Título: Brasil acusa Lamy de ceder a pressões dos EUA na disputa sobre o algodão
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 27/10/2006, Brasil, p. A2

O Brasil tomou uma atitude sem precedentes, ontem, na Organização Mundial do Comércio (OMC), denunciando o diretor-geral, Pascal Lamy, por ter substituído dois dos três juízes do painel original para examinar se os Estados Unidos retiraram ou não subsídios proibidos a seus produtores de algodão.

Aproveitando a reunião do Órgão de Solução de Controvérsias, o Brasil praticamente acusou Lamy de ter se dobrado a pressões americanas, tudo em linguagem diplomática. O conflito do algodão é um dos mais sensíveis da história do sistema multilateral de comércio e ameaça desmantelar vários programas de subsídios americanos. O Brasil ameaça pedir direito de retaliar produtos americanos em US$ 4 bilhões, alegando que Washington não retirou todos os subsídios condenados pela OMC.

Para o Brasil, a situação é preocupante porque, com dois juízes novos, quem vai ter mais influência na decisão sobre os subsídios americanos é o próprio secretariado da OMC.

A disputa já passou por um painel de três juízes, que condenou os EUA. Washington recorreu ao Órgão de Apelação e perdeu de novo. No mês passado, o Brasil trouxe o caso de volta à OMC, acusando Washington de não ter acabado com todos os subsídios condenados.

O Brasil pediu que os juízes examinassem o caso, em razão do conhecimento legal, ainda mais que são 2.500 páginas de documentos. Os americanos reagiram, pedindo outros juízes, alegando que dois - um polonês e um australiano - eram originários de países que participavam como terceira parte com interesses comerciais na disputa.

O Brasil estranhou que os Estados Unidos não tenham objetado os juízes no painel precedente e para outras decisões no caso do algodão. Além disso, Washington aceitara esse tipo de indicação em outras disputas.

Na ausência de acordo, o diretor da OMC foi acionado para compor o painel "em consultas" com os beligerantes. Lamy manteve apenas o chileno Mário Matos do painel original, substituindo o australiano e o polonês por um mexicano e um coreano. O Brasil recebeu a escolha como imposição, e denunciou "esse precedente terrível para a OMC".

Já os EUA acusaram "imperfeições" na reação brasileira, reclamando que o governo brasileiro rejeitou "esforços" americanos para cooperar. Os EUA acabaram agradecendo Lamy "pela composição apropriada do painel".