Título: Pacote abre oportunidades, avalia AES
Autor: Facchini , Claudia
Fonte: Valor Econômico, 04/10/2012, Empresas, p. B7

Passados vinte dias desde o anúncio da Medida Provisória 579, que abalou o mercado de energia, o presidente no Brasil da multinacional americana AES, Britaldo Soares, avalia que algumas mudanças serão positivas e até mesmo abrem oportunidades para a companhia, sobretudo no segmento de geração.

O grupo controla a geradora AES Tietê e a distribuidora de energia Eletropaulo, ambas em São Paulo, bem como a distribuidora gaúcha AES Sul. Como as concessões dessas empresas só vencem entre 2027 e 2029, a renovação dos contratos não tira o sono da multinacional, ao contrário do que acontece com a Cteep, Cesp e Cemig.

Mas isso não impediu que as ações da AES Tietê registrassem uma forte queda, reação que preocupou seus controladores. Desde o dia 31 de agosto, as ações da companhia acumulam uma desvalorização de 20% e seu valor de mercado encolheu de R$ 9,6 bilhões para R$ 7,7 bilhões.

A Eletropaulo atravessou bem melhor o furação, após ter sido duramente penalizada por uma revisão tarifária austera em julho. Desde o dia 31 de agosto, as ações da distribuidora acumulam alta de 2,8% e seu valor de mercado subiu de R$ 3,5 bilhões para R$ 3,7 bilhões.

As decisões adotadas pelo governo vão provocar efeitos em cadeia, com repercussões sobre todo o mercado de energia. Uma das medidas incluídas da MP, e que surpreendeu o mercado, foi a destinação da energia das antigas hidrelétricas com concessões renovadas para o mercado regulado, por meio de cotas para as distribuidoras.

Essa energia representa 20% da produção do país, ou o equivalente a 20 mil MW. Ninguém sabe ainda ao certo quanto desse volume está contratado atualmente no mercado livre e que, a partir de 2013, precisará migrar para as mãos das distribuidoras. Fontes do setor ouvidas pelo Valor estimam que essa quantidade se situe em torno de 3 mil e 3,5 mil MW.

Na avaliação de agentes do setor, essa migração vai enxugar a oferta no mercado livre e irá sustentar os preços. Logo após a divulgação da medidas, no dia 11 de setembro, havia expectativas de que os preços, ao contrário, cairiam.

"Haverá, sim, uma acomodação. Mas não vejo mudanças nos níveis de preços do mercado livre", diz Soares. "A medida pode criar uma oportunidade para a futura formação da carteira [de contratos] da AES Tietê", acrescenta.

Atualmente, toda a energia da Tietê é vendida para Eletropaulo por cerca de R$ 180 por MWh, valor bem acima dos preços negociados no mercado livre, entre R$ 100 e R$ 110 por MWh. Mas esse benefício concedido à multinacional termina a partir de 2016, quando a Tietê terá de encontrar outros compradores. O objetivo da companhia é comercializar toda essa energia no mercado livre.

As mudanças podem ajudá-la nessa tarefa. Isso porque a migração de empresas do mercado livre para o cativo não é automática. Os consumidores livres precisam comunicar para as distribuidoras a intenção de voltar para o ambiente regulado com uma antecedência de cinco anos. E as geradoras terão de continuar honrando seus contratos no mercado livre, mesmo que tenham de destinar, a partir de 2013, uma parte dessa energia para a distribuidoras. Isso deve obrigá-las a buscar alternativas, como a aquisição de energia da Tietê para cobrir suas obrigações.

Sobre a Eletropaulo, a maior distribuidora de energia do país, é esperado que a empresa receba sua cota de energia "velha". Estima-se que ela custará cerca de R$ 30 por MWh apenas. Esse preço será repassado para uma nova tarifa das distribuidoras, que será calculada pela Agência Nacional de Energia Elétrica no início de 2013.

A aquisição de uma energia mais barata, portanto, não terá efeito nas margens de lucro das distribuidoras. "O reflexo positivo virá da redução da inadimplência e do aumento do consumo devido à queda das tarifas", diz Britaldo.

Hoje, afirma, a Eletropaulo possui contratos de compra de energia que garantem 103% do seu consumo. Portanto, não precisaria, em tese, da energia adicional das hidrelétricas antigas. Mas, uma parte foi adquirida pela empresa em leilões das termelétricas do grupo Bertin, que não ficaram prontas.

Agora, a companhia aguarda uma decisão da Aneel, autorizando a descontratação dessa energia. Segundo Britaldo, isso abrirá espaço para a alocação da energia das hidrelétricas com concessões renovadas.