Título: Governo terá de fazer um forte ajuste fiscal
Autor: Murakawa , Fabio
Fonte: Valor Econômico, 08/10/2012, Internacional, p. A8

Reeleito presidente da Venezuela, Hugo Chávez terá em breve de dar más notícias ao seu eleitorado. Devido ao grande aumento nos gastos do governo e ao alto nível do déficit público, o governo deverá ter de fazer um forte ajuste fiscal, possivelmente no início do próximo ano.

Segundo estimativa do banco Morgan Stanley, o déficit fiscal venezuelano saltou de 8,7%, em 2009, para 11,9% do PIB (Produto Interno Bruto) neste ano. Esse déficit, dizem economistas, foi alimentado sobretudo pelo aumento dos gastos do governo, que se aceleraram com os investimentos em programas sociais neste ano eleitoral.

Uma economista ligada ao governo venezuelano disse ao Valor que o gasto público subiu 25% neste ano em relação a 2011. Para ela, assim para como outros analistas, um ajuste fiscal é "inevitável". "Essa alta de gastos ocorre, em boa medida, por ser um ano eleitoral. No ano seguinte, normalmente se reverte um pouco essa tendência."

Segundo essa economista, o governo venezuelano terá de fazer esse ajuste tanto por meio de uma alta de impostos como de um corte de gastos. Uma saída provável, disse ela, é promover uma alta do IVA (Imposto sobre Valor Agregado), hoje em 12%, "muito abaixo da média da região". "Também pode o governo promover o corte de gastos ao aumentar o salário mínimo no ano que vem com um índice abaixo da inflação", disse ela.

A inflação venezuelana, uma das mais altas da região, fechou o ano passado em 27,6%. Neste ano, com o aperto do controles de preço pelo governo, o Morgan Stanley prevê um índice de 17,5%.

Outra medida tida como inevitável é uma desvalorização da moeda local, o bolívar, frente ao dólar. Com o câmbio controlado pelo governo, a moeda americana está cotada a 4,30 bolívares desde 2010, enquanto o dólar paralelo - ilegal no país - já chega a 12 bolívares. A estimativa de analistas é que haja uma desvalorização para cerca de 6,5 bolívares. Para muitos, porém, o "câmbio real" venezuelano deveria ser 7,5 bolívares/dólar.

Em um país onde o governo controla as divisas advindas do petróleo, que representam cerca de 96% das exportações, essa desvalorização do câmbio permitiria ao Estado reduzir seu nível de endividamento em bolívares.

Para analistas, Chávez terá mais condições políticas de fazer um ajuste forte logo no início do mandato, em 2 de janeiro, do que teria seu adversário derrotado nas eleições de ontem. "Para Capriles, a questão de governabilidade é mais complexa. Ele poderia ter problemas ao fazer um ajuste desse tipo, com corte de gastos e alta de impostos", diz a economista ligada ao governo, antes da divulgação dos resultados. "Chávez poderia fazer um ajuste mais agressivo no começo do mandato. Já com Capriles, esse ajuste teria de ser mais gradual, ao longo do ano de 2013."

Fatores políticos podem ainda atrasar esse ajuste, dizem analistas. O país terá em dezembro eleições regionais, e ninguém acredita que Chávez elevará impostos, cortará gastos e fará uma desvalorização até lá. Outro fator que pode adiar o ajuste são as eleições municipais, marcadas para abril de 2013.

Dados do Banco Central da Venezuela dão ideia do desajuste das contas do governo. Entre dezembro e agosto, as reservas internacionais caíram de US$ 29,3 bilhões para US$ 27,9 bilhões. Desse total, cerca de US$ 24,9 bilhões correspondiam ao ouro repatriado por Chávez no fim do ano passado. E apenas cerca de US$ 3 bilhões seriam em moedas conversíveis. Com isso, a parcela líquida das reservas é suficiente para cobrir só um mês de importações.

A dívida externa pública, que no primeiro trimestre de 2009 era de US$ 39,564 bilhões, saltou para US$ 86,137 bilhões ao final do segundo trimestre deste ano. (FM)