Título: Proximidade de eleição no STF ameniza Barbosa
Autor: Basile , Juliano
Fonte: Valor Econômico, 08/10/2012, Política, p. A29

O ministro Joaquim Barbosa deve ser eleito presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) na quarta-feira, um dia depois da provável confirmação da condenação do ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu por corrupção ativa no julgamento do mensalão.

Ele assumirá o cargo mais alto do Poder Judiciário em substituição ao ministro Carlos Ayres Britto que se aposenta ao completar 70 anos, em 18 de novembro. Ele será o primeiro negro a presidir um poder da República e terá dois anos de mandato na Corte, além de comandar também o Conselho Nacional de Justiça (CNJ). "Eu não acredito que haja surpresa, pois ele integra o colegiado e a Corte segue uma tradição", afirmou o ministro Marco Aurélio Mello.

O relator do mensalão vai passar por uma eleição em que não há disputa. Não se vota em propostas e tampouco no perfil dos candidatos. O STF segue uma tradição pela qual se torna presidente o ministro há mais tempo na Corte que ainda não exerceu o cargo. Barbosa está no Supremo desde 25 junho de 2003. Ele assumiu junto com Britto e Cezar Peluso, que se aposentou em setembro. Como era o mais novo entre eles, foi o terceiro a tomar posse naquele dia, de modo a permitir que os demais exercessem a presidência da Corte.

Há dez dias, Marco Aurélio manifestou preocupação com a eventual presidência de Barbosa, logo após um debate tenso em que o relator do mensalão fez duas críticas ao revisor, ministro Ricardo Lewandowski. Na ocasião, Marco Aurélio lembrou que a eleição no STF não ocorre por aclamação, que cédulas são distribuídas e advertiu que o presidente deve ser "algodão e não metal entre cristais".

Ao lembrar o episódio ao Valor, Marco Aurélio descartou que seu comentário coloque em jogo a eleição de Barbosa. "Quando eu fiz a crítica, manifestei apenas uma preocupação, mas admiti a presidência dele", explicou o ministro. "Jamais passou pela minha cabeça que ele não seria eleito", enfatizou Marco Aurélio.

Consultado, Lewandowski informou que "apoia Joaquim como sempre apoiou". De fato, com exceção do julgamento do mensalão, Barbosa e Lewandowski sempre foram próximos. Ao lado de Britto, foi Lewandowski quem levou Barbosa para almoçar logo após uma célebre discussão entre este e o ministro Gilmar Mendes, em abril de 2009. O almoço serviu para apaziguar os ânimos e retomar a cordialidade nos debates na Corte. Um ano depois, quando Barbosa desistiu de assumir a presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por causa de dores crônicas nas costas, Lewandowski ocupou o cargo, adotando uma postura compreensiva e colaborativa, sem críticas ao colega que recuou daquela presidência.

Com a proximidade da eleição interna no STF, Barbosa adotou postura mais amena nas sessões do mensalão. Na semana passada, o relator fez apenas um aparte a Lewandowski na quarta-feira e nenhum na quinta, dia em que o revisor absolveu Dirceu em um voto frontalmente contrário ao dele. A maioria dos apartes ao revisor foi feita por Britto, mas sempre num tom ameno e cordial, evitando debates mais acalorados.

Apesar de ter confrontado Barbosa em discussões tensas, em anos anteriores, Gilmar Mendes também não deve se opor à eleição dele, pois entende que não seria adequado romper com a tradição e com os trabalhos da Corte, que funciona num sistema de colaboração.

De fato, no STF outros ministros também compreendem que uma eventual não escolha do "ministro a ser eleito" seria uma exceção que dificultaria o andamento dos processos no tribunal e a realização dos julgamentos. Como o STF é um tribunal conduzido sob a colaboração de onze integrantes, excluir um deles da presidência representaria retirá-lo de um sistema de apoio mútuo pelo qual, apesar de terem votos divergentes, os ministros têm que chegar a um comum acordo a respeito de que devem se reunir para votar determinadas causas. Basta a discordância de um dos onze integrantes, através de um pedido de vistas, por exemplo, para travar a pauta do STF quanto a qualquer julgamento no plenário.

Tudo isso indica que a tradição deve se confirmar e Barbosa deve ser eleito por nove votos a um. Na eleição interna do STF apenas o presidente não vota em si mesmo. Ele escolhe o vice. Pela ordem de antiguidade do STF, o vice será Lewandowski. Com isso, o relator e o revisor do mensalão devem interromper a disputa por um curto instante. Um deve votar no outro. Barbosa deverá votar em Lewandowski para vice e esse último em Barbosa para presidente. Qualquer resultado diferente do placar de nove a um representará um rompimento na tradição da eleição para a presidência do STF.

A votação é secreta. As cédulas são contabilizadas pelo ministro com menos tempo na Corte. Com isso, Rosa Weber, a primeira a votar depois do relator e do revisor do mensalão, será a escrutinadora na eleição.