Título: Moeda mexicana atrai mais do que o real
Autor: Rodrigues , Vivianne
Fonte: Valor Econômico, 16/10/2012, Finanaças, p. C2

Após um período de amplas valorizações da maioria das moedas latino-americanas devido ao notável crescimento econômico e à disciplina fiscal nos últimos dois anos, o mercado cambial na região agora passa a mostrar sinais divergentes.

Enquanto o peso mexicano valorizou-se, no ano passado, o real e o peso argentino permaneceram desvalorizados. No Chile, onde a moeda se valorizou 12% desde janeiro, os investidores estão cada vez mais preocupados com uma possível intervenção do banco central.

A divergência é mais visível segundo analistas e investidores nas duas das moedas mais negociadas na região, o peso mexicano e o real. Dado o empenho dos investidores estrangeiros em buscar ativos de maior rendimento em todo o mundo, as apostas no mercado local de dívida mexicana cresceram, enquanto o ritmo de compras de ativos brasileiros diminuiu.

A mudança na preferência dos investidores também está sendo intensificada em razão das expectativas de que o crescimento econômico mexicano ultrapassará o brasileiro em 2013. Além disso, o banco central do México tem tradicionalmente evitado interferência nos mercados cambiais, ao contrário do banco central brasileiro.

"Parece que todo mundo adora gostar do México nestes dias, ao passo que o Brasil perdeu um pouco de seu status de "queridinho" dos investidores estrangeiros", diz Marjorie Hernandez, estrategista de câmbio do HSBC.

"Mas focando os fundamentos, o que temos no Brasil, hoje, é um caso de crescimento mais lento, rendimentos menores, impostos mais altos e um banco central muito ativo. Enquanto isso, a situação econômica é mais vigorosa no México e o banco central está sendo mais amistoso para com os mercados."

Essa combinação, bem como os laços do México com a economia americana - que evidenciou um desempenho relativamente melhor em 2012 do que outros países desenvolvidos -, tem contribuído para um crescimento do investimento estrangeiro em títulos mexicanos.

Segundo dados do Banxico, o banco central do país, compilados pelo HSBC, desde o início de 2010 os detentores estrangeiros de títulos domésticos mexicanos quase triplicaram, atingindo a marca de US$ 65 bilhões em agosto deste ano.

Parte da demanda, explica o HSBC, foi resultado de o México ter sido incluído no índice World Government Bond em 2010, o que chamou a atenção de um número maior de investidores para a dinâmica positiva do país.

Mas Hernández alerta que a maior parte da migração para o peso mexicano em comparação com a adesão ao real já pode estar terminada e, nessa fase, uma reta estratégia baseada puramente em "vender Brasil e comprar México" proporcionaria retornos limitados. "Pode ser um pouco tarde para os investidores tentarem pegar essa onda, pois a maior parte dela praticamente já passou", diz ela.

De fato, o peso mexicano teve valorização de quase 9% neste ano. Em contraste, o real brasileiro caiu mais de 20% desde que atingiu uma alta cíclica no fim de julho de 2011, em parte como resultado de uma série de cortes na Selic visando estimular o crescimento da economia.

Além dos cortes, o governo brasileiro ampliou a taxação sobre transações financeiras internacionais nos últimos anos, buscando diminuir a entrada de capitais especulativos e atenuar lucros cambiais rápidos. As medidas incluem uma tarifa sobre derivativos de câmbio para desencorajar apostas na valorização da moeda brasileira.

Um grupo que foi impactado pelas medidas mais rígidas de controle de capitais foram os investidores japoneses, que tradicionalmente fortaleciam o real por meio dos chamados fundos Toshin. Em consequência disso, investimentos relacionados com o Brasil agora correspondem a 60% dos ativos em mercados emergentes em poder de japoneses, abaixo dos 68% no fim de 2009, mostram dados do banco americano J.P. Morgan.

Outra dificuldade para o real são os vínculos mais fortes do país com a China. Embora o voraz apetite chinês por commodities e outros produtos na década passada tenha ajudado a alimentar um boom econômico no Brasil, agora que a segunda maior economia mundial cresce a um ritmo mais lento, a pressão sobre o real também cresce.

O peso chileno também defronta-se com uma ameaça semelhante, uma vez que quase um terço de suas exportações totais destinam-se ao país asiático, em comparação com 22% no caso do Brasil. Além disso, as duas moedas exibem uma alta correlação com os preços do cobre, um dos indicadores mais utilizados para identificar as perspectivas econômicas futuras da China, o que torna as moedas vulneráveis às flutuações do preço do metal.

"O Brasil está mais ligado ao desempenho da China", diz Jose Wynne, chefe de estratégia cambial para a América do Norte no Barclays. "Quando examinamos o desempenho dos mercados de ações brasileiro e mexicano expresso em dólares, percebemos que a correlação entre as altas e baixas no Brasil e em mercados como Xangai e Taiwan são mais fortes", completa.

Wynne diz que os investidores não devem ignorar completamente o real, pois os fundamentos econômicos do país permanecem sólidos e os laços do México com os EUA também tornam o país vulneráveis a possíveis ventos contrários na maior economia do mundo. A iminência do chamado "abismo fiscal", quando cortes de gastos e elevações tributárias no valor de US$ 600 bilhões passaram a valer nos EUA, no início de 2013, por exemplo, poderá prejudicar a economia americana e pesar sobre a evolução do peso mexicano.

"Não há dúvida de que o Brasil está passando por uma fase de desaquecimento e está crescendo abaixo de seu potencial", diz ele. "Mas, embora estejamos um pouco mais otimistas em que o peso mexicano irá se valorizar no curto prazo, não é uma hipótese totalmente isenta de risco."

"Todo mundo no mercado adora gostar do México, ao passo que o Brasil perdeu um pouco de seu status de queridinho dos mercados."