Título: Estudo lança dúvida sobre superávit
Autor: Oliveira , Ribamar
Fonte: Valor Econômico, 28/09/2012, Brasil, p. A3

O Banco Central conseguiu, com um estudo anexado ao Relatório de Inflação, divulgado ontem, lançar dúvidas sobre a necessidade de o setor público manter um superávit primário de 3,1% do Produto Interno Bruto (PIB) - meta prevista na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) até 2015. Segundo o estudo, com um superávit um pouco menor, não só a dívida líquida cairá, em comparação com o PIB, como a própria dívida bruta.

O superávit primário utilizado no estudo foi de 2,8% do PIB no período de 2012 a 2014 e de 2,7% do PIB em 2015 e 2016. Com isso, a dívida líquida cairia de 35,2% do PIB (previsão para este ano) para 28,8% do PIB em 2016. A dívida bruta cairia de 57,2% do PIB em 2012 para 46,3% do PIB em 2016.

É claro que essa queda acentuada da relação dívida/PIB decorreria também de um crescimento médio anual da economia de 4% no período considerado e da manutenção da taxa de juros (Selic) média em torno de 8,5% ao ano - parâmetros de mercado, divulgados no Relatório Focus e utilizados pelo BC em seu estudo.

É inevitável perguntar qual é o objetivo da divulgação desse estudo pelo BC, pois não há novidade nessas projeções, que são feitas, rotineiramente, por analistas, acadêmicos e economistas de todos os matizes. Qualquer economista chega à conclusão de que, hoje, a redução da relação dívida/PIB pode ser obtida com superávit menor que 3,1% do PIB.

O inusitado é a decisão do BC de divulgar essas projeções feitas com base em parâmetros de mercado, que são, no que se refere aos superávits primários, diferentes daqueles fixados na LDO. Para fazer suas projeções para a trajetória da inflação nos próximos meses, o próprio BC trabalhou com um superávit de 3,1% do PIB, sem ajustes, até 2014, como está dito no relatório, tendo a autoridade monetária advertido, inclusive, que seu "cenário prospectivo para a inflação está condicionado à materialização das trajetórias com as quais trabalha para variáveis fiscais".

Pode-se chegar à conclusão de que o BC tem dúvidas sobre a manutenção do superávit de 3,1% do PIB nos próximos anos, principalmente porque está dito, no relatório, que "iniciativas recentes apontam o balanço do setor público se deslocando de uma posição de neutralidade para ligeiramente expansionista". Nessa perspectiva, a publicação do estudo seria uma espécie de tentativa do BC de municiar a opinião pública com análise técnica para uma eventual decisão do governo de reduzir a meta fiscal neste e nos próximos anos.

Alternativamente, pode-se concluir que o BC, embora admita que um superávit menor é suficiente para reduzir a dívida/PIB, considera necessário manter a meta de 3,1% do PIB como forma de a política fiscal contribuir para o controle da demanda e, assim, ajudar no combate à inflação. Quem tiver outra explicação que apresente.