Título: Imposto recorde garante gastança
Autor: Caprioli, Gabriel
Fonte: Correio Braziliense, 24/11/2010, Economia, p. 15

Receita Federal arrecadou R$ 74,4 bilhões em outubro e R$ 648 bilhões no acumulado do ano, ambos volumes inéditos para os períodos

A gastança desenfreada do governo não ficará desamparada na reta final do governo Lula, se depender do apetite do fisco sobre a renda das empresas e dos contribuintes brasileiros. Depois de ser atropelado pela confusão envolvendo a ex-secretária da Receita Lina Maria Vieira e de ter feito vistas grossas para a quebra do sigilo fiscal de tucanos, durante a campanha presidencial, o atual secretário da instituição, Otacílio Cartaxo ¿ que deverá ser dispensado pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega ¿, deixará como legado uma arrecadação de impostos e tributos crescente, que atingiu, somente em outubro, R$ 74,4 bilhões ¿ o décimo-terceiro avanço consecutivo. Apesar de ter perdido ritmo, o recolhimento mais uma vez foi recorde para o período. Quando descontada a inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a soma de recursos cobrados cresceu no mês passado 2,89%, em relação a outubro de 2009.

Até setembro, a arrecadação avançava ao ritmo de dois dígitos. A desaceleração, segundo o subsecretário de Tributação e Contencioso, Sandro de Vargas Serpa, deve-se a um efeito estatístico, resultante da combinação do início da recuperação econômica e de receitas extraordinárias ¿ ambos ocorridos em outubro do ano passado. É que, além da economia brasileira estar saindo da crise naquela época, o Tesouro Nacional foi buscar na Caixa Econômica Federal R$ 5 bilhões em depósitos judiciais pendentes que serviram para inflar a conta de receitas e evitar que se completassem 12 meses de quedas consecutivas na arrecadação.

Na conta que expurga os depósitos judiciais raspados do tacho da Caixa no ano passado, a arrecadação demonstra pleno vigor, com aumento real de 10,96% no mês passado, quando comparado a outubro de 2009. No ano, a mordida do fisco somou R$ 648,029 bilhões, alta de 11,87%, descontando o IPCA e de 12,87%, desconsiderando a inflação e o efeito dos R$ 5 bilhões em depósitos.

¿A arrecadação volumosa continua refletindo um nível de atividade bastante forte e vai continuar sendo a salvadora da pátria (para as contas públicas)¿, avaliou Felipe Salto, economista da Consultoria Tendências. Para ele, o desempenho positivo da economia tem sido suficiente para o governo manter os planos de reduzir vagarosamente a dívida líquida em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) de 40% para 30%, como quer Dilma Rousseff, fazendo uma economia mínima para o pagamento dos juros da dívida (superavit primário), o que desestimula um esforço maior na contenção de gastos.

Serpa confirma que os tributos que mais contribuíram com o aumento da arrecadação em outubro acompanham a atividade econômica. A receita previdenciária (ligada à massa salarial) avançou 12,43% e somou R$ 19,3 bilhões no período. Já o Pis-Cofins (influenciado tanto pela produção como pelas vendas) cresceu 8,02% para R$ 16,0 bilhões.

O mesmo cenário deve se repetir nos próximos meses, segundo avaliação de Serpa, o que garantirá crescimento real da arrecadação no ano entre 10% e 12%, previsão oficial de Cartaxo. O consultor do Centro de Orientação Fiscal (Cenofisco) Jorge Lobão acredita que a tendência de aquecimento do varejo no fim do ano deve contribuir com esse quadro. ¿As compras dessa época sempre ativam um ciclo no qual tanto os lojistas quanto as empresas ganham mais e calculam somas maiores de impostos a pagar. Com dinheiro no bolso, com certeza o consumidor vai procurar roupas, brinquedos e bens eletrônicos (para comprar)¿, afirmou.

Produção e vendas O desempenho do recolhimento de impostos em outubro sofre influência de indicadores de setembro da produção e das vendas, conhecidos como ¿fatos geradores da arrecadação¿. Em setembro, a indústria cresceu 6,32% e as vendas 5,90%, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A massa salarial, por sua vez, avançou 10,78% no mesmo mês.

Mais capital ao BNDES O estatuto social do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) foi alterado ontem, por meio de decreto assinado pelo presidente Lula, para formalizar o aumento de capital da instituição em R$ 2,7 bilhões. O anúncio consta da edição do Diário Oficial da União (DOU) e desembaraça outro decreto, publicado em abril deste ano, no qual o governo permitiu a operação.

O aumento de capital do banco foi realizado naquela ocasião por meio da transferência de direitos futuros que a União tem a receber da Eletrobras, em função de um adiantamento de recursos para aumento de capital da estatal do setor elétrico. Na prática, a União repassou ao BNDES o direito de receber ações da Eletrobras que seriam entregues futuramente ao governo em função do aumento da participação acionária na empresa.

De acordo com o BNDES, como o decreto apenas formaliza judicialmente a operação, os impactos contábeis já foram absorvidos em abril. Segundo o texto publicado ontem, com as transferências, o capital do banco passa a ser de R$ 25 bilhões, dividido em mais de 6,2 bilhões de ações nominativas.

As trocas de ativos entre empresas nas quais a União detém participação são, normalmente, utilizadas para atender objetivos específicos de cada uma das companhias, sem alterar a posição de controladora do governo. Nesse caso, o aumento de capital social do BNDES garante que o banco mantenha o volume de operações de crédito nos moldes recomendados pelo Banco Central. Questionado, o Tesouro Nacional publicou nota na qual reforça que o decreto assinado ontem ¿trata de mera formalidade de alteração estatutária para refletir aumento de capital realizado, nos termos autorizados pelo Decreto nº 7.162¿. (GC)

IOF rende R$ 2,8 bi O aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) incidente nos investimentos estrangeiros em renda fixa no Brasil ¿ de 2% para 4% e, posteriormente, para 6% ¿ pode não ter cumprido a tarefa de barrar a entrada de dólares no país. Entretanto, tem servido para engordar a quantia que entra nos cofres do país. Somente em outubro, mês em que foram formalizados os aumentos, o recolhimento cresceu 72,80% na comparação com o mesmo mês de 2009 e somou R$ 2,8 bilhões. Entre janeiro e outubro, a coleta da tarifa totalizou R$ 22 bilhões, valor 39,02% superior aos mesmos 10 meses do ano passado.

De acordo com o subsecretário de Tributação e Contencioso, Sandro de Vargas Serpa, além dos aumentos na taxa cobrada dos estrangeiros, o avanço no recolhimento do IOF também se deve ao crescimento de 16,66% no volume de operações de crédito em outubro, ante o mesmo mês de 2009. Se considerarmos apenas as entradas de moedas em contratos de câmbio, a cobrança de IOF foi nove vezes maior do que entre janeiro e outubro do ano passado. Para Felipe Salto, economista da Tendências Consultoria, a tentativa de equilibrar o câmbio represando o fluxo de dólares que entra no país é legítima, mas lembra que o incremento na arrecadação já estava previsto. ¿Mesmo que diga que o imposto tem caráter regulatório, é mais uma boquinha que o governo tem. E ele sabe disso. Já estava nas contas¿, afirmou. (GC)