Título: PT aposta em testemunho de Dilma na TV
Autor: Junqueira, Caio; Di Cunto, Raphael
Fonte: Valor Econômico, 03/10/2012, Política, p. A10

O PT aposta no discurso de anteontem da presidente Dilma Rousseff para também colher os benefícios da campanha religiosa nesta reta final da acirrada disputa em São Paulo. Nos 16 minutos de seu discurso no comício na zona leste, Dilma, por duas vezes, repetiu que daria um "testemunho" e na sequência disse, por três vezes, que o candidato do partido, Fernando Haddad, "é um companheiro de fé". Assim como toda a sua fala, isso foi meticulosamente calculado pelo marqueteiro João Santana e Dilma minutos antes do comício, em uma sala VIP atrás do palco montado no extremo leste de São Paulo.

Petistas que estão no comando da campanha apostavam ontem na "alta probabilidade" de o trecho ser veiculado tanto na propaganda de televisão que termina hoje como nos spots de rádio, que se estendem até amanhã. No entanto, uma reunião ontem à noite entre João Santana e Haddad decidiria o acabamento final do programa.

Na avaliação dos petistas, colocar a defesa religiosa de Haddad na boca de Dilma é a melhor resposta aos adversários. Primeiro porque Dilma, segundo eles, passa à população a ideia de credibilidade. Segundo, porque isso vem em um momento em que há o apoio maciço da Igreja Universal do Reino de Deus à candidatura de Celso Russomanno (PRB) e da Assembleia de Deus a José Serra (PSDB). O pastor Silas Malafaia, ligado à Assembleia, declarou apoio ao tucano nesta semana.

Nos últimos dias, petistas têm se reunido com padres na periferia da cidade para defender a candidatura de Haddad. O próprio candidato também já esteve com bispos da cidade, e alguns petistas, como o deputado estadual Simão Pedro e o federal Paulo Teixeira, têm acesso direto ao cardeal arcebispo de São Paulo, dom Odilo Scherer.

Os relatos que chegam de alguns desses encontros é de que nesta reta final cresceu a campanha católica contra a candidatura Russomanno na periferia da cidade. Como o de que o candidato do PRB irá acabar com o feriado de Nossa Senhora de Aparecida e o de que o bispo Edir Macedo, chefe da Igreja Universal, será candidato a presidente da República em 2014.

Se por um lado o PT considera-os positivo, tendo em vista que Haddad é beneficiado diretamente pela eventual perda de votos de Russomanno, por outro teme entrar de cara em uma campanha religiosa da qual historicamente foi alvo. A campanha presidencial de 2010 é o melhor e mais recente exemplo disso.

Naquele ano, setores da Igreja se insurgiram contra Dilma por suas posições anteriores de apoio ao aborto - desmentidas depois por ela. O PT, então, estruturou comitês em São Paulo especificamente para dialogar com a Igreja, algo que não se repetiu neste ano, justamente por Haddad não ser alvo direto da Igreja.

No outro extremo, o petista também deve se beneficiar com uma campanha contra Russomanno programada para sexta-feira pela comunidade LGBT no centro da cidade. O manifesto que circula na internet diz que a vitória de Russomanno seria "a materialização de uma tragédia e a criação de uma nova força política nacional que ameaça o Estado laico e as causas progressistas".

A fala de Dilma na qual declara que "o que é bom para São Paulo é bom para o Brasil" é outra aposta dos petistas, dentro de uma estratégia de alinhamento ao governo federal. Ontem mesmo, Haddad disse que, se eleito, o governo federal irá fazer junto com a prefeitura um "PAC para São Paulo", uma alusão ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) comandado pelo Palácio do Planalto.

"A presidente Dilma [Rousseff] esteve ontem aqui em São Paulo para nos apoiar. Vamos fazer um PAC para São Paulo. Muitas obras, creches, para recuperar os oito anos da gestão Serra-Kassab. Essa ideia de querer manter o que é ruim não é bom para a democracia", afirmou Haddad. Ele fez a declaração em um minicomício no Largo 13, zona sul de São Paulo, ao lado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da ministra da Cultura, Marta Suplicy. Lula enalteceu feitos de sua gestão, em especial os da educação, que por anos teve Haddad como ministro.

Marta Suplicy, à noite, também participou de evento com professores universitários, artistas e escritores. No encontro, a ministra afirmou que o candidato que chegar ao segundo turno contra Russomanno irá vencer. O comentário foi feito após a divulgação de pesquisa Ibope na qual Russomanno perdeu sete pontos percentuais de intenção de voto em uma semana.

"Esta eleição está disputadíssima, e quem for para o segundo turno vai ganhar do Russomanno. Então temos que ir para o segundo turno, e isso dependerá de pessoas como vocês", afirmou, ao orientar os simpatizantes presentes ao evento a pedirem voto para Haddad.

O tom dos discursos foi de críticas à atual gestão, do prefeito Gilberto Kassab (PSD), e do candidato apoiado por ele, José Serra. "Na eleição de 2008, me perguntaram por que eu não votava no Kassab. Eu disse: alguém que vive escrevendo biografia alheia não podia sujar sua própria biografia", atacou o escritor Fernando Moraes. Russomanno foi pouco lembrado pelos artistas.