Título: Escalado o time da economia
Autor: Rothenburg, Denise; Kleber, Leandro
Fonte: Correio Braziliense, 24/11/2010, Política, p. 2

Dilma Rousseff oficializa hoje sua equipe de confiança, com Guido Mantega no Ministério da Fazenda, Alexandre Tombini na chefia do Banco Central e Miriam Belchior como titular do Planejamento

A presidente eleita, Dilma Rousseff, definiu o tripé da área econômica. Como o Correio antecipou, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, será o capitão da equipe, com Alexandre Tombini no Banco Central e Miriam Belchior no Planejamento. Esse desenho deixa Mantega fortalecido no futuro governo. Ele não só conseguiu emplacar o nome que bancou para a autoridade monetária como evitou que o Planejamento fosse ocupado por um político que pudesse ofuscá-lo na condução da política econômica.

Antes de fazer o anúncio, previsto para hoje, às 16h30, Dilma queria conversar com o atual presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, para formalizar sua saída e apresentar os nomes de sua futura equipe, o que deve ocorrer nesta manhã. Meirelles perde uma disputa que se prolongou durante boa parte do mandato de Mantega à frente da Fazenda, com seguidos embates por divergência na condução da política de juros e câmbio.

Apesar de ser considerado o sucessor natural no BC, Alexandre Tombini, convidado ontem, foi um nome bancado pelo ministro da Fazenda e é considerado um economista afinado com as ideias de Guido Mantega mesmo sendo de escolas teóricas diferentes. Com o servidor de carreira à frente da autoridade monetária, Dilma sinaliza que não haverá nenhuma ingerência na condução do banco.

A tentativa de colocar em xeque a autonomia foi o principal ponto de fricção entre a presidente eleita e Henrique Meirelles. Ela considerou pouco apropriada a tentativa do chefe do BC de usar a imprensa para mandar recado de que ele só continuaria no cargo se ficasse livre de pressões políticas.

Segundo assessores, Dilma jamais cogitou retirar a autonomia ou permitir que o BC fosse alvo de interferência externa. Segundo analistas do mercado financeiro, foi Meirelles que conduziu a taxa básica de juros Selic de maneira política ao não elevá-la no início do ano de olho em ser candidato a governador de Goiás ou a vice de Dilma.

Com um Banco Central renovado, a tarefa será lidar com uma expectativa deteriorada da inflação. A terceira prévia do IPCA veio acima da previsão do mercado. O aumento dos preços deve ficar acima do centro da meta perseguida pelo BC. A opção por Tombini privilegiou um nome que conhece a instituição. Mostrou, ainda, que havia dentro da equipe de transição e do PT temores de que a indicação de Nelson Barbosa, secretário de Política Econômica da Fazenda, poderia gerar uma crise de confiança.

Mantega também emplacou a manutenção de Arno Augustin na Secretaria do Tesouro Nacional, cargo que ocupa desde junho de 2007. Augustin havia sido confirmado como secretário estadual da Fazenda pelo governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro. Mas Tarso aceitou deixar de lado a indicação e deverá colocar no cargo Odir Tonollier, servidor do Tribunal de Contas do Estado, que já trabalhou com Augustin no governo gaúcho.

Reforçado Miriam Belchior, convidada na segunda-feira, comandará um Ministério do Planejamento robusto. Ela levará para a pasta a coordenação do Programa de Aceleração do Crescimento, além de tomar conta do Orçamento e da folha de pagamento da União. O atual ministro, Paulo Bernardo, deverá ser deslocado para um posto dentro do Planalto, provavelmente a Casa Civil. Mas o anúncio de hoje será restrito à equipe econômica. Nelson Barbosa também deverá ir para um posto próximo da presidente, como o de assessor especial para Assuntos Econômicos. Mas ele ainda poderá ser contemplado com um ministério, como o de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.

Miriam chegou a ser apontada como ministra da Casa Civil quando Erenice Guerra foi solapada do cargo por denúncias de irregularidades. A gerente do PAC, no entanto, temeu que sua indicação poderia inviabilizar sua vontade de ocupar um cargo no primeiro escalão do governo federal.

Próximos passos Confirmada a indicação da equipe econômica, a presidente eleita, Dilma Rousseff, passará a se dedicar à montagem dos postos do Palácio do Planalto e anunciá-los em bloco: Casa Civil, Secretaria-Geral e assessores especiais. Ainda não está claro qual o futuro da Secretaria de Relações Institucionais, atualmente ocupada por Alexandre Padilha, se ela será mantida ou extinta. Sabe-se que a Secretaria-Geral, que deve ser ocupada por Antonio Palocci, deverá acumular a tarefa de articulação política.

