Título: Risco em evidência
Autor: Monteiro, Luciana
Fonte: Valor Econômico, 24/10/2006, EU & Investimentos, p. D1
Com a taxa básica cada vez menor, um dos grandes desafios para o setor de private banking será oferecer retornos ainda atrativos para clientes acostumados a correr baixos riscos. Esses investidores são extremamente exigentes, sabem fazer conta, mas não querem muita volatilidade em sua carteira de investimentos. Mesmo assim, o otimismo prevalece e a estimativa é de que o segmento voltado para a alta renda mantenha o crescimento anual de 15% que vem registrando nos últimos dois anos, segundo avaliação da Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid).
A queda da taxa traz um desafio para o setor, mas também uma janela de oportunidade, avalia Celso Scaramuzza, vice-presidente da Anbid e coordenador da comissão de private banking. Segundo ele, produtos como fundos de participação ("private equity") ou carteiras de dividendos tendem a ganhar um espaço maior no portfólio desses clientes. Mesmo os imóveis, que tradicionalmente detêm um peso importante nos investimentos dos private, tiveram participação reduzida diante das altas taxas de juros pagas pelos títulos públicos, diz o executivo, também responsável pela área de private do Unibanco. "O setor terá de sair da zona de conforto que o CDI oferece e buscar melhores alternativas para os clientes", diz.
Nos últimos anos, com a estabilidade econômica e o reaquecimento do mercado de capitais, o segmento de grandes fortunas no Brasil cresce a taxas de 15% ao ano, em linha com os demais países da América Latina e acima dos mercados europeus e americanos, que crescem 10% ao ano, lembra, Scaramuzza. A entidade realiza na quinta-feira o 1º Seminário Anbid Internacional de Private Banking.
A Anbid estima que 60% dos recursos totais dos clientes private no Brasil estão em fundos de investimento e carteiras administradas. Até setembro, esses recursos somavam R$ 85 bilhões. Isso quer dizer que o segmento deve movimentar no país entre R$ 140 bilhões e R$ 150 bilhões, mas alguns executivos do setor chegam a falar na cifra de R$ 200 bilhões. Segundo os especialistas, não se pode mensurar o volume de recursos desses clientes no exterior.
Como a tendência é de queda da taxa de juros, o crescimento do setor vai depender bastante da capacidade das instituições em lançar produtos adequados a esses clientes, diz Marco Gomes, superintendente da área private do Banif Investment Bank. "Se o cliente aplica R$ 1 milhão, por exemplo, ele fica satisfeito com o retorno da renda fixa", diz o executivo. "Com juros menores, haverá demanda por novos produtos que ofereçam taxas mais atraentes." Segundo ele, entre as opções que vêm chamando a atenção desses investidores abonados estão os fundos multimercados, carteiras de capital garantido, Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) e Letras de Crédito do Agronegócio (LCA).
Os clientes private terão de assumir maiores riscos, diz Hiram Maisonnave, vice-presidente da área private do BNP Paribas. "São investidores acostumados a ter retornos altos, com risco baixo, já que muitos desses clientes não convivem com a volatilidade", conta. Outro desafio para o setor é absorver investidores que têm potencial para ser classificados como private, mas hoje estão em outros segmentos dos bancos, como varejo de alta renda, por exemplo, diz Maisonnave. "Talvez apenas entre 40% e 50% dos clientes estejam hoje efetivamente sendo atendidos pelas plataformas private dos bancos", calcula.
A maioria dos clientes dos private banks brasileiros ainda são mais velhos, os chamados "old money". Normalmente são donos de empresas, que precisaram trabalhar muito para conquistar um patrimônio considerável, conta Lywal Salles, diretor sênior de private banking do Itaú. Por terem na memória os anos de alta inflação, esses clientes normalmente são mais conservadores. Já os mais novos - os herdeiros dos "old money" ou executivos que ganharam bastante dinheiro no mercado financeiro - são mais arrojados e costumam ter mais informação sobre os produtos financeiros. "Acredito que as ações, que representam cerca de 7% da carteira desses clientes, terão maior participação no portfólio desses clientes", diz.
A queda dos juros é positiva, pois os clientes passarão a valorizar mais o trabalho de aconselhamento financeiro feito pelos bancos, diz Sylvia Coutinho, responsável pelo Private Bank do HSBC. "Hoje ele investe em um CDB e obtém um retorno atrativo, mas com ganhos melhores esse investidor terá de arriscar mais, terá de sair do arroz com feijão." Para ela, o caminho para o crescimento no número de clientes está no empreendedorismo. "As grandes riquezas vêm de empreendedores que abrem uma empresa, crescem e depois lançam ações."