Título: Novas regras afetarão bancos médios
Autor: Lucchesi, Cristiane Perini e Carvalho, Maria C.
Fonte: Valor Econômico, 26/10/2006, Finanças, p. C4

Os vistosos retornos exibidos pelos bancos médios desde 2005 devem diminuir a partir do próximo ano, com a entrada em vigor das novas regras de contabilização das cessões de carteira de crédito. As novas normas, disse o presidente da Austin Ratings, Erivelto Rodrigues, vão elevar o custo de captação dos bancos e, provavelmente, mudar a estrutura de funding. Uma saída, é recorrer mais ao lançamento dos fundos de investimento em direitos creditórios (FDICs) cujas regras de contabilização são mais favoráveis.

A quebra do Banco Santos no final de 2004 causou um forte aperto de liquidez nas instituições de médio porte. A saída foi intensificar a cessão de carteira para os grandes bancos. Rodrigues calcula que as cessão de carteira nesses moldes atingiu R$ 15 bilhões.

Outra saída foi o lançamento de FDICs, que devem totalizar de R$ 12 bilhões a R$ 13 bilhões até o final do ano - embora nem tudo isso tenha sido emitido por bancos.

A cessão de carteira para outro banco ou fundo alavancou o resultado das instituições de médio porte. Ao realizar a operação, o banco que cede a carteira antecipa a contabilização do resultado que obteria ao longo do contrato de crédito, explicando os lucros vistosos de algumas das instituições médias nos últimos trimestres.

A cessão acarreta outros impactos contábeis: as carteiras cedidas com ou sem coobrigação são excluídas do balanço do cedente, liberando a alavancagem. No primeiro caso, apenas ficam registradas em conta de compensação fora do balanço, configurando a garantia ou coobrigação. Nos dois casos, o resultado é antecipado pelo cedente da carteira.

Em busca de maior transparência e harmonizar as regras locais com o padrão da International Accounting Standard Board (IASB), o BC já indicou que vai alterar as normas.

As mudanças afetam especialmente as operações com coobrigação, que constituem a grande maioria. Quando a nova regra estiver em vigor, a operação continuará fazendo parte do ativo na proporção da coobrigação assumida e só a receita obtida sobre a parte cedida pode ser antecipada contabilmente (a receita da outra parcela deverá ser reconhecida ao longo de sua maturação).

"A mudança de regime contábil para a cessão de crédito com coobrigação não é oficial e, quando e se ela ocorrer, o mais provável é que se aplique apenas a eventos futuros, não alcançando o estoque presente", disse Milto Bardini, presidente da Associação Brasileira de Bancos (ABBC), identificada como a entidade dos bancos pequenos e médios. Segundo ele, a mesma "flexibilidade" que levou os bancos a usar a cessão de crédito como forma de captação vai fazer com que eles encontrem "outros caminhos".

Os FIDCs serão utilizados cada vez mais, acredita Bardini. Ele lembra que as cotas sêniores dos FIDCs não têm coobrigação, só as cotas subordinadas, que correspondem em geral a 15% a 20% do total. Segundo o executivo, há interesse cada vez maior dos investidores no mercado interno e também no mercado internacional em adquirir FIDCs de valores que "não são insignificantes".

Para o presidente da ABBC, o mercado internacional também tem se apresentado como uma importante alternativa de captação de mais longo prazo para os bancos pequenos e médios, pois os investidores querem comprar os papéis dos bancos brasileiros. Os passivos são de mais longo prazo e casam com os ativos, como o crédito consignado e mesmo com o crédito para empresas brasileiras, que se alonga a cada dia.

O presidente da Austin acredita que as novas regras vão levar os bancos a tentar mudar as cessões de carteira para a modalidade sem coobrigação, o que elevará os custos de captação de CDI mais 5% a 6% para CDI mais 8% a 10%.

"Os resultados também serão afetados pela necessidade do reforço de provisões assim como da capitalização", disse Rodrigues.

Do lado do comprador da carteira há igualmente reflexos. Atualmente, para efeito de cálculo do capital mínimo, o risco é um dos menores pois leva em conta que a carteira é de varejo, pulverizada. Pela nova norma, o risco será o do banco cedente.