Título: "Equipe econômica está blindada pelo sucesso"
Autor: Costa, Raymundo
Fonte: Valor Econômico, 02/03/2007, Especial, p. A14

Em café da manhã ontem com jornalistas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva confirmou a manutenção da atual equipe econômica no segundo mandato. "A área econômica, verdade, está blindada pelo sucesso dela", disse Lula ao ser questionado sobre a reforma ministerial. O presidente ainda não definiu os demais cargos. Espera, argumentou, a acomodação das forças políticas no Congresso, um processo que ocorre entre a eleição e o mês de março.

No dia em que foi anunciado o afastamento do diretor de política monetária do BC, Afonso Beviláqua (ver reportagem à página C3), o presidente assegurou que a política econômica não reserva surpresas. "Tenho dito todo dia: não me peçam mágica na economia". De acordo com Lula, "como nós fomos, durante décadas, irresponsáveis na área econômica, não custa nada a gente ter uma década responsável". Por que? O próprio presidente respondeu: "Porque na hora em que você consolidar o Brasil enquanto um país que cumpre aquilo que fala e que faz as coisas transparentes, nós vamos dar à sociedade brasileira e ao mundo a certeza de que o país entrou finalmente no caminho das economias estáveis, sérias e sem invenções".

Lula conversou durante cerca de 1h30 com repórteres de jornais e de televisão, um encontro que ele havia prometido depois do almoço no Itamaraty com o presidente da Bolívia, Evo Morales. Bem humorado, referindo-se aos repórteres como "meninos" e "meninas", entre uma brincadeira e outra o presidente não se esquivou de nenhum assunto - foi apenas vago em relação à reforma ministerial. Anunciou que hoje recebe as propostas do ministro Fernando Haddad para a Educação, em cuja discussão pretende envolver cerca de 100 educadores, inclusive ex-ministros como o tucano Paulo Renato, o senador Cristovam Buarque, que foi demitido de seu governo, e Murilo Hingel, ministro no governo Itamar.

O presidente lembrou de uma viagem que fez à Índia. Quando chegou, aquele país estava completando reservas de US$ 100 bilhões e ele ficou pensando sobre o dia em que o Brasil teria esse montante de reservas (ontem, elas atingiram US$ 101 bilhões): "Isso é muito importante, dá uma garantia excepcional, dá estabilidade".

Questionado se também não sonhava com o crescimento de 9%, respondeu: "Em 1973 nós crescemos 14%. No milagre brasileiro, média 10%, no governo JK, média 7%, e o que aconteceu? Não houve distribuição de renda nesse país. O resultado é que depois desse crescimento o povo ficou mais pobre". Mas hoje, argumentou, "mesmo não crescendo aquilo que eu gostaria, tem concomitantemente uma política social que está permitindo às pessoas ter um aumento de renda. É muito menos do que eu gostaria que tivessem. Mas o importante é que as bases para que a gente dê o passo seguinte estão colocadas, sem nenhuma loucura". Lula afirmou ter a consciência de que se trabalhar "reagindo apenas às emoções momentâneas, a gente pode pensar que está dando um salto e estar caindo num buraco". "O Brasil está a um fio de chegar lá", disse o presidente.

Lula disse que os projetos pilotos de investimento, cuja despesa não é contabilizada como tal na apuração do superávit primário, não significa que o governo vá gastar mais. "Eu vou é investir mais. A diferença entre gastar e investir é que quando você gasta não tem retorno. É como pagar aluguel". Para o presidente, no Brasil às vezes as pessoas não querem ver a totalidade das coisas. "Primeiro o presidente tomou uma decisão de elevar o superávit para 4,25%, porque não pode dizer que vai ser 4%? Por que eu só posso dizer que vai ser mais e não ser menos? O PPI vai ser o equivalente a 0,5 do superávit. Nós queremos construir o superávit com 4,25%, mas isso já não é obsessão de fazer. Porque nós estamos fazendo um investimento que vai garantir que a economia cresça e que a gente possa pagar até mais, porque o pagar mais significa que a gente vai diminuir a dívida pública do Brasil".

Lula disse que não faz favor a ninguém em pagar a dívida pública. "Eu estou apenas pagando dívidas que foram contraídas nesse país. Ah, se fosse possível que cada governante que entrasse pegasse tudo o que o outro deixou e jogasse para debaixo do tapete, seria maravilhoso. Mas nós herdamos a viúva com os filhos e todos os problemas".

O presidente disse que está muito satisfeito com a economia. "Eu não conheço momento na história do Brasil, desde a proclamação da República, em que a gente tenha todos os fundamentos com a solidez que nós temos hoje". Mérito, segundo afirmou, de todos: da sociedade brasileira, dos empresários, do governo, mérito da solidez da economia internacional. "Eu acho que há mérito de todo mundo. Mas o dado concreto é que o Brasil chegou".

Questionado, Lula negou que os impostos estejam altos. "A arrecadação é que está alta. Nós não aumentamos os impostos, todos os dias nós estamos desonerando. Com as últimas desonerações que fizemos para o PAC, nós já estamos chegando a US$ 26 bilhões de desoneração. Você vai tendo as condições para reduzir impostos na medida em que a base dos contribuintes vai aumentando". Por essa razão Lula diz que a reforma tributária é uma necessidade, mas o presidente acha que, no momento, ela "é uma peça de discurso como a fome, como a violência, todo mundo fala, mas na hora de fazer, ninguém quer". E ninguém quer porque cada um tem a própria reforma tributária. "É como no futebol. Todo mundo acha que é técnico".

O presidente anunciou que o governo vai apresentar outra proposta de reforma tributária. "Já fizemos a primeira parte", disse, numa referência ao texto aprovado no Congresso, na qual a parte relacionada ao governo federal foi votada, faltando a parte relativa aos Estados, que não se entenderam sobre o assunto. "Um Estado vai perder uma coisa, outro vai ganhar outra coisa, mas se o Brasil ganhar, todos sairão ganhando". O presidente pretende discutir a proposta na reunião com os governadores marcada para 6 de março. "Estou lembrando todo dia", disse, referindo-se à agenda de 14 pontos com as reivindicações dos Estada há cerca de um mês.