Título: Reajuste comprometedor
Autor: Kleber, Leandro
Fonte: Correio Braziliense, 23/11/2010, Política, p. 5

Câmara e Senado gastam quase 80% do orçamento com pessoal. Ainda assim, parlamentares tentam aumentar seus salários em 18% Especial para o Correio

Os parlamentares deverão votar até o fim do ano a proposta de aumento no próprio salário a ser pago a partir da próxima legislatura, em fevereiro de 2011. A ideia é elevar os vencimentos em 18% para repor a inflação dos últimos três anos, mas há quem diga no Congresso que uma equiparação aos salários dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), de R$ 26,7 mil, também pode ser analisada. Hoje, 79,4% do orçamento da Câmara e do Senado já são destinados exclusivamente à folha de pagamento e às aposentadorias, um dos maiores percentuais entre todos os órgãos federais.

Em média, o servidor na ativa do Poder Legislativo ganha R$ 12,2 mil, quase o dobro do pago no Executivo (R$ 6,5 mil). Para Claudio Weber Abramo, diretor executivo da Transparência Brasil, a relação custo-benefício do Congresso Nacional está longe de ser a ideal. ¿Quando falamos em pagamento de políticos, a análise que deve ser feita é se o dinheiro está sendo bem empregado. Pelo que observamos, isso não está acontecendo. Os parlamentares estão se aproveitando da situação para discutir esse aumento agora¿, diz. Se o plenário aprovar o aumento de 18%, o contracheque dos parlamentares vai chegar a R$ 19,5 mil por mês. O reajuste ainda vai gerar um efeito cascata no salário dos mais de mil deputados estaduais e 52 mil vereadores.

¿Em meio ao debate sobre o reajuste do salário mínimo a partir do ano que vem, discutir isso agora é uma afronta à população. É justo que um deputado honesto receba um bom salário, mas não é correto receber os extras que existem hoje¿, avalia o futuro deputado federal Antonio Reguffe (PDT-DF), que promete abrir mão de benefícios como a verba indenizatória. Ele acredita que a discussão sobre o aumento dos salários dos parlamentares é inadequada e contraria os interesses dos contribuintes. ¿Os salários dos congressistas deveriam ser atrelados aos dos servidores. Acho errado o parlamentar votar o seu próprio reajuste. Tínhamos que ter outros mecanismos¿, afirma o deputado recém-eleito.

Os parlamentares também têm direito, para exercer o mandato, a mais de R$ 100 mil em verbas de gabinete, indenizatória, passagens, cotas postal e telefônica (veja quadro). Com esses recursos, eles podem contratar dezenas de servidores. Além disso, as despesas médicas e odontológicas são ilimitadas, sendo que, no caso do Senado, os familiares diretos também são contemplados. O benefício dos senadores é vitalício, com limite anual de R$ 33 mil, e seus celulares podem ser usados à vontade.

O deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), líder do partido na Câmara, defende o reajuste dos parlamentares. Segundo ele, estudos técnicos e financeiros serão feitos pela Mesa Diretora e deverão ser apresentados na próxima quinta-feira. ¿Temos que avaliar as alternativas que serão sugeridas. Se equiparmos os nossos salários aos dos ministros do STF, as despesas de gabinete devem ser reduzidas. Mas sou a favor do aumento independentemente do percentual, já que ele não acontece há três anos¿, justifica.

Pela regra, no último ano de cada legislatura, a Comissão de Finanças e Tributação da Câmara deve apresentar projeto para reajustar a remuneração dos parlamentares, bem como a do presidente da República e a de ministros. Caso não o faça, a Mesa define uma proposta. É por isso que a cada quatro anos a discussão vem à tona. Em novembro de 2006, o então presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), anunciou um aumento de 90% para equiparar os vencimentos aos dos ministros do STF, à época na casa dos R$ 24,5 mil. Com a forte reação da sociedade, o salário ficou definido nos atuais R$ 16,5 mil.

Custo mensal Senador

Salário: R$ 16,5 mil mais 13º, 14º e 15º salários (dados no começo e no fim da sessão legislativa) Verba de gabinete: de R$ 90 mil a R$ 100 mil Verba indenizatória: R$ 15 mil Passagens aéreas: de R$ 6 mil a R$ 28 mil (de Brasília ao estado de origem) Auxílio-moradia: R$ 3,8 mil (para quem não ocupa imóvel funcional) Combustível para carro oficial: 25 litros de gasolina ou 36 litros de álcool por semana Conta de celular: valor ilimitado Despesas médicas e odontológicas: valor ilimitado

Deputado

Salário: R$ 16,5 mil mais 13º, 14º e 15º salários (dados no começo e no fim da sessão legislativa) Verba de gabinete: R$ 60 mil Cotão*: de R$ 23 mil a R$ 34 mil Auxílio-moradia: R$ 3 mil (para quem não ocupa imóvel funcional) Despesas médicas e odontológicas: valor ilimitado

*Inclui passagens aéreas, fretamento de aeronaves, cota postal e telefônica, combustível e lubrificantes, consultorias, divulgação do mandato, entre outros.

R$ 7,4 bilhões em 2011 No projeto de lei orçamentária que tramita no Congresso Nacional, Câmara e Senado terão R$ 7,4 bilhões em 2011 para pagar pessoal, despesas correntes (água, luz, telefone etc.) e realizar investimentos (execução de obras e compra de equipamentos). O valor é 20% superior ao estimado na proposta para 2010.

Atualmente, o Senado tem 3,5 mil servidores efetivos e 2,9 mil comissionados, enquanto na Câmara são 3,7 mil servidores ativos, 1,2 mil comissionados e cerca de 10,5 mil secretários parlamentares (pessoal lotado em gabinetes). Em média, segundo informações da assessoria da Casa, são 20 por gabinete.

Estão previstos ainda R$ 44 milhões para a conclusão da reforma dos imóveis funcionais destinados à moradia dos deputados, R$ 47 milhões para a ampliação do anexo IV, onde ficam os gabinetes, e R$ 8 milhões destinados à construção do prédio de instalação de unidades de administração de material e patrimônio do Senado. (LK)