Título: Cresce a procura por "caçadores" de criminosos digitais
Autor: Giardino, Andrea
Fonte: Valor Econômico, 25/10/2006, EU & Investimentos, p. D6

Há 11 anos, quando ficou conhecido por ter ajudado a desvendar um dos maiores casos de fraude do país, o do Banco Nacional - onde foram movimentados ilegalmente cerca de R$ 10 bilhões -, o bacharel em ciência da computação Paulo Quintiliano apostava em uma das carreiras mais promissoras do mercado, a de perito digital. Naquela época, ele foi um dos primeiros a atuar na esfera pública em crimes ligados à internet e a fazer parte da divisão de perícia de informática da Polícia Federal - hoje são 150 profissionais. Ele tinha ao seu lado apenas dois outros parceiros que juntos fuçavam códigos de programação para achar indícios de transações irregulares.

Hoje, com a popularização da internet e a multiplicação de delitos eletrônicos, que só em em 2005 causaram um prejuízo de R$ 300 milhões às instituições financeiras, segundo dados da Febraban, Quintiliano é espelho para muitos profissionais que querem ingressar na área. Atual chefe da divisão de perícias em informática da PF, ele ganhou notoriedade em junho passado, ao participar de megaoperação para desbancar uma rede de pedofilia pela internet.

"Os hackers dão muito mais dor de cabeça aos bancos do que os ladrões", afirma Quintiliano. "E nossa ação precisa ser rápida porque os cibercriminosos não deixam rastros por muito tempo e as provas podem ser deletadas". Ou seja, os peritos digitais são responsáveis por levantar as provas necessárias para colocar os "cibercriminosos" atrás das grades. Formado também em direito, Quintiliano reconhece que a profissão torna-se ainda mais atraente na esfera pública pela remuneração.

Quem ingressa por meio de concurso, tem salário inicial de R$ 10 mil e todos os benefícios de um funcionário do governo, como aposentadoria integral. "Mas é preciso estar bem preparado e saber lidar com desafios, porque a cada dia os cibercriminosos usam tecnologias mais sofisticadas". Para concorrer a uma vaga, a PF exige do candidato diploma de graduação em informática, entre outros pré-requisitos.

Só no último edital de concurso público da Polícia Federal 10 mil candidatos disputaram as 105 vagas abertas. Cabe a essa equipe produzir o grande volume de laudos técnicos - os quais comprovam crimes cibernéticos, fraudes on-line, extorsões e exploração de imagem de crianças e adolescentes - que cresce ano a ano. Em 2005, por exemplo, foram produzidos 1 407 laudos, contra 1 145 em 2004, 795 em 2003 e 464 em 2002.

Na esfera penal, o mercado também abre oportunidades de trabalho para os chamados peritos "ad hoc". Eles participam de inquéritos policiais, sem vínculo com o Estado, designados pelo juiz que analisa o processo, exercendo um cargo de confiança. Na esfera cível, o profissional atua como assistente técnico das partes, responsável por acompanhar o processo e até contestar laudos. De acordo com Guiliano Giova, presidente do Instituto Brasileiro de Peritos em Comércio Eletrônico e Telemática (IBP), estima-se que existam aproximadamente sete mil peritos digitais no país. "A procura por esses profissionais tem crescido e vejo como uma das carreiras que mais prometem futuro", diz.

Demanda que tornou seus salários para lá de atraentes. A remuneração de quem exerce a atividade como especialista na esfera cível varia entre R$ 5 e R$ 12 mil por mês. Apesar de serem disputados, muitos nem possuem diploma de nível superior. Isso porque a profissão ainda não é regulamentada pelo MEC e por ser recente no Brasil, não há cursos de graduação. "É claro que profissionais de tecnologia se encaixam melhor por dominarem o mundo dos bits e bytes", ressalta Giova.

De olho no potencial de mercado, o economista e administrador de empresas Ricardo Theil, resolveu apostar suas fichas na carreira de perito digital. No entanto, sua estratégia foi bem mais ousada. Em 2000, quando resolveu mergulhar na atividade, aproveitou sua veia empreendedora para montar uma empresa especializada na identificação de produtos piratas instalados nos computadores dos clientes. Com a evolução da internet, os problemas ganharam um novo escopo, exigindo do perito um perfil diferente. "Agora, o profissional faz análise e captação das provas eletrônicas", afirma.

Para ele, o caminho foi tranqüilo, já que desde cedo foi seduzido pela carreira de programador e analista de sistemas em grandes companhias, como Cosipa e Volkswagen. Essa bagagem tecnológica o permitiu enxergar o futuro promissor da profissão de perito digital ou forense, com escopo no ambiente virtual.

De lá para cá, Theil esteve à frente de outros negócios e atualmente é sócio-presidente da Zetta Technologies, empresa especializada em segurança e perícia digital, com faturamento anual de R$ 20 milhões. "Nossa equipe de peritos ajuda as empresas a descobrirem fraudes e a comprovarem falsa identidade de remetentes de mensagens ou verificar o acesso indevido a redes".

Dominar a tecnologia da informação, entretanto, não faz do profissional um especialista. Conhecer as formas de atuação dos criminosos virtuais requer atualização permanente de conhecimentos, o que tem feito crescer o número de cursos de extensão. Theil, por exemplo, é coordenador do curso de análise forense computacional da Módulo Security. Ele é dividido em dois módulos e tem uma prova de certificação no final.

De acordo com Zilta Marinho, diretora do Módulo Education Center, eles visam preparar profissionais em forense computacional (criminalista computacional) e resposta a incidentes; técnicas de aquisição e análise de evidências; técnicas de investigação, melhores práticas. "O perito digital ou forense não pode se deixar levar pela primeira impressão, deve ter ampla capacidade de análise", observa. A procura tem sido tão grande, que até o momento mais de 100 pessoas fizeram o curso.

Para os profissionais de tecnologia que precisam aprender métodos de identificação, rastreamento e preservação de provas eletrônicas, a Módulo acaba de lançar um curso sobre perícia eletrônica e provas de informática, com duração de um dia. Diante da necessidade do mercado, algumas empresas de segurança da informação oferecem cursos de curta duração, a exemplo da Axur Information Security, que conta com o forensics, voltado a investigação de situações suspeitas. Já o IBP fechou parceria com a Brasiliano & Associados e a Fecap com o objetivo de levar ao público curso de extensão universitária em prova e perícia eletrônica.