Título: Governo não deve cumprir meta fiscal definida para 2012
Autor: Machado , Tainara
Fonte: Valor Econômico, 04/10/2012, Brasil, p. A4

O resultado fiscal do setor público até agosto e a perspectiva de pressões adicionais pelo lado da despesa no último trimestre consolidaram a visão entre economistas de que o governo não conseguirá cumprir a meta de superávit primário para 2012, estabelecida em 3,1% do PIB. Mesmo o desconto dos investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), previsto em lei, pode ser insuficiente para que o objetivo fiscal perseguido pelo governo seja alcançado. Além disso, a expectativa é de que a meta também não será alcançada no ano que vem.

Para os analistas, esse esforço menor dá respaldo à análise, feita pelo Banco Central no último Relatório de Inflação, de que a política fiscal passou recentemente de uma posição "de neutralidade para ligeiramente expansionista". Ainda assim, afirmam eles, isso tem ocorrido de forma mais inteligente, com desonerações tributárias, aumento dos investimentos - pela União ou pelos Estados - e tentativas de contenção das despesas com custeio da máquina federal. Com isso, ainda que a política fiscal fique mais frouxa neste ano e no ano que vem, isso não deverá exigir uma alta muito forte da Selic. Os economistas acreditam que a taxa subirá em 2013, mas não alcançará dois dígitos.

Segundo cálculos da LCA Consultores, as despesas com o PAC devem representar cerca de 0,5% do PIB. O desconto, portanto, permitiria que a meta fosse considerada cumprida mesmo com um superávit primário menor, de 2,6%, recurso já utilizado em 2010. A LCA, no entanto, calcula que, neste ano, a economia para o pagamento do serviço da dívida pública será de 2,3% do PIB.

Entre janeiro e agosto a poupança do setor público foi de 2,6% do PIB, lembra o Bráulio Borges, economista-chefe da LCA, mas há pressões de gastos entre setembro e dezembro, em função do pagamento de 13º salário para funcionários públicos e aposentados que devem comprimir o resultado fiscal até o fim do ano.

Para 2013, o cenário também é de não cumprimento da meta, com estimativa de superávit primário de cerca de 2% do PIB. Mesmo com esse cenário, a trajetória para a relação entre dívida líquida e PIB é cadente, lembra Borges. Isso sugere, diz ele, que é preciso rediscutir o tamanho da meta e, principalmente, como essa "folga fiscal" será utilizada pelo governo.

Ele acredita que o espaço está sendo usando de forma mais "inteligente", citando, por exemplo, a ampliação do limite de endividamento de 21 Estados em R$ 58,3 bilhões, para que possam levar em frente projetos de investimento em infraestrutura. Esse aumento, estima a LCA, reduz em 0,5% do PIB, tanto em 2013 quanto em 2014, o superávit primário.

Como ao mesmo tempo o governo deve promover desonerações tributárias que reduzem custos, diz Borges, o efeito líquido da política fiscal pode ser desinflacionário, principalmente se novas isenções, como a da cesta básica, forem anunciadas. O economista lembra que, como o BC projeta inflação de 4,9% para o ano que vem, "alívios tributários podem contribuir para que o BC consiga manter juros parados mais tempo do que hoje imagina o mercado".

O Itaú Unibanco, em sua próxima revisão de cenário, deve reduzir a estimativa de superávit primário de 2012 para cerca de 2,5% do PIB. Em 2013, diz Maurício Oreng, especialista em contas públicas do banco, a poupança do setor público será "razoavelmente" inferior aos 2,6% previstos hoje.

No entanto, diz ele, o banco não deve ajustar a previsão de elevação da Selic em 125 pontos-base no próximo ano, para 8,5% ao fim de 2013, porque mesmo com o impulso fiscal maior, a composição dos gastos sugere que o governo está focado na redução de custos da economia e no aumento dos investimentos. Por isso, a política fiscal expansionista sobrecarregará menos a política monetária.

Embora a projeção seja de manutenção do crescimento das despesas em ritmo próximo a 7% em termos reais, essa alta contempla elevação dos gastos com investimento como proporção do PIB para 1,9% no próximo ano, diz Oreng. Ao mesmo tempo, o reajuste linear de 15% obtido pelo funcionalismo público para os próximos três anos foi "conservador", afirma ele, pois meramente prevê manutenção do poder de compra dos salários. Por isso, as despesas com a folha devem cair em relação ao PIB para 4,1% em 2013. "Há grande espaço para esse cenário se concretizar no próximo ano", diz Oreng.

Roberto Padovani, economista-chefe da Votorantim Corretora, tem visão menos favorável para a política fiscal. Ele projeta superávit primário de 2,7% neste ano e de 2,2% do PIB em 2013.

A avaliação, diz ele, é que do ponto de vista da gestão da dívida pública, a redução do superávit primário não é um risco para o país, já que mesmo com esforço fiscal menor a trajetória para a dívida pública ainda será favorável - ou seja, continuará a cair - "o que não é pouca coisa ante o desafio global de reduzir o endividamento", diz Padovani.

Por outro lado, diz, a discussão passa a ser em torno da combinação de instrumentos de gestão econômica. Para ele, esforços fiscais menores, mesmo que contemplem desonerações e redução do custo de produção na economia, vão "claramente empurrar o crescimento econômico de 2013". A alteração da política fiscal, de neutra para expansionista, com resultados primários inferiores à meta de 3,1% do PIB, vai exigir subida de juros. Para ele, no terceiro trimestre do ano que vem o Copom deve voltar a subir juros e a Selic encerrará 2013 em 8,5% ao ano - hoje, a taxa está em 7,5%.