Título: Corte de gastos e aumento de receitas são base do ajuste da Prefeitura de SP
Autor: Lamucci, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 30/10/2006, Brasil, p. A20

Quase dois anos depois do fim da gestão Marta Suplicy (PT), a Prefeitura de São Paulo mostra uma situação fiscal bem diferente. O resultado orçamentário, que ficou no vermelho de 2002 a 2004, mostrou um superávit de R$ 2,509 bilhões entre janeiro e agosto deste ano, após um 2005 também positivo. Corte de despesas, aumento de arrecadação, revisão de contratos, combate à evasão de impostos, programas de parcelamento de tributos atrasados e renegociação de dívidas com fornecedores explicam o desempenho fiscal na gestão José Serra (PSDB)/Gilberto Kassab (PFL), segundo o secretário de Finanças, Mauro Ricardo Costa.

Para 2007, a Secretaria de Finanças estima que a receita total atinja R$ 19,947 bilhões, um salto de 15,7% em relação a 2006 - 10,7% em termos reais. A Prefeitura aposta num forte aumento da arrecadação do Imposto sobre Serviços (ISS), de 27%, e do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), de 10,1%, bem acima da inflação esperada pela Prefeitura, de 4,5%.

A administração Kassab também aposta em outras medidas para elevar as receitas no ano que vem: ele planeja cerca de R$ 300 milhões com a venda de imóveis. Outra iniciativa é a emissão de debêntures pela Companhia São Paulo de Mobilização de Ativos (SPDA), empresa que a Prefeitura quer criar e que terá como lastro impostos atrasados do Programa de Parcelamento Incentivado.

No aumento da receita do ISS para R$ 5,079 bilhões em 2007, tem peso importante o combate à fraude pela qual empresas que prestavam serviços em São Paulo simulavam ter domicílio em outros municípios. Costa diz que a medida deve incorporar R$ 600 milhões à base de arrecadação do tributo. Além disso, a Prefeitura aposta que o "esforço fiscal" deve trazer R$ 700 milhões de ISS para os cofres do município em 2007.

A arrecadação do IPTU, por sua vez, deve atingir R$ 2,925 bilhões. A Prefeitura reformulou a cobrança do imposto, dividindo a cidade em três zonas fiscais. Para quem mora nas regiões mais nobres, o aumento médio será de 5,9% no valor do metro quadrado de construção, de acordo com a secretaria de Finanças. Nas regiões mais pobres, haverá queda média de 7,2%. Costa diz que a medida não deverá aumentar a arrecadação. O objetivo, afirma, é fazer "justiça fiscal".

Para a oposição, não é bem assim. O vereador Paulo Fiorilo (PT) diz que a mudança vai elevar a carga tributária, devido ao aumento para quem mora no chamado "centro expandido". O consultor Amir Khair, ex-secretário na gestão Luiza Erundina, diz que esse tipo de medida costuma implicar em aumento de tributos. Quem mora nas regiões mais nobres deve ter aumento do IPTU de 4% a 6% acima da inflação; para quem vive nas mais pobres, deve ocorrer queda de até 2%.

Fiorilo vê uma "sanha arrecadatória" em ações recentes da Prefeitura, que, para ele, estão vinculadas ao projeto político de Kassab. Ele acredita que, depois da austeridade de 2005 e 2006, haverá aceleração de gastos em 2007 e no começo de 2008, para que o prefeito tenha obras para mostrar se concorrer à reeleição. A Secretaria de Finanças ressalta medidas de redução de impostos, como a extinção da taxa do lixo.

O esforço fiscal adotado na atual gestão combinou medidas de cortes de gastos, como a economia de R$ 456 milhões por ano obtida com a renegociação de contratos, e outras que buscaram aumentar receitas. Uma delas foi a contratação, por licitação, do Itaú e do Bradesco para fazer o pagamento de servidores e fornecedores e movimentar e aplicar o dinheiro da prefeitura. Os bancos pagaram cerca de R$ 530 milhões para ficar com o serviço, iniciativa que Khair considera interessante.

A medida mais polêmica foi a renegociação da dívida de R$ 2,152 bilhões com os fornecedores. A administração pagou em 2005 apenas os débitos inferiores a R$ 100 mil, e parcelou o restante em sete parcelas anuais. Ainda falta R$ 1 bilhão. "Foi um calote, isso sim", diz o vice-presidente de obras públicas do Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon) de São Paulo, Luiz Antônio Messias, reclamando do fato de que a Prefeitura esticou o pagamento para além do fim do atual mandato, o que também é criticado por Khair. "Com isso, você compromete o governo seguinte."

Para Fiorilo, o município deveria aproveitar a boa situação financeira para pagar as dívidas e investir mais. O superávit orçamentário de janeiro a agosto, de R$ 2,509 bilhões, é 111% maior ao obtido em todo 2005. Costa diz que optou pelo parcelamento para não comprometer o orçamento atual e os futuros em relação às despesas essenciais da Prefeitura, inclusive investimentos.

Para os fornecedores que quiserem receber antecipadamente, a Prefeitura pretende realizar leilões de dívida. Quem aceitar conceder os maiores descontos receberá antes. Se a criação da SPDA for aprovada pela Câmara dos Vereadores, os credores terão a opção de serem pagos com as debêntures que serão emitidas.

Além do superávit orçamentário, Costa comemora a redução da relação entre a dívida consolidada e a receita corrente líquida, que caiu de 246% em 2004 para os atuais 195% Mas ele admite ser praticamente impossível atingir em 2016 o limite de 120% previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), devido ao fato de que a dívida está indexada à variação do IGP-DI mais 9%. Khair relativiza a influência da Prefeitura na queda do indicador. Para ele, a relação caiu por causa do aumento de arrecadação, que também ocorreu em outros municípios, e pela alta pequena do IGP-DI de 2005 para cá.

Para Costa, os desafios daqui para frente são manter o equilíbrio fiscal, solucionar a dívida com o Tesouro e com os fornecedores, continuar a reduzir despesas e retomar a capacidade de investimento. Mas essa é uma tarefa que, tudo indica, não será tocada por ele. A partir de 2007, Costa, homem de confiança de Serra, deverá comandar a secretaria da Fazenda do Estado.