Título: Jaques Wagner condena 'espetáculo' do julgamento
Autor: Ulhôa , Raquel
Fonte: Valor Econômico, 10/10/2012, Política, p. A6

O governador da Bahia, Jaques Wagner (PT), afirma que o julgamento do processo do mensalão do PT ganhou "conotação politizada demais" e tem influência nas eleições municipais, embora não seja determinante. No segundo turno, acredita que o peso será menor - assim como o das greves que desgastaram sua gestão -, já que o eleitor "despejou um pouco de sua raiva". Wagner diz que o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF) virou um "espetáculo", que transforma ministros em heróis e constrange os que contrariam o senso comum.

"Uma coisa é a transparência, outra é o espetáculo. Não sei se faz bem à democracia. (...) Então o ministro Ricardo Lewandowski [revisor] está proibido de ter opinião jurídica diferente de Joaquim Barbosa [relator], porque um virou herói? Lewandowski é um dos 11 integrantes. Então tudo o que falar está contaminado, porque não está no senso comum do que todo mundo pensa? Então vamos fazer justiça com as próprias mãos", diz.

Para Wagner, os envolvidos tiveram "julgamento público" e pagaram preço muito alto, com constrangimento pessoal e familiar. No caso do ex-ministro José Dirceu, compara a cassação na Câmara à pena de morte. No segundo turno, defende que o PT enfrente esse debate, lembrando os escândalos que abateram a oposição. "O povo sabe que tem demônios e santos em tudo que é partido. E que nenhum deles tem a tutela da moralidade absoluta", diz.

Com um olho no segundo turno da eleição de Salvador, onde o candidato do PT, Nelson Pelegrino, vai disputar com Antonio Carlos Magalhães Neto (DEM), e o outro no cenário nacional, no qual é um dos nomes do PT para a sucessão da presidente Dilma Rousseff, Wagner minimiza a vitória do governador Eduardo Campos (PSB) nesse primeiro turno, com a eleição de Geraldo Júlio em Recife. Para ele, lá "o PT é que acabou com o PT", com um "rol de trapalhadas".

O governador considera natural que Campos tenha pretensão de disputar a Presidência da República, mas diz que, apesar disso, não pode ser visto como opositor do PT, mesmo tendo vista os embates no Recife e em Belo Horizonte, onde Marcio Lacerda venceu no primeiro turno com apoio do tucano Aécio Neves, e Fortaleza, cidade na qual o segundo turno será disputado pelas duas legendas.

Evitando antecipar uma ruptura da base de Dilma, nega que haja uma "trama" entre o colega de Pernambuco, que é presidente do PSB, e Aécio, para uma aliança futura, contra o PT. Wagner prefere atribuir a uma "infeliz coincidência" o fato de PT e PSB terem se enfrentado nessas três cidades estratégicas. "Me consta que Aécio quer ser presidente. Ele [Campos] vai ter interesse em se afastar desse projeto para ser vice do Aécio?"

O governador, cuja base aliada elegeu cerca de 340 prefeitos dos 417 da Bahia, já articula a participação de Dilma e de Lula em comício de Pelegrino. No primeiro turno, ambos gravaram para o programa eleitoral, mas apenas o ex-presidente foi a Salvador. Quer, também, o apoio do PMDB de Geddel Vieira Lima - aliado de Dilma, mas oponente de Wagner na Bahia - no palanque do petista. O PMDB lançou Mário Kertész, que ficou em terceiro, com mais de 9% dos votos.

"Como existe um alinhamento nacional do PT com o PMDB, entendo que tem uma naturalidade da política essa aproximação, não uma obrigatoriedade. (...) Estamos discutindo uma campanha eleitoral em que está o projeto da Dilma versus o projeto do [José] Serra ou do Aécio [Neves], do DEM e do PSDB", afirma Wagner.

Mas não vai oferecer a Geddel vaga na chapa governista à eleição majoritária de 2014, em troca do apoio a Pelegrino. As três vagas (governador, vice e senador) já são poucas para acomodar os partidos que integram hoje sua base. Compromete-se apenas com a possibilidade de o PMDB, se for para a base, participar das negociações.

"Não fico devendo o que não posso entregar. Se o Geddel apoiar Pelegrino, não está na obrigação de apoiar meu candidato em 2014. A recíproca é a mesma. Se ele tiver no apoio ao governo, é um partido que entra na discussão. Mas não posso dizer que a vaga é dele e desconstituir um conjunto de partidos." A permanência ou não de Geddel no governo federal - ele ocupa a vice-presidência de Pessoa Jurídica da Caixa Econômica Federal -, caso decida apoiar o DEM, é uma decisão de Dilma e do PMDB, diz Wagner.

No caso da eleição de Salvador, Wagner avalia que o julgamento do mensalão teve seu peso, assim como outras variáveis, como a greve de policiais e a de professores, que durou mais de cem dias, que desgastaram seu governo.

Embora rejeite a tese da transferência de dinheiro do PT para aliados em troca de apoio ao governo - o que foi batizado de "mensalão do PT" -, Wagner admite que o PT envolveu-se numa "grande trapalhada", em 2004, quando ajudou financeiramente os partidos aliados. A estratégia era eleger mais de mil prefeitos da base, para chegar mais forte a 2006, na reeleição de Lula.

Ele responsabiliza o sistema eleitoral brasileiro, no qual os candidatos têm de buscar financiamento para as campanhas, e defende o financiamento público, como forma de dar oportunidade a quem quer disputar "sem ter que passar o chapéu". Com o medo do empresariado de financiar campanhas e, futuramente, se ver envolvido em algum escândalo, o governador confirma que aumentou a chamada doação oculta, pela qual transferências são feitas aos partidos que, por sua vez, fazem a distribuição às candidaturas. "Tem um jogo de hipocrisia. Porque, se o cara ajudou, não ser um privilegiado [após a eleição], mas também não pode ser um pária. Por isso, acho que as pessoas exorbitam na crítica, porque ficam no céu ou no inferno. E a vida é muito mais purgatório."

Em seu segundo ano de mandato, Wagner diz que sonha em disputar a Presidência, mas nega ter obsessão pelo projeto. Sua prioridade é reeleger Dilma em 2014. Ele não descarta a possibilidade de ficar no cargo até o fim do mandato e não disputar as próximas eleições. Para facilitar a composição dos aliados na chapa majoritária (governador, vice e senador), Wagner aceita disputar a Câmara dos Deputados.

Wagner diz que continuará, na campanha de Salvador, o discurso do alinhamento político entre prefeitura e governos estadual e federal, mas nega que seja uma ameaça de discriminação, se o eleito for de outro partido. Ele define o que prega como um "alinhamento de projeto, sinergia de pensamento".

Após 12 anos de gestão petista na Presidência da República, o governador diz que há um desgaste do governo. Mas cita o crescimento de cerca de 15% do PT, nessas eleições, como um dado para mostrar que o partido ainda tem fôlego, embora alguns interpretem que o peso da influência de Lula diminuiu.