ANÁLISE DA NOTÍCIA Tropeço estratégico

Vânia Cristino

Ainda que não tenha emplacado na gestão Dilma, o goiano Henrique Meirelles deixa o governo Lula com a sensação de ser um vitorioso. A amigos, faz questão de lembrar que foi o titular do BC mais longevo. Ficou os dois mandatos de Lula e firmou-se como espécie de avalista das boas práticas em política econômica. Muitas vezes, bateu de frente com o ministro da Fazenda, Guido Mantega, que vai seguir no posto.

Quando tomou posse, em dezembro de 2003, depois de ter aberto mão do mandato de deputado federal mais votado de Goiás pelo PSDB, Meirelles assumiu com a desconfiança do mercado financeiro. Apesar da brilhante carreira internacional ¿ foi presidente mundial do BankBoston ¿, ele substituía o economista Armínio Fraga, tido como o mentor do sistema de metas de inflação.

Considerado um estrategista, Meirelles conduziu com segurança a política monetária, sobretudo em 2006, quando a queda da inflação ajudou Lula a se reeleger, a despeito das denúncias do mensalão. Apenas no primeiro ano, 2003, a inflação não ficou dentro da meta. Mesmo criticada, a taxa de juros atual, de 10,75% ao ano, está num dos menores patamares da história.

Meirelles nunca escondeu as pretensões políticas. Filiou-se ao PMDB no ano passado pensando em concorrer ao governo de Goiás ou à Vice-Presidência na chapa de Dilma. Acabou preterido pelo presidente do partido, Michel Temer. No fim de 2008 e início de 2009, enquanto o mundo afundava na crise financeira, o Brasil caiu numa rápida recessão, se recuperou e saiu fortalecido das turbulências sem a quebra de um único banco. O presidente do BC queria continuar no governo Dilma, mas acabou pagando o preço de impor suas condições ¿ como a autonomia do BC ¿ à presidente eleita por meio da imprensa. Desta vez, falhou em sua estratégia.

LULA E O REAJUSTE

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem que o governo já fez o que tinha que fazer em relação ao reajuste do salário mínimo, que foi o acordo com as centrais sindicais indexando o reajuste à variação da inflação e do PIB. Após cerimônia na Base Aérea de Brasília, Lula lembrou que o país já tem uma presidente eleita e se comprometeu a conversar com Dilma Rousseff sobre o assunto, acrescentando que o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, tem debatido o assunto com ela.

Segundo Lula, se Dilma quiser fazer alguma modificação no reajuste previsto, ¿é só falar que a gente faz¿. Bernardo, no entanto, afirmou que o governo não tem condições de conceder o aumento pedido pelas centrais sindicais, que é de R$ 580. A proposta do governo é de R$ 540.

Ao encerrar a cerimônia de apresentação da orquestra Escola de Tempo Integral Dona Lindu, ainda na Base Aérea, Lula se dirigiu aos jornalistas e começou a distribuir os folhetos sobre a escola. ¿Companheiros, por favor, escrevam alguma coisa sobre a minha escola. Escola Dona Lindu, gente, escrevam alguma coisa sobre isso, por favor. Aqui, companheiros e companheiras, um folhetim da Escola D. Lindu¿, panfletou o presidente.

OS NOMES FORTES

Alexandre Tombini Banco Central

O diretor de Normas do Banco Central era considerado o sucessor natural de Henrique Meirelles. A presidente eleita preferiu privilegiar um servidor de carreira por considerar que não precisava de um nome do mercado financeiro para dar credibilidade à sua política monetária. A equipe de transição considerou que o nome de Nelson Barbosa, secretário de Política Econômica da Fazenda, poderia representar mudanças no rumo da instituição.

Miriam Belchior Ministério do Planejamento

A coordenadora do Programa de Aceleração do Crescimento vai comandar um Ministério do Planejamento mais robusto para tocar a segunda fase do PAC, além de cuidar do Orçamento e da folha de pagamento da União. Antes do governo federal, trabalhou na prefeitura de Santo André (SP). Ela é ex-mulher de Celso Daniel, o prefeito assassinado da cidade do ABC paulista.

Guido Mantega Ministério da Fazenda

O ministro da Fazenda assumiu o cargo em 2006. Antes trabalhou como ministro do Planejamento e presidente do BNDES. No PT, foi assessor econômico de todas as campanhas do presidente Lula até chegar ao Palácio do Planalto. Mantega tornou-se nome de confiança de Dilma por conta da maneira como ele lidou com as crises financeira internacional e a cambial. A nomeação de Tombini é uma vitória política dele contra Henrique Meirelles, seu desafeto.

Arno Augustin Secretaria do Tesouro Nacional

O economista gaúcho está na Secretaria do Tesouro Nacional desde junho de 2007. Apesar de ocupar um cargo técnico, ele é filiado ao PT e ligado à corrente de esquerda do partido Democracia Socialista. Antes de ser empossado no cargo no Ministério da Fazenda, ele era secretário-geral do PT gaúcho. O governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, havia anunciado Augustin como secretário da Fazenda, mas o ministro Guido Mantega acabou por convencê-lo a ficar em Brasília por pelo menos mais um ano.