Título: Serra vai radicalizar uso de mensalão
Autor: Lima , Vandson
Fonte: Valor Econômico, 08/10/2012, Política, p. A15

Primeiro colocado na rodada inicial da sucessão à Prefeitura de São Paulo com 30,7% dos votos válidos, José Serra (PSDB) deu sinais claros de que radicalizará a disputa com Fernando Haddad (PT) no segundo turno com a exploração da ação penal do mensalão.

No pronunciamento que fez depois da divulgação do resultado, Serra sublinhou a questão tão logo terminou os agradecimentos de praxe e foi direto na jugular. "Quero reiterar aqui que, para mim, a ação política é revestida de valores, uma coisa que no Brasil ameaçou sair de moda e que felizmente com o nosso STF [Supremo Tribunal Federal, está voltando à moda", pontuou. Antes do primeiro turno, o PSDB distribuiu pela cidade um milhão de folhetos com os dizeres "diga não ao mensalão, não vote no PT nesta eleição".

Serra se vendeu como um realizador com capacidade de tirar projetos do papel e ressaltou o "valor da parceria, em primeiro lugar, com o governo do Estado, que tem um peso administrativo e na política pública da cidade decisivo", em estratégia para colar sua imagem à do governador Geraldo Alckmin (PSDB), em contraponto ao apoio da presidente Dilma Rousseff a Haddad.

Presentes ao evento, aliados já davam sinais de que buscariam todos os apoios possíveis para o segundo turno da disputa. Vice na chapa de Serra, Alexandre Schneider (PSD) encheu de elogios o terceiro colocado, Celso Russomanno (PRB). "Russomanno fez uma campanha com um resultado bastante bom para um partido que está começando na capital [...] tem que respeitar Russomanno. Ele é um excelente candidato", observou, salientando que "todos que quiserem se aliar à chapa serão bem-vindos".

Já o atual prefeito Gilberto Kassab (PSD) defendeu que a campanha faça a comparação entre os períodos em que ele e Serra estiveram na gestão e os que o PT comandou a cidade. "Assim como PT acha que nossa administração cometeu equívocos, nós entendemos que a administração do PT foi extremamente ineficiente em São Paulo. E hoje a prefeitura está numa situação muito favorável do ponto de vista financeiro e de realizações".

Pela manhã, Serra disse que embora confiante, não estava "totalmente tranquilo" de que passaria para o segundo turno da eleição. Ele saiu de casa por volta das 10h50 e votou no colégio Santa Cruz, próximo dali. Durante todo o percurso, cumprimentou aqueles que se diziam seus eleitores, distribuindo beijos em adolescentes e senhoras.

Um tanto assustado com a movimentação, um eleitor de Serra lamentava-se por votar justamente no horário do candidato. "Como voto na mesma seção do Serra, todo ano procuro evitar o horário dele, mas não tive sorte", afirmou Luiz Fernando Duval, gerente financeiro de 51 anos. Duval justificou seu voto em Serra por ser o PSDB um "partido mais central, nem de direita, nem de esquerda", e se disse confiante no segundo turno. "Agora quanto a ganhar as eleições, sinceramente não tenho certeza".

Em seguida, Serra acompanhou Alckmin, que votou em um colégio no Morumbi. Foram depois para um restaurante na Mooca, bairro onde o tucano nasceu, na zona leste. Questionado, Serra disse que não via diferença entre ir ao segundo turno com Haddad ou Russomanno. "Não muda nada".

Para o segundo turno, integrantes da campanha de Serra garantem que eventuais rusgas na sigla ficarão para trás. O deputado federal Walter Feldman assegurou que até o secretário estadual de Energia, José Aníbal (PSDB), derrotado por Serra nas prévias partidárias e seu desafeto, se engajará na campanha. "O Aníbal não está dentro, mas também não faz trabalho contra, e no segundo turno vai estar presente". Feldman estava entre os tucanos que apostavam antes da votação no embate com o PT no segundo turno.

A avaliação de Serra sobre a corrida eleitoral paulistana era a mesma feita pelos analistas, mas ele preferiu não falar em público: Russomanno despencou por causa de uma proposta desastrada para a área de transportes e de suas ligações com a Igreja Universal do Reino de Deus. O julgamento do mensalão pesou para o PT, mas não a ponto de tirar Haddad do segundo turno. A nova virada, analisam os tucanos, se deu por dois motivos: os erros do adversário do PRB e a algo que há anos não ocorre no PSDB: a unidade entre seus principais líderes, que teriam passado a falar a mesma linguagem.

Serra tem conversado com todos os tucanos com os quais teve problemas no passado: do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso ao senador Aécio Neves (MG), seu principal adversário na indicação do candidato tucano à Presidência. Dizem os correligionários que ele e Aécio, por exemplo, têm conversado, sem muito entusiasmo, é verdade, mas se falam. A interlocutores, Aécio tem dito não acreditar que Serra tente outra vez concorrer à Palácio do Planalto. Não faria bem para sua imagem. Serra não diz sim nem não. Mas aliados e conhecedores profundos da alma de Serra asseguram que ele não pensa em outra coisa: se Lula ganhou na quarta tentativa, ele também pode. Serra tem 70 anos. Teria 74 quando ao terminar um eventual mandato.

Embora não tenha perdido o hábito de discutir com jornalistas, Serra mudou seu jeito de fazer campanha, dizem os mais próximos. Está mais afável com os colegas de partido, que costumava tratar mal; também abraça e cumprimenta a população, o que não costumava fazer em outras ocasiões. No sábado pela manhã, Serra visitou o Museu do Futebol e tirou centenas de fotos com meninos e meninas, que podiam ser baixadas de seu site.

No Pacaembu, foi xingado uma vez. Um pai, caminhando com o filho, gritou "vai embora Serra, vai". Serra fingiu que não ouviu. Quem reagiu foi o deputado federal Walter Feldman (PSDB-SP). Na véspera, uma mulher também ofendera Serra. Feldman outra vez saiu em defesa: "petista mensaleira".