Título: Dilma é senhora do tempo e da escolha do ministério
Autor: Dutra, José Eduardo
Fonte: Correio Braziliense, 21/11/2010, Política, p. 4

Entrevista - José Eduardo Dutra

Presidente do PT não poupa críticas à movimentação do PMDB pela Presidência da Câmara Denise Rothenburg Ivan Iunes Tiago Pariz Dedicado à transição de governo, onde considera "Dilma a senhora do tempo e das escolhas", o presidente do PT, José Eduardo Dutra, não poupa críticas ao se referir à formação do bloco PMDB-PTB-PP-PR, uma operação que estremeceu a relação entre peemedebistas e petistas. "Foi um movimento atabalhoado e desnecessário". Quanto à Presidência da Câmara, Dutra é direto ao defender o direito do PT de presidir a Câmara por quatro anos: "Existe uma proposta de rodízio feita pelo presidente Temer, que eu não assinei porque disse que ia conversar com os deputados. Estamos defendendo o princípio que era tradição do Congresso e que era religiosamente cumprido até Aécio Neves, que é quem tem a maior bancada indica o presidente", diz ele. Para 2011, entretanto, a prioridade de Dutra é outra: "A reforma política será o grande projeto do PT, vamos chamar o Lula e pregar que essa seja a reforma das reformas", diz ele. A seguir, os principais trechos da entrevista.

DILMA É SENHORA DO TEMPO E DA ESCOLHA DO MINISTÉRIO

Nessa largada de montagem do governo, o que podemos esperar? A equipe econômica sai logo? O tempo e a definição de ministério dependem única e exclusivamente de uma pessoa, a pessoa que foi mandatada para isso por 57 milhões de brasileiros. Ela vai definir os nomes e divulgá-los na medida em que considerar mais adequado. Poderá ir fazendo aos poucos, como poderá aguardar para anunciar o ministério todo. Não há uma definição ainda.

Mas não existe a intenção de antecipar a equipe econômica para dar uma resposta ao mercado, que está ansioso pelo nome? Sinceramente, eu não vejo essa ansiedade. É lógico que um período como esse, em que há uma transição que está se formando um governo, é natural haver expectativa pelos diversos setores envolvidos. População, imprensa, setores econômicos. Não tem prejuízo para o governo ou o país. Não é tão relevante que um ministro, mesmo da área econômica, seja anunciado hoje, amanhã ou no fim do mês. Esse é um governo de continuidade. A presidente já disse os compromissos dela, e que, portanto, a garantia da condução da política econômica é dela.

Os ministros do PT, no caso, ela vai escolher dentro do partido ou é o partido que vai dizer quem são? Todos os ministros, não só do PT, quem vai escolher é ela. É claro que os diversos partidos têm a tarefa de sugerir nomes. Agora, a competência da escolha é dela. Nenhum partido vai nomear ministro. Pode ter um consenso de que o partido apresente o nome e ela concorde.

E o vice-presidente Michel Temer vai participar dessa composição com ela ou os ministros quem define é a Dilma? Quem indica os ministros é a presidente, mas eu não tenho dúvida que, da mesma forma que o vice-presidente está participando dessa coordenação política, com certeza ela vai ouvir o Michel Temer. Para ela forjar uma ideia, uma definição dos nomes, é claro que ela vai conversar com os partidos, com as pessoas que a cercam, com o vice-presidente. Essas conversas servem para ajudá-la a construir um juízo de valor sobre a pessoa. Mas a partir do momento que ela definir que é fulano de tal, esse fulano vai ser ministro.

O que significa a generosidade que o PT tem que ter no próximo governo? É para acomodar os aliados, abrir espaço? Nesse momento, não existe essa coisa de abrir mão. Não há nenhum partido que seja proprietário de espaço no governo. Não há do que abrir mão. O governo vai ser montado com a participação dos partidos, mas nenhum partido é proprietário dos ministérios que hoje ocupa. Não existe direito adquirido na relação de ministério com partido político.

Nessa semana, o PMDB tentou formar um bloco. Como o senhor vê esse bloco? Foi um movimento atabalhoado e sem necessidade. Do ponto de vista parlamentar, esse bloco não tem nenhum efeito prático. Do ponto de vista do governo, não sei se a intenção foi essa, mas também não tem sentido porque não há nenhuma definição ainda por parte da presidente em relação a espaço no governo. Levei para ela todas as informações coletadas nos partidos e de lá para cá não houve nenhuma definição dela do próximo passo.

