Título: Indiretamente, Amorim pede mais prazo para negociar
Autor: Leo, Sèrgio
Fonte: Valor Econômico, 25/10/2006, Brasil, p. A4

Um dia depois de endurecer no tom com a Bolívia, ao anunciar que o Brasil não aceitará decisões unilaterais sobre os interesses da Petrobras no país, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, fez um apelo ao governo boliviano: o prazo-limite, que se encerra no sábado, para negociação dos novos contratos com as empresas de gás e petróleo, como a Petrobras, não pode ser um obstáculo a uma negociação satisfatória. "As pessoas não podem ficar escravos dos prazos que foram criados em condições diferentes", insistiu Amorim, que repetiu três vezes a frase.

Ele revelou ter passado o recado, por telefone, ao ministro da Presidência da Bolívia (equivalente ao chefe da Casa Civil), Juan Ramón Quintana, na semana passada. Na quinta-feira, um emissário de Quintana, o vice-ministro de Coordenação Governamental, Héctor Arce, veio ao Brasil para reafirmar a decisão do governo boliviano, de manter o prazo limite de sábado para os contratos. O prazo foi fixado com o decreto de nacionalização do setor de gás e petróleo, editado em maio.

"O tom do Brasil é de diálogo com defesa de seus interesse, e isso deve ser entendido em um contexto que seja benéfico para ambos os países", esclareceu, conciliador, o ministro, ao comentar que o acordo buscado entre Petrobras e governo boliviano não pode gerar lucros ou prejuízos só para um dos lados, nem inviabilizar o projeto de participação da empresa no setor de gás e petróleo do país vizinho. " Tem de procurar o equilibrio adequado, e não é coisa fácil", reconheceu.

Após ressalvar que é a Petrobras a encarregada das negociações, Amorim disse que o governo brasileiro estaria disposto a "flexibilizar" posições, caso haja flexibilidade também do governo da Bolívia. Caso os bolivianos insistam em um acordo inaceitável pela Petrobras e exijam a saída da empresa, como previsto no decreto de nacionalização, o Brasil tomará "as medidas legais que couberem".

"O Brasil não vai fazer retaliações, é contra isso", aclarou Amorim. "E não vai radicalizar, isso só serviria aos radicais de um lado e do outro", insistiu. "Não se pode prejudicar a perspectiva dessa cooperação com uma decisão unilateral".

Ao lhe perguntarem se uma ação contra a Petrobras não poderia ser usada pela oposição, como arma nas eleições presidenciais no Brasil, às vésperas da votação do segundo turno, Amorim minimizou o tema, lembrando outras críticas feitas pelos opositores à política externa. "Não ficam dizendo que perdemos uma eleição na Organização Mundial do Comércio, e esquecem de dizer que o Brasil é hoje o país de maior prestígio lá?", argumentou, lembrando a reunião do G-20, no Rio de Janeiro, em setembro, transformada em mini-reunião ministerial a pedido dos representantes dos países ricos.

Amorim comentou, ainda, o impasse na votação para o representante latino-americano entre os membros não-permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas, posto disputado entre Venezuela, com apoio do Mercosul, e Guatemala, fortemente sustentatada pelos Estados Unidos. Amorim reafirmou o apoio à Venezuela, mas disse ter expectativa de que ambos os países retirem a candidatura, em favor de um postulante capaz de reunir maior apoio e enfrentar menos resistência.