Título: Família Sarney é derrotada depois de 40 anos no comando
Autor: Bautzer, Tatiana
Fonte: Valor Econômico, 30/10/2006, Política, p. A13

O ex-prefeito de São Luís, Jackson Lago (PDT), impôs ontem à família Sarney sua primeira derrota em 40 anos no Maranhão. Jackson elegeu-se governador com quase 52% dos votos válidos ante 48% de Roseana Sarney. O barulhento apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva não resultou em transferência de votos para Roseana, como esperava a família Sarney. O presidente elevou o percentual do eleitorado de 75,5% para 84,6% no Estado. Mas o efeito para Roseana foi inverso, com queda no percentual nas últimas pesquisas, que davam empate (50% a 50% pelo Ibope). Para o presidente do PT no Maranhão e deputado federal eleito, Domingos Dutra, "sabemos que o Lula é nosso líder, mas não é dono do eleitor". O presidente do PT acha que o ex-presidente e senador José Sarney (PMDB-AP) volta a Brasília enfraquecido. Lago foi três vezes prefeito de São Luís, eleito pela última vez em 2000. Na primeira entrevista após a apuração dos votos, o governador eleito disse que a queda do grupo Sarney no Maranhão faz parte do mesmo movimento ocorrido na Bahia. "Caíram os dois últimos bastiões do coronelismo no país."

O pedetista disse antes de votar ontem que faria, caso eleito, uma auditoria na dívida do Estado com o governo federal "porque o maranhense merece que se dê transparência aos contratos depois de 40 anos". Lago disse que tentará reduzir um pouco os pagamentos à União, "considerando a grande dívida social no Maranhão". A prioridade de Lago será conseguir recursos federais e convênios que ajudem na recuperação das estradas federais e estaduais.

O apoio do governador José Reinaldo Tavares (PSB) foi decisivo na eleição de Lago. O presidente do PT, Domingos Dutra, diz que "Lago só ganhou essa eleição porque Tavares rompeu com Sarney". O governador pode ser considerado o arquiteto da campanha, porque foi ele que idealizou o "consórcio" de três candidatos contrários a Roseana, especialmente o lançamento de Edson Vidigal (PSB).

Em entrevista ao Valor na véspera da eleição, em sua casa na praia do Calhau, o senador José Sarney creditou a dificuldade da eleição no Maranhão ao uso de "métodos da República velha" do pedetista, que incluíram, segundo o senador, "compra de eleitores, demissões como as de diretoras de escolas em Timon e uso da polícia a favor da política, obras fantasmas e desvio de dinheiro público", referindo-se ao apoio do atual governador ao candidato Jackson Lago.

Tavares, aliado histórico de Sarney no Estado, rompeu com o grupo em 2002. Sarney repetiu contra Tavares e Lago acusações das quais seu grupo foi alvo quando Roseana era governadora, como a concessão de empréstimos com base em antecipação de ICMS em convênios do Estado com prefeituras. Sarney disse que seu grupo "nunca fez isso quando ocupava o governo". Em um editorial publicado na primeira página do jornal da família Sarney ontem, o senador acusa a família de Lago de pertencer ao grupo do coronel Vitorino Freire, derrotado por Sarney nas eleições de 1965. O ex-candidato do PSDB, Aderson Lago, diz que alguns membros da família fizeram parte do grupo na década de 60 por um curto período, mas logo romperam com o vitorinismo.

O senador e Roseana afirmam que "continuarão fazendo parte da base de governo do presidente Lula", à qual já dizem ter pertencido durante o primeiro mandato. Mas os dois preferiram não comentar negociações de Roseana com o PMDB. A candidata foi ameaçada de expulsão pelo PFL desde sua decisão de apoiar Lula no Estado. Pouco antes das 20h de ontem, Roseana admitiu a derrota e desejou boa sorte ao governador eleito. Sobre uma possível saída do PFL, disse apenas que "o partido não esteve comigo nessas eleições".

Os últimos dias de campanha foram de muito nervosismo, com acusações de ambos os lados. Correligionários de Roseana envolveram-se numa discussão acalorada com simpatizantes de Lago dentro do colégio onde a candidata tinha acabado de votar. Algumas iniciativas de Roseana demonstravam a preocupação com um resultado apertado. A candidata participou na sexta-feira à noite de um culto na Igreja Universal do Reino de Deus ao qual compareceu o bispo Marcelo Crivella, eleito senador pelo Rio de Janeiro. Ela e o pai receberam as bênçãos de mais de quatro mil fiéis, sob a orientação de Crivella. José Sarney pediu orações. Roseana disse que queria comparecer a uma igreja evangélica porque apoiadores de Lago estavam distribuindo panfletos com fotos suas junto com o pai de santo Bita do Barão, chamando-a de "macumbeira".