Título: PT fecha com Jader para vencer no Pará
Autor: Barros, Bettina
Fonte: Valor Econômico, 27/10/2006, Política, p. A8

A estratégica aliança política com o PMDB e o apoio contundente do presidente Lula poderão levar o PT ao poder no Pará pela primeira vez, encerrando um período de 12 anos consecutivos de governo tucano no Estado. Analistas e políticos locais afirmam que a disputa eleitoral está embolada e é ainda difícil prever resultados devido à disparidade das pesquisas.

Aritmeticamente, no entanto, a senadora petista Ana Julia Carepa, que obteve 37% dos votos em 1º de outubro, seria a favorita neste domingo. O raciocínio é de que ela irá angariar os quase 15% obtidos pelo PMDB e os 6% do P-SOL no primeiro turno. Almir Gabriel (PSDB), que governou por duas vezes o Estado, teve 44% dos votos.

Mas Almir Gabriel não é um adversário qualquer. Figura respeitável no PSDB, ligado a Mário Covas, o ex-governador tem forte influência e popularidade no Estado.

Ruídos de última hora na campanha eleitoral - o desaparecimento de pastas com informações confidenciais dos tucanos e a apreensão pela Polícia Federal de nove mil exemplares de um jornal acusando petistas de crime eleitoral - parecem não ter atingido o objetivo de desequilibrar drasticamente o pleito. O que importou, neste ano, foi o que muitos consideraram a maior tacada política no Estado: a coligação do PMDB de Jader Barbalho ao PT. "Transcorridos 25 anos, os extremos se uniram", diz o sociólogo e analista político Manoel Alves, da Universidade Federal do Pará. "Partidos que no passado tinham discursos virulentos e de oposição, agora estão juntos."

Além de seguir a diretriz da cúpula petista, que em nível nacional se aproximou do PMDB para viabilizar a reeleição de Lula, a coligação paraense foi determinante para levar a disputa ao segundo turno e permitir uma eventual vitória de Ana Julia. A senadora, que já perdeu a Prefeitura de Belém em 2004, não queria disputar este ano. Achava que não passaria sequer para o segundo turno.

Jader teve um papel crucial no convencimento de Ana Julia. Ela sofreu também forte pressão da cúpula petista, que preferia a senadora ao deputado estadual Mário Cardoso. Ana Julia concordou, mas diante da estratégia de Jader de lançar um candidato do PMDB para perder e desequilibrar a equação. "Traçamos essa estratégia", diz o deputado federal Zé Geraldo, presidente estadual do PT. "O PMDB é o fiel da balança".

Jader lançou José Priante, que, apesar da fraca representatividade, teve quase 15% dos votos. "Priante sairia como deputado federal, o que era vitória garantida, mas obedeceu. Em troca, receberia um cargo num eventual segundo governo Lula", diz uma fonte familiarizada com os bastidores do poder paraense.

A coroação do acordo pôde ser vista nos dois comícios de Lula em Belém, nos quais o presidente, para o espanto de muitos, beijou a mão de Jader. Admirado por sua astúcia, Jader é também um símbolo de péssimas práticas políticas. Em 2001, renunciou ao mandato e à presidência do Senado para evitar ser cassado por quebra de decoro e corrupção.

A interpretação em Belém é que, com uma possível vitória do PT, Jader sairia duplamente vitorioso. Recém-eleito deputado federal mais votado no Estado, ele ampliaria sua crescente influência no governo Lula e asseguraria cargos estaduais importantes, como o órgão de coordenação da Amazônia. "Na soma, talvez tenha mais poder que as lideranças petistas locais", diz Alves.

Em entrevista recente a seu canal de televisão RBA, Jader ventilou que o PMDB tem quadros experientes para colocar à disposição do governo de Ana Julia. "O PMDB é um partido influente", disse Ana Julia, em entrevista ao Valor. Com a perna quebrada após ter caído de um palanque, ela criticou seu adversário por associá-la a Jader, lembrando que o próprio Almir é cria política dele. Cria que voltou-se contra o criador.

Com 6,9 milhões de habitantes, o Pará é o 11 PIB do país. Desde 1998, sua economia tem crescido acima da média nacional, impulsionada pelo bom momento dos minérios, sua maior fonte de riqueza. Em 2004, sua indústria cresceu mais que a do resto do país (10,4% contra 8,3%) e um desempenho semelhante se viu no ano passado (3,8% e 3,1%). Seu modelo de desenvolvimento atrai mão-de-obra na implantação de grandes projetos, estimula a migração, mas emprega pouco na operação e não tem vocação distributiva. Com isso, o analfabetismo aumentou para 15,31%, acima também da média nacional, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) recuou para a 17 posição e mais da metade da população não tem água potável.

Recentemente, o atual governador, Simão Jatene, convocou seu secretários e soltou a má notícia: o Estado tem um rombo de R$ 150 milhões. Uma das possibilidades para reduzir o buraco seriam as transferências do governo federal como compensação pelas perdas da Lei Kandir. A lei, da década passada, desonera exportações de matérias-primas e semi-acabados. O Pará é um Estado essencialmente exportador desses produtos.

A candidata petista, no entanto, criticou a Cia. Vale do Rio Doce, que no Pará está situada em Carajás. "Quero uma relação respeitosa com a Vale, mas que não deixará de ser rígida". Ela explica: exigirá que a empresa deixe um percentual de matéria-prima suficiente para as siderúrgicas locais. "Para que a gente possa fazer a verticalização do minério".

"Não seriam mais que 3% e isso é totalmente possível. Só falta vontade política". A candidata é contra o modelo de acordos anteriores feitos com o governo tucano, como a construção de 30 mil casas pela Vale. "Isso eu negocio com o governo federal, através da Caixa Econômica Federal. Eu quero que a Vale faça compensações nesse Estado, que ela faça uma obra estruturante, como as eclusas do Tucuruí".

As obras do PSDB no Estado são vultosas, mas dividem opiniões. Os tucanos privilegiaram obras como o sistema de macrofrenagem (a obra de maior alcance social), a construção da alça viária em Belém, a reforma do aeroporto internacional e a revitalização de uma parte do porto da capital, que se transformou em pólo gastronômico e cultural. Para a oposição, na sua maioria, não passam de benefícios que atenderão exclusivamente a elite paraense. Por problemas de agenda, o candidato do PSDB não pôde conceder entrevista ao Valor.