Título: De boas intenções, o céu, agora, está cheio
Autor: Mariz, Renata
Fonte: Correio Braziliense, 23/11/2010, Brasil, p. 10

Anac reúne integrantes do setor e formula plano para evitar confusão nos aeroportos brasileiros durante as festas de fim de ano. Todo esforço, porém, pode esbarrar na insatisfação dos profissionais

Um plano de prevenção ao caos aéreo que virou rotina na vida dos passageiros durante as festas de fim de ano foi apresentado ontem, no Rio de Janeiro, pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), com medidas que vão de aviões reservas mantidos pelas companhias à proibição de overbooking (venda de bilhetes acima da quantidade de assentos). Para garantir equipes trabalhando com as empresas aéreas e com a Aeronáutica, e também circulando nos principais aeroportos do país, a agência cortou as férias de todos os funcionários entre 15 e 31 de dezembro. Órgãos como a Polícia Federal e a Receita Federal também se comprometeram a redobrar esforços nos terminais. Tanta boa vontade, porém, pode não ser suficiente para barrar a crise muitas vezes capaz de transformar uma viagem de férias em sofrimento.

O crescimento de passageiros, da ordem de 25% só entre janeiro e outubro, é uma das causas de desconfiança. Outro fator está na insatisfação dos aeronautas (comissários, pilotos e mecânicos de manutenção) com as negociações salariais. A categoria fará um protesto hoje em diversos aeroportos, inclusive em Brasília, para pressionar as empresas a apresentarem uma proposta salarial, sob o risco de haver paralisações. Entre outros itens da pauta de reivindicações, encaminhada aos patrões em setembro, há um reajuste de 15% e o respeito às normas da profissão, como o limite de 85 horas de voadas por mês. ¿Não posso falar pelas empresas, não sei se elas fizeram contratações, mas já estão faltando trabalhadores¿, afirma Graziella Baggio, diretora do Sindicato Nacional dos Aeronautas.

As companhias garantiram que estão contratando mão de obra e disponibilizarão aviões-reserva no fim de ano. Por meio da assessoria de imprensa, a TAM, empresa líder no país, informou que sempre trabalha com aeronaves de contingência em períodos de grande movimento. Cinco, segundo a companhia, serão destinadas para o fim deste ano. Na opinião de Cláudio Candiota, presidente da Associação Nacional em Defesa dos Passageiros do Transporte Aéreo (Andep), o plano de contingência não passa de ¿pirotecnia¿. ¿Imagine se alguma empresa vai deixar um avião parado, quando já existe falta de aeronave. Isso é piada¿, provoca o presidente da entidade. Segundo Candiota, o que falta para o setor aéreo brasileiro sair da rota rumo a uma crise mais grave que a verificada no fim de 2006 e início de 2007, quando o acidente da Gol deflagrou inúmeras falhas sistêmicas na aviação, é gestão e planejamento sérios.

No que diz respeito ao controle de tráfego aéreo, a Aeronáutica se comprometeu a aumentar em 14% o número de controladores. Além disso, fará monitoramento especial dos aeroportos de Porto Seguro, Salvador, Fortaleza e Florianópolis. Outros sete terminais terão inspeção 24 horas por dia de agentes da Anac. O Aeroporto Internacional Juscelino Kubitschek, em Brasília, é um deles. O terminal da capital federal é considerado um dos mais críticos do país, por funcionar como hub ¿ ponto de conexão de vários voos onde os passageiros são colocados na aeronave para o destino final.

Passado que condena

O plano de ação apresentado pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) pode até tranquilizar os passageiros, mas não convence muito os trabalhadores do setor. Graziella Baggio, diretora do Sindicato Nacional dos Aeronautas, destaca problemas atuais, antes mesmo do fim de ano, lembrando episódios recentes. Em setembro, por exemplo, a Anac suspendeu a comercialização de passagens da companhia Webjet devido à venda superior ao número de assentos disponíveis ¿ prática conhecida como overbooking. Em julho, a companhia já havia sido multada em R$ 225 mil por ter excedido a carga horária da tripulação. ¿Do início de 2010 até agora, já repassamos à Anac cerca de mil denúncias de estouro do limite permitido de horas voadas¿, diz a representante da categoria.

A empresa aérea Gol também protagonizou uma série de problemas em agosto passado, quando voos foram cancelados em virtude de excesso de horas trabalhadas pela tripulação. A TAM, por meio da assessoria de imprensa, informou que está segura com relação ao fim de ano. Segundo a empresa, cerca de mil funcionários de tripulação foram contratados em 2010. No próximo mês, mais 300 devem ser admitidos. Quanto aos funcionários de terra, houve um incremento de 700 profissionais. (RM)