Título: Como serão as águas de março
Autor: Fariello, Danilo
Fonte: Valor Econômico, 01/03/2007, EU & Investimentos, p. D1

Fevereiro terminou com um banho de água fria nos investidores brasileiros, cada vez mais acostumados às aplicações de risco e, até então, aos seus retornos polpudos. Na terça-feira, uma reviravolta dos mercados internacionais pegou cotistas e gestores de fundos desprevenidos, derrubando principalmente o rendimento de fundos de ações e multimercados agressivos. Exatamente essas foram as duas categorias de fundos que mais receberam aportes neste ano, somando mais de R$ 10 bilhões em captação até o dia 15, segundo dados do site Fortuna. Com a reversão dos mercados no fim do mês, porém, o Índice Bovespa (Ibovespa) fechou fevereiro com queda de 1,68%, que levou a variação do ano a cair 1,31%.

No caso dos multimercados, foram percebidas na terça perdas de até 4% por parte de alguns fundos mais agressivos. No entanto, esse mesmo fundo apresentava, até então, rentabilidade de 6% no mês. Outros multimercados com renda variável também perderam, mas, em geral, o prejuízo com o rebuliço originado na China ficou em torno de 1%. Hoje, com a divulgação do valor das cotas de terça-feira, será possível ter a medida exata dessas perdas.

A amarga experiência desta semana serviu para mostrar aos investidores mais agressivos, principalmente aos iniciantes, que a volatilidade do mercado pode doer no bolso. O especulador de curto prazo pode ter percebido que esses investimentos têm seu risco, mas o investidor de longo prazo não tem do que reclamar, observa Leopoldo Barreto Júnior, consultor da Arsenal Investimentos. "Quem carrega ações há três ou quatro anos pode ter uma rentabilidade de cerca de 200%, dependendo do papel em que investe." O mesmo ocorre com alguns multimercados: apesar das quedas desta semana, muitos ainda apresentam rentabilidade positiva no acumulado do ano.

"Se o investidor das carteiras agressivas tem visão de longo prazo, nada tem de ser feito até que o cenário seja mais claro", diz Barreto. Além disso, o aplicador que deixar um investimento de risco agora poderá assumir a perda sem ter a chance de recuperá-la depois da tempestade.

A expectativa, por enquanto, ainda é otimista quanto ao futuro do mercado neste ano, diz Marcelo Assalin, diretor de Investimentos da SulAmérica. "Continuamos a indicar, quando há interesse, aplicações mais agressivas, embora esperemos mais volatilidade daqui para frente." Para o executivo, esses repiques do mercado poderão ficar mais freqüentes, mas, antes de significar nova tendência, poderão indicar boas oportunidades de aplicação.

A grande questão do mercado hoje é a dúvida se a turbulência dos últimos dias foi pontual ou estrutural, diz Júlio Martins, diretor da Prosper Gestão. "O aplicador tem de aguardar um pouco mais para definir sua posição." Ele destaca que essa avaliação ainda é imprecisa, como pôde ser percebido diante dos diferentes desempenhos das bolsas pelo mundo ontem depois da avalanche de quedas na terça. "Mas é certo que o maior nível de volatilidade do mercado deverá permanecer nas próximas semanas, independentemente do rumo de longo prazo", avalia Martins.

O consenso entre os especialistas do mercado é de que o rumo da bolsa brasileira continuará a ser ditado pelo apetite dos investidores estrangeiros. Com a euforia dos fundos hedge internacionais nos últimos meses - que colaboraram com a alta de 32,93% do Ibovespa no ano passado -, eles ganharam mais força do que o investidor local, diz Assalin. "Exceto se novos eventos abalarem os fundamentos macroeconômicos brasileiros, os estrangeiros ditarão o mercado."

Em análise sobre o mercado de ações latino-americano divulgada ontem, a corretora dos EUA Merrill Lynch mantém a indicação de compra de papéis da região, destacando que os fundamentos econômicos dos países continuam robustos. O estudo ressalta, porém, que é incerto o limite da correção nos mercados.

Além dos fundos de ações e multimercados, apresentaram perdas em fevereiro também as aplicações atreladas ao dólar comercial. Mesmo com o soluço de alta na terça-feira, no mês a moeda fechou cotada a R$ 2,12, com queda de 0,14%. No ano, a perda acumulada é de 0,75%. "Os fundamentos da economia brasileira ainda continuam indicando uma maior apreciação do real", diz Assalin, da SulAmérica. Diferentemente do dólar, o euro subiu 1,40% no mês passado.

Entre as aplicações mais rentáveis de fevereiro, a liderança ficou com o fundo da Vale do Rio Doce. Mesmo com a queda de 8,29% do papel ON no dia 27 - pelo temor de redução na demanda de aço com um eventual crescimento chinês menor -, a ação fechou o mês com alta de 1,98% e o ano com 13,83%, ganho que deverá ser transmitido quase integralmente aos fundos. Na outra mão, os fundos da Petrobras amargaram novo mês de recuo. As ações da estatal que recheiam os fundos caíram 7,98% em fevereiro, levando a perda acumulada no ano a 11,46%. Ainda entre os mais rentáveis, o ouro subiu 1,34% em fevereiro, com turbulências entre Irã e EUA.