Título: Lula descarta terceiro mandato
Autor: Costa, Raymundo
Fonte: Valor Econômico, 02/03/2007, Especial, p. A14

O presidente Lula considera "brincar com a democracia" a intenção atribuída a ele de disputar um terceiro mandato. "Eu acho improvável, inexeqüível", disse Lula. Advertido que improvável não é impossível, emendou: "Eu acho impossível. É certo que nada é impossível no mundo, mas não tem hipótese. É brincar com a democracia".

O que Lula quer é terminar o "segundo mandato muito melhor do que eu terminei o primeiro", em condições de influir na escolha de seu sucessor. "Nada é pior para um político do que ele terminar um mandato com o seu candidato não querendo que ele suba no palanque". Diante dos risos dos jornalistas, que viram na afirmação uma referência ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (que não subiu nos palanques de José Serra, em 2002, e de Geraldo Alckmin, em 2006), Lula reagiu sério: "Não falei o nome de ninguém", apressou-se a dizer.

O que o presidente quer é terminar o mandato em condições de recusar convites para subir em palanque. "O meu sonho é esse. Concretizar as bases para o meu país crescer".

Lula disse que cumpriu a legislação vigente: "Fui eleito e fui reeleito". Agora, só pensa em fazer um segundo mandato. Contou que sempre se preocupou com o segundo mandato por considerar a reeleição um desgaste "porque você já fez tudo" - vai conversar com um ministro e percebe que já conversou no ano ano passado. Em resumo, temia a mesmice.

O antídoto, segundo o próprio presidente, é o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Lula pretendia lançar o programa em dezembro do ano passado, mas acha que foi importante ter feito em janeiro (no dia 22). "Se a gente fizesse em dezembro já era uma coisa do passado". Agora, não. Como o PAC é uma "coisa nova", vai " exigir um compromisso de todo o governo, da sociedade e dos empresários, você precisa cuidar da tua motivação 24 horas por dia".

O presidente também descartou projetos em curso no PT, como a possibilidade de o presidente convocar plebiscitos e a adoção do sistema parlamentar de governo, hipóteses, aliás, que lhe permitiriam reivindicar um novo mandato. Segundo Lula, esses são assuntos que devem ser tratados na reforma política, que, em sua opinião, "é um assunto do Congresso Nacional".

"O presidente da República não vai se meter na reforma política", disse Lula, esquecendo-se de que esse era um dos itens prioritários de seu programa de governo, na campanha eleitoral. Lula inclusive orientou o ministro Tarso Genro (Relações Institucionais) a não encaminhar oficialmente ao Congresso, por meio dos presidentes do Senado, Renan Calheiros, e da Câmara, Arlindo Chinaglia, uma compilação de todos os documentos existentes sobre a reforma política, discutidos com a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Pediu que os documentos fossem encaminhados para os presidentes e líderes dos partidos. "São eles que vão fazer a reforma e não o presidente da República", afirmou Lula.

Lula não demonstra pressa em fazer a reforma ministerial. Não vê paralisia no governo e estranha as notícias de que alguns ministérios não estariam funcionando porque o ministro não sabe se vai ficar. "Ora, o momento em que eu não sabia se eu ia ficar foi aquele em que eu mais trabalhei na campanha. Nenhum ministro pode falar eu vou parar porque eu não sei se eu vou ficar. Aliás, tem que trabalhar mais", disse.

Lula considera diferentes a situação de um presidente eleito da de um reeleito. O primeiro tem que apresentar o novo ministério na posse. O segundo, seu caso, "não vai começar um novo governo, fazer tudo diferente. Vai aprimorar o que você vinha fazendo. Quem tem a obrigação de montar ministério é quem ganhou pela primeira vez. Tem que dar posse ao ministério. Quem toma posse é o presidente da República, e o vice. Ministério não toma posse", justificou.

O presidente repetiu o argumento de que é preciso esperar pela reacomodação das forças no Congresso. Diz que esse é um processo recorrente na política brasileira, entre a eleição, em outubro, e o mês de março. "Um processo de acomodamento, que aí tem influência do governador do Estado que se elegeu, essas coisas... e aí a gente não pode se meter nisso, tem que ficar esperando, né"?

Lula nega que esteja estimulando o troca-troca partidário. "O que vai mudar isso não é o tempo que eu vou tocar o ministério. É a reforma política. O que não pode é o seguinte: você faz um acordo com um partido, o partido A, o partido B. E aí o partido A tem um tamanho Y, e aí depois que você faz um acordo, ele vai ficar Y menos..." O presidente vai receber nos próximos dias o PT e o PV para discutir a reforma. (RC)