Título: Número de candidatos cresce 26% e atinge 481 mil
Autor: Klein, Cristian
Fonte: Valor Econômico, 05/10/2012, Política, p. A5

As eleições municipais no Brasil estão entre as maiores operações realizadas por uma democracia no mundo e ganharam um gigantismo ainda maior na disputa deste ano.

O país não é o maior em número de eleitores - é superado por Índia, Estados Unidos e Indonésia -, mas acelera o crescimento de um componente que lhe é caro: o exército de pessoas que se dispõe a competir por um cargo eletivo.

Nada menos que 481.446 candidatos - ou seja, algo equivalente a quase sete Morumbis lotados ou do tamanho das populações de Luxemburgo e do Suriname - concorrerão no domingo às vagas de prefeito, vice-prefeito e vereador, porta de entrada e base da pirâmide política.

O número representa um aumento de 26,6% em relação à última eleição municipal, em 2008, quando havia 380.150 candidatos.

Parte da explicação para o crescimento tem a ver com a elevação no número de vagas a vereador: que subiu de 51.992 para 57.422, com a autorização para os municípios que mudaram de patamar de eleitorado. O aumento, porém, é de 10,4%, enquanto o interesse pelas cadeiras na Câmara Municipal cresceu 29%. Ou seja, há algo a mais nesta procura desenfreada pelos cargos públicos.

O cientista político Jairo Nicolau, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), afirma que há poucos estudos comparativos sobre o tamanho das eleições entre os países, mas que, intuitivamente, a disputa municipal brasileira "deve bater todo mundo" no contingente de candidatos.

A combinação de três características contribui para o grande volume de concorrentes: o sistema multipartidário, a tradição federativa (que dá autonomia política a milhares de municípios) e o sistema eleitoral proporcional - e não majoritário, como nos Estados Unidos, onde cada vaga legislativa corresponde a um distrito, o que reduz bruscamente a concorrência.

Outra diferença importante é o desestímulo que há no acesso à candidatura. No Reino Unido e em países que já foram suas colônias há uma tradição de cobrança de taxa para que alguém possa disputar uma eleição. Na Índia, por exemplo, esse valor foi aumentado, nas últimas décadas, quando se observou um aumento muito grande no número de candidatos ao Parlamento Nacional.

"Em outros países, eles facilitam a criação de partidos, mas dificultam o acesso às candidaturas. Aqui é o contrário", afirma Jairo Nicolau.

O cientista político lembra que no Brasil há muitas restrições à fundação de um partido. Desde a nova legislação, de 1997, só foram criados quatro legendas - PSOL, PRB, PSD e PPL - e hoje o quadro partidário tem 30 siglas. Por outro lado, uma vez criados, há uma ampla gama de direitos e recursos políticos garantidos a estes partidos, como fundo partidário e espaço reservado para propaganda no rádio e TV.

Na Europa, compara Nicolau, partidos que não alcançam uma votação mínima perdem o direito de participar da distribuição das cadeiras legislativas - a chamada cláusula de barreira - e também não tem acesso à mídia.

"No Brasil, o partido pode fazer o que quiser, ter qualquer desempenho, que estará garantido na próxima eleição", afirma.

Com tantos direitos, até mesmo um concorrente com votação inexpressiva, como o candidato à Prefeitura de São Paulo, Levy Fidelix (PRTB), que impediu a realização de debate por não ter sido incluído, consegue ter voz ativa. "Eles têm poder de veto", afirma.

Esse modelo brasileiro, muito proporcional, com a fragmentação do poder entre partidos e candidatos, associa-se a um sistema de alta capilaridade federativa, que encontra nos municípios uma base de sustentação para os outros níveis de governo.

Jairo Nicolau estima que, "por baixo", entre 100 e 150 mil pessoas vivem de cargos públicos eletivos e ligados diretamente a eles, como assessores nomeados, nos termos do que um dia o sociólogo Max Weber chamou de política como vocação (ou profissão). "Duvido que haja algo parecido com esse número de quase 500 mil candidatos em outros países. Nenhum ramo da economia emprega tanta gente assim. São candidatos. Mas mesmo não sendo eleitos, muitos são absorvidos pelo sistema. É uma rede enorme de pessoas vivendo da política e algo que ainda não está estudado", afirma.