Título: TI torna-se ferramenta essencial para o setor de construção civil
Autor: Borges, André
Fonte: Valor Econômico, 30/10/2006, Empresas, p. B3

O engenheiro Mário Rocha Neto passa com agilidade pela lama espalhada no entorno do canteiro de obras, um imenso buraco cercado por pedreiros, material de construção e ferramentas, de onde começa a emergir mais uma torre do luxuoso Villaggio Panamby, condomínio de prédios da Zona Sul de São Paulo. Em lugar dos calhamaços com cópias de plantas, memorandos e dezenas de fichas técnicas, traz consigo um computador de bolso, similar a um celular, e logo sentencia: "Aquela papelada suja de barro acabou".

Diretor de operações da construtora e incorporadora Gafisa, Rocha testa um dos mais novos projetos de tecnologia da informação (TI) da companhia, que decidiu investir em dispositivos móveis para controle de suas construções. Nos cerca de 50 canteiros de obras da empresa, gradativamente engenheiros passam a registrar todas as atividades diárias da construção no equipamento, que transmite os dados em tempo real para o sistema central da empresa. "Colocamos 22 relatórios neste aparelho e, com isso, ganhamos indicadores para qualidade e nível de consumo. Agora é possível tomar medidas preventivas."

A tecnologia que a Gafisa vem testando em seus canteiros de obras é apenas mais uma entre as tantas que estão agitando a indústria de construção civil no país, um setor ainda pouco habituado a novidades de informática, mas que começa a ver na TI um instrumento indispensável para lidar com um novo ritmo de crescimento, neste momento acelerado pela expansão dos financiamentos habitacionais, pela queda nos juros e pela inflação controlada. As estimativas, segundo a consultoria E-Consulting, apontam que, neste ano, o setor movimentará cerca de US$ 600 milhões com TI.

"Quer saber como a tecnologia passou a ser importante na nossa empresa? É só desligar o sistema. Pára tudo, não tem jeito", resume o diretor técnico da Tecnisa, Fabio Villas Bôas.

O papel desempenhado pela tecnologia está refletido nos gastos da Tecnisa com sua área de informática. Em 2003, a empresa gastou US$ 292 mil com o setor. Neste ano o orçamento atingirá pelo menos US$ 640 mil. As projeções seguem o mesmo rumo na Rossi Residencial, onde os gastos com TI crescem a taxas de 30% ao ano, média que deve se manter em 2007, segundo o diretor de engenharia da empresa, Alcides Gonçalves Júnior. "Vamos investir cerca de R$ 1 milhão neste ano", diz.

A lógica por trás destes investimentos é reduzir desperdícios, evitar erros de projeções e ter processos mais transparentes. Para isso, o primeiro passo de boa parte desta indústria tem sido arrumar a casa, com a adoção de sistemas de gestão empresarial, os chamados ERPs (na sigla em inglês). "Decidimos abandonar nosso sistema interno, que era bom, mas ficou muito complexo, e investimos em um produto de mercado", comenta o diretor de TI da construtora mineira ARG, Antônio de Pádua Pereira. A empresa, que vai gastar R$ 1,8 milhão em TI neste ano, acaba de dar início à instalação de módulos do sistema da fabricante de software SAP, projeto que deve ser concluído em março do ano que vem.

O mesmo caminho começou a ser trilhado pela Matec Engenharia, construtora que vai gastar R$ 3 milhões só com seu novo sistema de gestão, o qual será acessado por cerca de cem funcionários da empresa. "Ficou muito difícil gerenciar os negócios sem o domínio da tecnologia", diz Luís Ricardo Velho, gerente de TI da Matec. "Hoje todas as obras estão conectadas à empresa, trocando informações em tempo real."

Mais avançada em sua gestão administrativa, a Camargo Corrêa Construções e Edificações decidiu atualizar a versão de seus sistemas. "Vamos trazer novos recursos e aprimorar os processos", comenta o superintende de TI da companhia, José Navarro.

A migração rumo a sistemas de mercado, porém, não é unanimidade no setor. Para Chede Zayat, diretor de engenharia e suprimentos da Método Engenharia, empresa que gastará R$ 1,5 milhão com TI neste ano, seu sistema caseiro já chegou a um grau de detalhes que, caso a Método optasse por adquirir uma ferramenta de mercado, "teria que desembolsar muito dinheiro".

Por isso, em vez gastar com sistemas de gestão, Zayat optou por renovar o parque da empresa. Neste ano, a Método comprou cerca de 200 computadores novos, e reforçou sua infra-estrutura de servidores. A Tecnisa, que também opera com um sistema próprio de gestão, preferiu comprar 150 computadores neste ano.

Os gastos com TI, porém, estão longe de se limitar ao aprimoramento de processos administrativos ou atualização de hardware. Algumas ferramentas da informática, diz o diretor técnico da Tecnisa, Fabio Villas Bôas, já começam a mudar a forma de se trabalhar nos canteiros de obras. "Em muitos casos não se usa mais o prumo e o esquadro", afirma. "Hoje você mede qualquer parede com extrema precisão, apenas com um aparelhinho de raio laser, destes que custam uns R$ 200 no mercado."

Na Matec, é a videoconferência que tem sido usada regularmente para fazer reuniões entre os diretores da companhia e os engenheiros que ficam nas construções. "Interligamos até 15 obras em tempo real, para discutir operações do dia-a-dia", conta o gerente de TI, Luís Ricardo Velho.

Com a chegada da TI aos canteiros de obras aumenta, a tendência é de que cada obra passe a operar como uma unidade de negócios da construtora, com gestão e processamento locais. "Essa é uma das razões que motivam nosso investimento em mobilidade", justifica Rocha, da Gafisa, que injetará R$ 2 milhões em TI neste ano. A partir dos computadores portáteis, comenta, os engenheiros terão uma visão mais precisa das obras, reduzindo erros e evitando desperdícios.

A expectativa do executivo é que, quando estiver em plena execução, ao longo do ano que vem, seu projeto de mobilidade gere uma economia de aproximadamente 2% nos gastos de cada obra. "Hoje é muito comum você ter perdas na área cerâmica, por exemplo. Com o mapeamento das operações, teremos como criar um plano de ação com medidas corretivas."

A Tecnisa, que a partir de janeiro do ano que vem também começará a testar computadores de bolso em quatro canteiros de obras, já usa a internet para permitir que projetistas e engenheiros conversem entre si, acompanhando cada etapa das construções. "Antes você só ia descobrir um erro quando já havia cinco andares em cima dele", diz o diretor técnico Fabio Villas Bôas. "Hoje nada mais sai do prumo."