Título: Europeus devem anunciar reforma 'cosmética' no FMI
Autor: Ribeiro , Alex
Fonte: Valor Econômico, 08/10/2012, Finanças, p. C7

Os europeus devem anunciar uma reforma apenas cosmética nas cadeiras que ocupam no conselho que comanda o Fundo Monetário Internacional (FMI), sem de fato transferir poder para as economias emergentes mais dinâmicas durante reunião anual do organismo que acontece nesta semana em Tóquio.

Um acordo fechado em 2010 havia determinado que a Europa desenvolvida abrisse mão, em favor dos emergentes, de dois dos oito assentos que ocupa de forma permanente no conselho diretor do Fundo, um colegiado com 24 membros que toma as decisões mais importantes no dia-a-dia do organismo.

O espírito da mudança era tirar poder de países com representação desproporcional à sua importância econômica atual, como Bélgica e Suíça, para dar voz a emergentes como Indonésia e África do Sul, que fazem parte do G20 mas não estão diretamente representados no conselho do FMI.

O jeito criativo encontrado pela Europa para reter poder no conselho diretor do FMI foi transferir cadeiras, de forma rotativa, a economias emergentes da própria União Europeia, como Polônia, Hungria e República Tcheca. A única economia genuinamente emergente que deverá ganhar uma cadeira é a Turquia, ainda assim de forma rotativa.

"Essa é uma mudança, em larga medida, cosmética", afirmou Paulo Nogueira Batista Júnior, diretor-executivo para o Brasil e outros oito países da América Latina e Caribe no conselho do FMI, que diz opinar em caráter pessoal.

A entrega das cadeiras no conselho do FMI faz parte de uma série de reformas nos organismos multilaterais para ampliar sua legitimidade, refletindo uma realidade em que as economias emergentes se tornaram motor do crescimento mundial.

A agenda inclui ainda a reforma das quotas do Fundo, transferindo poder de voto de economias desenvolvidas para emergentes. Por um acordo fechado em 2010, nesta reunião em Tóquio economias avançadas sobrerrepresentadas deveriam abrir mão de 6% das quotas em favor de países emergentes. O Brasil seria um dos ganhadores, aumentando seu poder de voto no FMI de 1,78% para 2,31%.

Mas essa parte da redistribuição de poder no FMI seguirá sem ser implementada, pois depende da aprovação pelo Congresso do maior sócio do FMI, os Estados Unidos. O governo americano está comprometido com a reforma, mas não há clima para aprová-la agora por causa da forte divisão política criada pelas eleições no país, em que o presidente Barack Obama disputa um segundo mandato.

O acordo também determina que, até janeiro de 2013, os membros do FMI discutam uma nova fórmula de cálculo das quotas com vistas a uma nova rodada de redistribuição de poder. Mas as negociações entraram num impasse, por isso é pouco provável que haja progressos nesta reunião de Tóquio.

Países emergentes querem que o tamanho da economia seja o principal, senão único, componente da fórmula. As economias da Europa defendem a manutenção na fórmula de critérios que mantém seu poder de voto no FMI, sobretudo o grau de abertura comercial dos membros. "A fraqueza econômica e financeira da área do euro tornou os europeus ainda mais resistentes a abrir espaço no FMI", afirma Nogueira Batista.

Hoje, Portugal, Irlanda e Grécia são os maiores tomadores de empréstimos do FMI, com programas que somam US$ 79 bilhões, pouco mais de metade carteira do organismo. Quando são somados dois países emergentes da Europa do Leste, Hungria e Romênia, a Europa absorve quase 70% do dinheiro do FMI. As cifras podem aumentar ainda mais se a Espanha vier a ser socorrida pelo Fundo.

Hoje, três grandes economias da Europa (Alemanha, França e Reino Unido) comandam sozinhas três assentos do FMI. Essas cadeiras não estão sob questão, assim como a da Itália, que é cabeça de um grupo formado sobretudo por europeus.

Pelo acordo que deve ser confirmado nesta semana, a Bélgica migrará para o grupo da Holanda, abrindo uma cadeira cujo comando será revezado pela Turquia, Hungria e República Tcheca. A Suíça dividirá sua cadeira com a Polônia. A cadeira hoje encabeçada pela Dinamarca vai fazer um revezamento com os países bálticos. Em alguns períodos, os europeus chegam a ocupar nove cadeiras do Fundo, quando a Espanha se torna titular de um assento dividido com México e Venezuela.

Num movimento independente à reforma dos europeus, a Colômbia deverá anunciar a troca da cadeira do Brasil pela do México, conforme antecipado pelo Valor. O Brasil, que já comunicou o ingresso do Timor Leste na sua cadeira, tenta atrair outros países, mas mantém as negociações em sigilo.