Título: Medidas do governo para economia têm acertos e riscos
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 01/10/2012, Opinião, p. A14

Os últimos atos do governo, voltados para estimular os investimentos e, portanto, aumentar a oferta de bens e serviços, mostram que a presidente Dilma Rousseff e sua equipe identificaram corretamente que, hoje, o maior problema para a expansão da economia, com estabilidade, está na restrição da oferta, e não no excesso da demanda.

Ao retomar o programa de concessões de serviços públicos para exploração por empresas privadas - até o momento restrito a rodovias e ferrovias, mas que deve ser estendido para aeroportos e portos - também fica evidente que o governo compreendeu as limitações do Estado para tocar empreendimentos de larga envergadura e decidiu superá-las, de forma pragmática, numa parceria com empresas privadas.

Quando, em março deste ano, ouviu de um grupo de empresários o relato das razões pelas quais eles pararam de investir no aumento da produção, a presidente determinou aos seus assessores que começassem a avaliar a possibilidade de medidas para reduzir custos de produção, começando pela tarifa de energia elétrica. O corte da tarifa foi anunciado recentemente e começa a vigorar em 2013.

Constatou-se, ainda, que a carga tributária foi longe demais, retirando competitividade das empresas domésticas. E o governo começou a desonerar as empresas da tributação sobre folha de pagamentos, transferindo o imposto para o faturamento, e trabalha, agora, numa reforma do ICMS e do PIS/Cofins.

Os empresários, naquela ocasião, fizeram queixas da excessiva valorização da taxa de câmbio e da taxa de juros, esta já estava em processo de queda, mas ainda muito alta. O real, desde então, teve depreciação da ordem de 25%. Se isso ocorreu por ação do Banco Central e do Ministério da Fazenda ou pelas péssimas condições da economia global, não está claro, mas o certo é que, na sequência, a taxa parou de flutuar.

Os juros básicos caíram para um nível recorde de 7,5% ao ano e, ainda que por forte pressão de Brasília, os bancos públicos e privados reduziram o custo do dinheiro para o tomador final. Há espaço para mais reduções e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, encarregou-se de prosseguir nessa agenda.

A inflação, medida pelo IPCA, convergia em direção ao centro da meta (de 4,5%), mesmo com os cortes da taxa Selic, até que o aumento dos preços dos grãos no mercado internacional, de julho para cá, produziu um choque de oferta, interrompendo a trajetória de queda dos índices de preços. Segundo as últimas projeções do BC, esse choque deve elevar o IPCA neste ano para 5,2%.

O fato é que, vendo o investimento na economia desabar, o governo se movimentou na direção certa, de aumentar a oferta. Os vários e importantes acertos no atacado não escondem, porém, problemas do dia a dia da política econômica que podem comprometer os resultados globais.

Dilma Rousseff tem apreço pelo setor produtivo e não medirá esforços, legítimos, para levantar a indústria em recessão. Não se pode tirar do país o direito de se defender dos efeitos das políticas adotadas por um mundo em crise. O caminho de uma taxa de câmbio quase fixa, porém, não necessariamente fará dessa uma opção exitosa.

Outras iniciativas também são de vantagem duvidosa. A elevação das tarifas de importação sobre uma centena de produtos pode ter efeito contraproducente, à medida que encarece a própria modernização da indústria.

O avanço sobre os bancos públicos para que cortem juros e tarifas - forma de persuasão para que as instituições privadas façam o mesmo - é preocupante. Basta um olhar para o passado não muito distante - nos anos 90 Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil tiveram que ser socorridos pelo Tesouro Nacional - para se temer o desfecho dessa ação.

Ao mostrar tolerância com uma inflação mais alta e sair em defesa da estabilidade das taxas de juros (Selic) ao longo de 2013, o governo joga mais ruídos do que luzes no debate sobre o abandono ou não do tripé macroeconômico, sustentado por câmbio flutuante, superávit fiscal e metas para a inflação. O câmbio já não flutua e o superávit fiscal não é mais o mesmo.

Já é tempo, no entanto, de o país ter uma política monetária normal, ajustada aos ciclos econômicos e destinada a controlar a inflação - que há 13 anos se mantém na média de 5,5% -, em que os juros sobem ou caem, de forma moderada, sem que isso gere discussões apaixonadas e desconforto no próprio governo.