Título: Perfil do ensino superior
Autor: Portugal, Rayanne
Fonte: Correio Braziliense, 22/11/2010, Brasil, p. 7

Exame nacional avaliou o desempenho dos alunos de 14 cursos de graduação em vários pontos do país. Alguns estudantes protestaram

O domingo foi tranquilo para os alunos que fizeram o Exame Nacional de Desempenho do Estudante (Enade). Mais de 650 mil alunos de cursos superiores de todo o Brasil eram esperados para participar da avaliação que foi aplicada na tarde de ontem. As provas e os gabaritos serão publicados na página eletrônica do Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), responsável pela elaboração e pela aplicação dos exames, a partir das 18h da próxima terça-feira, dia 23.

Neste ano, a prova vai avaliar o rendimento dos estudantes de 14 graduações ¿ agronomia, biomedicina, educação física, enfermagem, farmácia, fisioterapia, fonoaudiologia, medicina, medicina veterinária, nutrição, odontologia, serviço social, terapia ocupacional e zootecnia ¿ e os cursos superiores de tecnologia em agroindústria, agronegócios, gestão ambiental, gestão hospitalar e radiologia. No Distrito Federal, 7.838 estudantes foram selecionados para fazer o exame.

Empenhado, o morador de Ceilândia Nilton Nunes Junior, 23 anos, que cursa enfermagem na Uniplan, disse levar a prova a sério. ¿Acho importante porque se todos formos bem, a faculdade será mais valorizada¿, disse. Segundo ele, todos os colegas de turma também se prepararam para o Enade. Elder Guimarães Alves, 25 anos, termina este ano o curso de educação física na Faculdade Alvorada e também foi convocado para fazer o exame. ¿A prova estava bem fácil. Foi tranquilo fazer¿, afirma. ¿É importante contribuir para a avaliação do nosso curso e, principalmente, para que ele possa melhorar a partir da análise do nosso desempenho¿, completa.

O exame faz parte do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes) e tem como objetivo medir o conhecimento dos alunos quanto ao conteúdo programático do curso, às habilidades e às competências, além de identificar o desenvolvimento dos alunos que acabam de ingressar no curso em comparação aos que estão prestes a se formar.

Problemas Uma confusão de nomes e endereços fez alguns estudantes se atrasarem e até perderem a avaliação. A estudante de odontologia da Faciplac, Mayahra Cristina Rocha, 19 anos, teria que fazer a prova no Colégio Marista da quadra 615 na Asa Sul, mas acabou se confundindo e foi parar no Marista da 609 Sul e não conseguiu entrar. Achando que sairia prejudicada, Mayahra chorou. ¿Fiquei muito ansiosa, preocupada em perder a prova. A faculdade enfatizou bastante que não conseguiríamos nos formar sem fazer o Enade. Mas meu coordenador me tranquilizou e disse que no próximo ano eu posso fazer outro exame¿, contou. O Enade é um requisito curricular obrigatório para os cursos de graduação. Os alunos selecionados terão o registro de participação inserido no histórico escolar.

Alguns estudantes entregaram a avaliação apenas com a assinatura. É o caso de Daniele Pires Caldas, 35 anos, moradora de Planaltina. Segundo ela, o curso de serviço social, da unidade de educação a distância da Fundação Universidade do Tocantins (Unitins), foi concluído há um ano. ¿Não entendi por que me chamaram. Eu quero que a faculdade tenha uma nota baixa¿, contou. Daniel Fantauzzi, 25 anos, que é morador do Lago Sul e cursa serviço social na Unitins, também entregou a prova só assinada. Ele garante que não foi boicote. ¿Eu não estava preparado. Um grupo começou a assinar e entregar, então perguntei se também poderia fazer isso. Me disseram que apenas a faculdade fica prejudicada¿, explicou.

Já por falta de documentação, a estudante e moradora de Sobradinho Eva Sônia da Silva Malta, 52 anos, que cursa serviço social na Faculdade Anhanguera, perdeu a prova. ¿Eu não sabia que precisava dos documentos e trouxe apenas a carteirinha da faculdade e o CPF. Agora não sei como vai ser porque me disseram que eu precisava fazer a prova para pegar o diploma¿, lamentou. Gabriela Berigo, 20, do curso de medicina da Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS) foi surpreendida pelo mesmo motivo. ¿Perdi meus documentos na vinda para a prova. Não me deixaram justificar e disseram que não poderiam aceitar um Boletim de Ocorrência¿, conta.

BOICOTE À PROVA

Estudantes da Universidade de Brasília (UnB), membros do Diretório Central de Estudantes (DCE) e do Centro Acadêmico de Medicina, organizaram uma pequena manifestação contra o Enade em frente ao Centro de Ensino Fundamental Caseb, com panfletagem e abordagem aos alunos que chegavam para fazer a prova. Um dos responsáveis pelo protesto, o estudante de medicina na UnB, Pablo Valente, 23 anos, explica que a avaliação apresenta falhas. ¿Nós decidimos boicotar o Enade como parte de uma crítica propositiva. A avaliação das instituições não é feita como deveria. Nós queremos ser avaliados, mas de uma forma mais justa¿, defende.

Para Pablo, o Enade não condiz com a necessidade de avaliação do ensino superior. Segundo ele, somente as faculdades com notas inferiores têm a atenção do Ministério da Educação (MEC). ¿Essa prova deveria ser uma das formas de avaliar o ensino e não incentivar, simplesmente, o ranqueamento das faculdades¿, diz. Pablo afirma que as pessoas têm que entender o real significado do Enade e apoia o boicote. ¿Enquanto isso não acontece, seria ideal, ao menos, que as instituições aproveitassem, de forma efetiva, os resultados das provas para investir nas falhas dos cursos. No fim das contas, o Enade não serve para nada¿, completou.

Procurado pelo Correio, Paulo César de Jesus, diretor da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília, afirma que cabe a instituições, diretorias e coordenações de cursos, independentemente da atuação do MEC, aproveitar os resultados do Enade para propor soluções aos problemas identificados. ¿As faculdades têm a possibilidade de manter e expandir o que é bom e investir nas áreas defasadas dos cursos.¿

Para o professor Paulo César, cabe ao corpo docente orientar os alunos. ¿Aproveitamos os resultados do Enade para buscar melhorias para o curso. Aqui, na Faculdade de Medicina, orientamos para que o exame seja feito com seriedade, pelo bem do próprio curso. Mas se as instituições querem cobrar seriedade, têm que ser sérias com o assunto¿, afirma.

Julia Horita, 20 anos, aluna do 5º semestre do curso de medicina da UnB, boicotou o exame e cobrou mudanças. ¿Há falhas estruturais que precisam de atenção. Nosso pronto-socorro está fechado há dois anos e meio e faltam profissionais. Quem sabe assim, com nosso protesto e uma possível redução da nota, chamemos a atenção dos responsáveis para as necessidades do curso.¿(RP)

Colaborou Carolina Khodr

QUEM NÃO FEZ

» Os estudantes que não puderam fazer a prova do Enade devem aguardar as orientações do Inep sobre o processo de dispensa pela página eletrônica do instituto (www.inep.gov.br). A informação poderá ser divulgada até o fim do ano, segundo a assessoria. No ano passado, os solicitantes tiveram que preencher o requerimento de dispensa pela internet, declaração que deveria ser assinada pelo responsável da instituição de ensino que o aluno frequenta. O requerimento, anexado a uma cópia autenticada do documento que comprova por que não pôde participar do exame, deveria ser enviado ao Ministério da Educação pelos Correios. O processo de dispensa deste ano ainda não foi definido, mas poderá seguir o mesmo modelo.