Título: Campanha mais incisiva manteve liderança
Autor: Di Cunto, Raphael
Fonte: Valor Econômico, 26/10/2012, Política, p. A7

Depois de três meses de campanha tendo que responder diariamente porquê continuava em terceiro nas pesquisas e perdia eleitores para Celso Russomanno (PRB) até às vésperas do primeiro turno, o candidato do PT à Prefeitura de São Paulo, Fernando Haddad, pôde, enfim, comemorar: saiu de 3% de intenção de voto em janeiro para 29% nas urnas.

"O primeiro Datafolha a gente nunca esquece" virou piada frequente do petista no segundo turno, quando a campanha de Haddad foi impulsionada pela reprovação ao prefeito Gilberto Kassab (PSD) e a alta rejeição do adversário José Serra (PSDB), que chegou a 52% segundo o mesmo instituto de pesquisa cujos resultados preocupavam o ex-ministro da Educação.

Entretanto, vacinado contra os males que derrubaram a candidatura de Russomanno às vésperas da votação - em especial, a demora para reagir às críticas à propostas mal explicadas, como a cobrança proporcional nos ônibus, que o PT explorou como uma política que prejudicaria os moradores da periferia-, Haddad não ficou na defensiva. Muito pelo contrário.

No debate do SBT, anteontem, Haddad foi até mais incisivo que Serra. Primeiro, questionou a "responsabilidade" do tucano, ex-prefeito e ex-governador, pela escalada de violência na cidade. Depois, procurou reforçar a imagem de que o adversário não se importa com os pobres, ao dizer que ele "não liga para a questão social".

Quando o tucano tentou entrar no debate ético, ao citar o mensalão, o petista subiu o tom de voz e respondeu com certa agressividade. "Teu desrespeito chega às raias da insanidade. Trazer mensalão para cá? Do que você está falando? Você me conhece o suficiente para saber que tenho 12 anos de vida pública, 30 anos de vida acadêmica, com uma reputação ilibada", rebateu. A cena foi reproduzida na propaganda eleitoral ontem.

Para petistas, o tom mais incisivo teve o resultado pretendido - Serra, ao replicar, disse que Haddad pode até não estar envolvido no escândalo, mas o PT, seu partido, está. "Foi a admissão de que ele não tem nada com o mensalão", diz o vereador José Américo.

Essa parte, porém, ficou de fora do horário eleitoral. Haddad recusou-se, durante toda a campanha, a comentar o que achava da condenação de líderes importantes do partido pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O julgamento foi fartamente usado por Serra, que diz que, para o homem público, "importam os valores e princípios".

Mais preocupante para os petistas foi a ofensiva ao discurso do PT contra as organizações sociais (OS) que administram unidades do sistema público de saúde. Esse tipo de parceria foi sempre criticado pela sigla, que já fiz abaixo-assinado e entrou com ação de inconstitucionalidade para barrar a lei.

O próprio Haddad já deu declarações a favor da estatização das unidades de saúde. Quando o tema passou a ser explorado pelo tucano na TV, o petista, porém, adotou a ambiguidade. Disse que nunca defendeu o fim das parcerias com as OSs e que o discurso pela estatização vale apenas para os três hospitais que quer construir, mas que manterá os atuais contratos.

A explicação, levada à propaganda na TV, virou uma constante no segundo turno para frear a estratégia tucana de tentar desacreditar o PT com a população da periferia, tradicional reduto do partido e onde os tucanos, com a imagem atrelada aos mais ricos, tem pouca penetração. "Hospitais gerenciados por instituições como o Albert Einstein e o Sírio-Libanês. É proposta para rico ou para pobre?", questinou Serra no debate.

Também dirigida ao público de baixa renda, a proposta feita por Serra de aumentar o tempo de integração do bilhete único, atrelada a críticas à promessa do petista, de dar um desconto para quem adquirir um pacote mensal, levou à nova reação de Haddad. "É uma cópia mal feita, típica de quem não planejou. É uma remendo da minha proposta."

No segundo turno, o ex-ministro buscou apoio dos candidatos derrotados. Russomanno preferiu ficar neutro, mas Gabriel Chalita (PMDB), que tinha a simpatia do eleitorado conservador, virou estrela dos comerciais na TV. Haddad também recebeu apoio de dirigentes dos três maiores clubes de futebol do Estado, Palmeiras, Corinthians e São Paulo.

Por outro lado, adotou prática que criticou nos adversários, ao procurar o apoio de evangélicos para atuar contra a investida do pastor Silas Malafaia, da Assembleia de Deus, que gravou vídeos com ataques ao material anti-homofobia feito pelo Ministério da Educação na gestão Haddad. O tema consumiu a segunda semana da curta campanha, até que descobriu-se que Serra, crítico do kit, produziu material idêntico quando governador.

À frente nas pesquisas, o petista ainda teve de administrar no fim o clima de "já ganhou" e a disputa por cargos. Ontem, pediu "pé no chão" e reiterou que só discutirá isso a partir de domingo. "Seria deselegante da minha parte antecipar isso. Estou em campanha."