Título: EUA melhoraram sob Obama? A resposta decidirá a eleição
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Fonte: Valor Econômico, 23/10/2012, Especial, p. A20
Momentos antes de entrar em cena para seu único debate com Ronald Reagan, o então presidente dos Estados Unidos, Jimmy Carter, cometeu um erro de cálculo que pode ter lhe custado a reeleição.
Nos bastidores, Carter venceu um cara ou coroa que determinaria quem responderia a primeira questão da noite. Ele cedeu a oportunidade a Reagan, o que significava, também, que Reagan ficaria com a última palavra.
Era o dia 28 de outubro de 1980, uma semana antes do dia da votação e, apesar de uma economia anêmica e da crise no Oriente Médio, Carter gozava de uma ligeira vantagem nas pesquisas de intenção de voto. Nos primeiros 87 minutos do debate, Reagan driblou os ataques de Carter. Em seguida, às 23 horas, ele olhou para a câmera para suas considerações finais e abordou as frustrações dos eleitores por meio de algumas palavras que se tornaram épicas:
"Pergunte a você mesmo: você vive melhor do que quatro anos atrás? Ficou mais fácil para você comprar coisas nas lojas do que era quatro anos atrás? O desemprego do país está maior ou menor do que era quatro anos atrás? Os Estados Unidos são tão respeitados mundialmente quanto eram? Você sente que nossa segurança mantém o mesmo nível, que estamos tão fortes quanto estávamos quatro anos atrás?"
Mais de três décadas depois, o mundo se mostra muito mais complicado. Mitt Romney tentou defender a tese da "melhora de vida" contra Barack Obama com resultados nem sempre bons, em parte porque os eleitores reconhecem que Obama não criou todos os problemas que coube ao seu governo tentar resolver.
Para parafrasear outro presidente, a possibilidade de nossa vida estar melhor agora do que há quatro anos depende do significado de "nós", para não falar no significado de "melhor", e até mesmo no significado de "quatro anos atrás". Comecemos com "nós". A vida do estrato superior dos americanos, se considerado o aumento da renda e do patrimônio, melhorou inquestionavelmente. A da classe média e da classe pobre, não tanto. A renda mediana das famílias, corrigida pela inflação, caiu. É interessante, em vista disso, que o apoio ao presidente Obama seja mais fraco no topo da pirâmide de renda e mais forte na base.
Quanto a "melhor" - em relação a qual critério? O aquecimento global manteve seu rápido avanço durante o mandato de Obama, portanto, por esse importante parâmetro, todos pioramos de vida. Não houve progressos na correção da iminente crise dos direitos fundamentais. A qualidade das escolas americanas está caindo, e sua infraestrutura física, se esfacelando. Por outro lado, soldados americanos ainda morrem no Afeganistão, embora em número bem menor. A galeria de horrores é extensa.
Do lado positivo, os EUA estão menos dependentes de energia estrangeira do que esteve em vários anos. As famílias americanas, de modo geral, repararam seus orçamentos. As empresas lançaram novos produtos e serviços, e não devemos esquecer a genuína melhoria da qualidade de vida, a partir de smartphones mais inteligentes, novos paliativos para o Mal de Alzheimer etc.
Se considerarmos "quatro anos atrás" literalmente, essa referência nos lança diretamente na pior crise financeira desde a década de 30. Empresas colossais caíam todo fim de semana. Atualmente estamos saturados, talvez cansados, mas não mais de olhos arregalados de medo. Em vista disso, nossa vida melhorou. Mas não inteiramente por obra de Obama. O presidente George W. Bush merece pelo menos parte do mérito pela estabilização do sistema financeiro, apesar de terem sido as suas políticas os fatores que o desequilibraram.
Se "quatro anos atrás" significar quando Obama tomou posse, em 20 de janeiro de 2009, o cálculo muda. O pior da crise tinha passado nessa data, portanto o parâmetro correto é o desempenho da economia desde então. Esse continua bastante tenebroso. É verdade que, em setembro deste ano a taxa de desemprego finalmente voltou a cair para 7,8%, o nível ostentado no dia da posse. Mas um dos motivos para a taxa estar tão baixa assim é que muitas pessoas perderam a esperança de encontrar emprego e se retiraram da população ativa. A parcela da população não institucional (que exclui soldados e presidiários) empregada ainda é inferior a 59%, contra os mais de 63% vigentes antes da recessão. O desaquecimento e a fragilidade da recuperação deixaram a produção total do país quase US$ 3 trilhões menor do que o patamar em que estaria se tivesse continuado a crescer ao ritmo médio de 1947-2007, segundo cálculo da "Bloomberg Businessweek". Obama não conseguirá sair totalmente desse buraco se conquistar um segundo mandato.
A economia sobe e desce como a maré, mas não com o mesmo grau de previsibilidade. No longo prazo, o que importa é sua sustentabilidade. A prosperidade superficial de 2007 estava longe de ser sustentável, embora a maioria de nós não tenha percebido na época. O Índice Bloomberg de Grau de Conforto do Consumidor, semanal, revelou a existência, na época, de uma opinião pública jubilosamente inconsciente de que rumava para uma economia inóspita. O estado de ânimo durante a crise foi, pelo contrário, sombrio demais. O capitalismo, na verdade, não estava entrando em colapso. Os investidores que ignoraram os sinais da tempestade e compraram na baixa mais do que duplicaram seu dinheiro. Mas não faltam lembranças dolorosas: o Índice Bloomberg de Grau de Conforto do Consumidor quase não saiu de sua baixa recorde, e os pequenos investidores ariscos que ficaram à margem perderam a oportunidade de recuperar seus prejuízos.
James Paulsen, estrategista-chefe de investimentos da Wells Capital Management, prevê que os próximos quatros anos serão melhores do que os últimos quatro simplesmente porque a economia continuará sua recuperação longa e gradual de volta à normalidade. Os Estados Unidos ficaram mais competitivos em termos de custos. A inflação não representa ameaça. Os custos do serviço da dívida transitaram dos recordes de alta históricos para os recordes de baixa históricos. Os americanos, segundo pondera Paulsen, serão agradavelmente surpreendidos pela recuperação que os aguarda. "Nossos pais passaram a vida espantados com o que aconteceu com eles em parte porque tinham expectativas muito baixas", diz ele. "Nós voltamos a esse patamar, em alguma medida." Com justiça ou não, quem ocupar o Salão Oval pelos próximos quatro anos levará os méritos pela melhoria.