumidores de outros segmentos, como o comercial, industrial e veicular. "Hoje fazemos a rede para chegar a determinado local e atender aos clientes da região, são projetos com mais de 500 km de rede em sua maioria", diz o diretor de Expansão, Marketing e Relacionamento da empresa, Marcus Bonini.

Hoje as principais frentes de trabalho estão concentradas no ABC Paulista, com três projetos, entre eles a expansão para Santo André, com 900 km de rede. Também está sendo construída a ampliação da rede para São José dos Campos, Taubaté e Mogi das Cruzes, no Vale do Paraíba; e para Piracicaba, Jundiaí e Americana, no interior do Estado.

A distribuidora pretende aplicar R$ 600 milhões por ano nesses projetos. O BNDES aprovou recentemente um empréstimo de R$ 1,135 bilhão à concessionária para financiar parte desse plano. O crédito - o sexto contratado pela distribuidora ao banco - está em fase de assinatura e deve ser liberado até o fim do ano.

A mineira Gasmig, por sua vez, está atuando em duas frentes. Numa, está iniciando o atendimento ao mercado residencial de Belo Horizonte. O primeiro contrato foi fechado com um edifício residencial Chamonix. Em julho, a empresa iniciou a primeira fase das obras do chamado Anel Sul, linha-tronco que visa atender à região Centro-Sul da capital.

Na primeira fase do projeto, nos bairros Santo Agostinho e Lourdes, serão investidos R$ 5,65 milhões para a construção da linha-tronco de aço de 2 km de extensão e da rede de adensamento em polietileno (PEAD), de aproximadamente 12 km, que passará sob as ruas dos bairros. Em outra frente, a empresa está expandindo o seu gasoduto Vale do Aço até Governador Valadares (MG). A distribuidora pretende iniciar nos próximos meses o licenciamento do duto. A concessionária estuda a possibilidade de duplicação de um dos trechos do empreendimento, que hoje atende nove municípios, de João Monlevade a Belo Oriente, a 90 km de Governador Valadares. Assim que concluída a especificação do projeto, a Gasmig iniciará a licitação para aluguel de sistemas de compressores e a negociação de terrenos.

A falta de gás novo atinge em cheio as perspectivas de construção de novas termelétricas a gás natural, necessárias para regularizar os pequenos reservatórios das novas hidrelétricas e para suprir a intermitência da fonte eólica, que vem registrando forte crescimento nos últimos anos e com perspectivas ainda maiores para os próximos.

A Petrobras, maior produtora de gás do país, em seu último plano de negócios, revisou para baixo a oferta de gás termelétrico para o período 2012-2016. O output previsto caiu de 76 milhões de m3 /dia para 53 milhões de m3 /dia até 2020. Perspectivas favoráveis só para a MPX, que está construindo uma termelétrica de 3.722 MW no Maranhão. A usina será abastecida com o gás proveniente das descobertas da OGX na Bacia do Parnaíba