Título: Sucessão de cartadas marca estratégia de Serra no 2º turno
Autor: Lima, Vandson
Fonte: Valor Econômico, 26/10/2012, Política, p. A7

Uma campanha que testou estratégias ao sabor das circunstâncias. Em que pese ter mantido a espinha dorsal da experiência e capacidade de governar, a tática adotada pelo candidato do PSDB à Prefeitura de São Paulo, José Serra, nesse segundo turno da disputa foi mediada sempre pelo acolhimento ou repulsa da opinião pública a ações pontuais.

Teve mensalão, que foi e voltou; crítica ao kit anti-homofobia feito pelo governo federal quando o adversário Fernando Haddad (PT) foi ministro, cuja celeuma criada curiosamente afastou evangélicos, enfureceu o marketing e o núcleo político do tucano e o fez recuar; teve a discussão sobre a manutenção das parcerias com Organizações Sociais (OS) na saúde e educação infantil, que pegou de tal forma que obrigou Haddad a ir às telas dizer que manteria os convênios.

A cartada derradeira foi revelada anteontem, em debate promovido pelo SBT e portal UOL, no qual Serra anunciou uma proposta que sequer consta em seu programa de governo, lançado há apenas dez dias: dobrar a validade do bilhete único de ônibus, de três para seis horas, com direito a integração com trens e metrô. A ideia foi formulada há poucos dias pelo próprio candidato para confrontar a proposta de criação de um bilhete único mensal feita por Haddad ainda no primeiro turno.

À época Serra se negava em entrevistas a comentar o bilhete petista, que depois sua propaganda tentou tachar de "bilhete mensaleiro". Hoje o tucano puxa assunto. "A expectativa de custo é de R$ 500 milhões por ano. Não tem encargo adicional, confrontando com a proposta do PT, que não abaixa o preço da passagem, implica em pagamento adiantado, não inclui ônibus e metrô e você paga mesmo quando fica em casa. É uma proposta absurda, feita unicamente para efeito de demagogia", afirmou Serra ontem, em visita ao Instituto do Câncer. A proposta ganhou grande espaço na sua propaganda de TV ontem, que também trouxe o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso se dizendo "testemunha do espírito jovem de Serra".

Quando de sua passagem para o segundo turno, Serra abriu os trabalhos disposto a trazer a repercussão do julgamento do mensalão para a disputa. Por dias seguidos falou na importância de "valores e companhias" para governar. Nas sondagens, não se viu resultado: a 1ª rodada de pesquisas do Datafolha para o segundo turno colocou Haddad 12 pontos percentuais à frente do tucano em votos válidos, diferença que se alargou nas avaliações seguintes e só diminuiu, dentro da margem de erro, nas última sondagem.

Este é outro ponto que muitas vezes tirou do sério a campanha tucana. Os trackings, pesquisas telefônicas feitas pelo staff tucano, sempre indicaram empate técnico, com os dois candidatos na casa dos 37%. "Em nenhum momento nos orientamos pelas pesquisas dos institutos. As nossas mostram um cenário de empate e 28% de indecisos. A pesquisa de rua, que mostra uma cartela com os nomes dos candidatos, praticamente obriga o entrevistado a escolher alguém", avalia o coordenador da campanha de Serra, Edson Aparecido. Segundo ele, no primeiro turno o tracking tucano praticamente cravou os resultados: errou o percentual de votos de Serra por 0,4%; de Haddad por 0,8% e de Celso Russomanno (PRB), terceiro colocado, por 1%.

Nos bastidores, tucanos dizem sem freios que uma possível derrota de Serra terá um culpado: o prefeito e aliado Gilberto Kassab (PSD), cuja administração mal avaliada é vista como uma âncora irremediavelmente presa ao candidato.

Se a estratégia de se contrapor ao PT no estímulo à parceria com as Organizações Sociais foi vista por seu grupo como uma cartada de mestre - Aparecido diz que pesquisas qualitativas mostraram que o eleitorado da periferia se mostrou especialmente preocupado - o debate sobre o kit anti-homofobia na disputa paulistana, estimulado pela atuação do pastor da Assembleia de Deus Silas Malafaia a favor de Serra, curiosamente provocou efeito inverso. Dias depois, 20 líderes evangélicos fecharam apoio a Haddad. A declaração de voto do goleiro do São Paulo Futebol Clube, Rogério Ceni, também provocou reação adversa. Três dias depois, dirigentes do Corinthians, da Portuguesa e do próprio São Paulo declararam apoio ao petista, completado ontem pelo jogador do Palmeiras, Marcos Assunção.

Prática que havia diminuído de frequência no primeiro turno, as brigas de Serra com jornalistas voltaram a ser constantes, no rádio e em entrevistas de rua. Levado ao contraditório, Serra saiu-se invariavelmente com o bordão "isso é pauta petista", bem como insinuações de que os repórteres trabalhavam para a campanha de Haddad. Ontem, a cena se repetiu com uma repórter de TV.

A condenação de petistas por formação de quadrilha no julgamento do mensalão deu novo fôlego ao tucano para voltar ao tema. Apostando no discurso do medo, Serra afirmou que uma vitória de Haddad no domingo abrirá aos condenados as portas da administração municipal. "Eles estão tinindo para vir agora se alojar em São Paulo. Os desempregados do mensalão, se o PT ganhar, já terão emprego aqui", disse.