Esse bloco enfraqueceu o PMDB na correlação de forças pela Presidência da Câmara? Existe uma proposta de rodízio feita pelo presidente Michel Temer, que eu não assinei porque disse que ia conversar com os deputados. Defendemos o princípio que era tradição do Congresso Nacional e que era religiosamente cumprido até o Aécio Neves. Quem tem a maior bancada indica o presidente. A composição da Mesa da Câmara e do Senado tem que representar o Parlamento, tem que representar a expressão que foi conferida pelo povo na eleição de deputados e senadores. E não pode ser confundida com a relação com o Executivo. Se um governo tem maioria num parlamento, a maioria da Mesa vai ser de partidos da base do governo. Mas isso não pode desconsiderar que os partidos de oposição também são legitimamente parlamentares e devem estar representados na Câmara. Por que não estamos concordando nesse momento em estabelecer uma proposta de revezamento com o PMDB? Se é para discutir revezamento, é para incluir o Senado. E segundo e mais importante, nesse momento não vemos muito sentido em estabelecer um acordo PT-PMDB que exclua os outros partidos da base e da oposição. O que temos reafirmado e o próprio presidente Temer tem dito é que não vai haver disputa entre partidos da base nem no Senado nem na Câmara. A forma como vai afunilar isso, tem tempo para fazer.

Os senadores do PT dizem é que, se há um rodízio numa Casa, há na outra também. Os senadores defendem o princípio da proporcionalidade e da bancada majoritária indicar o presidente. Está se discutindo formação de bloco no Senado, mas com a preocupação de que isso não implique em ter um bloco maior do que o maior partido, liderado pelo PMDB. Para demonstrar que a bancada no Senado quer aplicar a tradição que está insinuado no regimento das duas Casas. Se se discute cenários diferentes na Câmara, o Senado também pode começar a discutir também e se for o caso propor revezamento também.

O senhor não acha que a condição do Temer de vice-presidente eleito, presidente do PMDB e presidente da Câmara confunde um pouco o papel que ele tem? O Michel Temer é um político experiente, sabe perfeitamente distinguir os papéis e os momentos que ele tem que agir como presidente do PMDB e o momento que ele vai ter que agir como vice-presidente da República.

Mas a presidente eleita pediu para ele ter um posicionamento claro e não ser mais um representante partidário. A partir do momento que ele é vice-presidente, ele, naturalmente, vai agir assim. Embora mantenha a posição de presidente do PMDB, na condução que ele tem feito até agora não estou detectando que ele esteja deixando de ter o papel de vice-presidente eleito.

Quando ela se reuniu com os governadores, tratou com eles de ministérios. Um dos critérios para o preenchimento dos ministérios não seria também o estadual? Esse xadrez é um sistema com várias equações e várias variáveis e todas têm de ser consideradas. Você tem a representação política, onde os partidos serão contemplados. Mas claro que você não poderá compor um ministério somente com paulistas ou mineiros. Temos de considerar a distribuição regional e de partidos.

Existirá o princípio de contemplar candidatos derrotados nas eleições com ministérios? Ninguém tem cargo garantido na Esplanada. Temos de levar em consideração que em 2002 a aliança que elegeu Lula era muito menor do que a atual, por isso o PT teve muito mais espaço. Não podemos estabelecer um ministério de derrotados, como se fosse um prêmio de consolação. Isso não pode ser critério, mas também não pode ser veto.

Haverá um Banco Central desenvolvimentista? Banco Central é uma questão à parte, não há especulação de políticos vencedores ou derrotados para ir para o lugar. Não vou fazer especulação sobre perfis sobre possíveis futuros presidentes do BC.

E em relação ao orçamento, Dilma definiu as prioridades para cada pasta? Já existe uma proposta orçamentária do Congresso, que, naturalmente, necessitará de algum ajuste pelo governo eleito. Mas não acho que vá existir grandes alterações. Grande parte do orçamento brasileiro já é engessado.

Como é que se escolhe um ministério? A parte do Palácio, que é mais pessoal, é escolhida primeiro? Este modelo ainda está na cabeça dela, vou ser sincero em dizer que não tenho essa informação, mas também não diria, se tivesse. Ela é senhora do tempo e da definição dos nomes.

O presidente Lula disse querer participar do processo de reforma política. O partido está pronto para dar o apoio necessário? O PT tem de encontrar formas de fazer com que esta questão não seja meramente retórica. Todos dizem que são a favor da reforma política, mas entra ano e sai ano e a reforma não sai, nada muda. Por uma questão simples: a reforma política não é fácil de fazer. Quando você acompanha qualquer discussão no Congresso Nacional, você vê que tem os líderes da bancada e os especialistas da matéria. Só que a reforma política tem 513 especialistas na Câmara e 81 no Senado. E mais, todas as pessoas, quando sentam na cadeira de deputado, têm o seguinte raciocínio: tudo bem que a legislação é ruim, mas com ela eu consegui me eleger. Será que eu conseguiria se a legislação mudasse? Com relação ao Lula, se ele diz que vai se empenhar nisso, temos de soltar foguetes.