Título: Polêmica do beijo marca reta final em Cuiabá
Autor: Zanatta, Mauro
Fonte: Valor Econômico, 26/10/2012, Política, p. A12

Em uma campanha marcada pela disputa entre o "milhão contra a máquina", Cuiabá viveu um segundo turno recheado de acusações mútuas, crise na saúde, uma inusitada "polêmica do beijo" e a presença maciça de figuras nacionais na tentativa de convencer os quase 400 mil eleitores da capital do rico Mato Grosso.

Favorito absoluto nas pesquisas desde o início de agosto, o industrial Mauro Mendes (PSB) chega às vésperas da contenda brigando voto a voto com o médico e vereador Ludio Cabral (PT). Há uma semana, pesquisa Datafolha apontava 48% a 43% para Mendes. O instituto Gazeta Dados deu ontem outra sondagem: 46% a 44% para Ludio.

Vencedor no primeiro turno por apenas 1,7 ponto percentual, Mendes surpreendeu. As sondagens eleitorais eram unânimes em dar seu adversário como o escolhido com ampla dianteira. Por isso, críticas aos institutos de pesquisa também marcaram o intervalo entre os dois turnos.

Em meio a ataques públicos, em debates e na propaganda na TV, os dois candidatos transformaram a cidade, pela primeira vez em seus quase 300 anos, em um ringue eleitoral nacional de forças políticas que estarão no jogo da sucessão federal em 2014. Na quarta-feira, o ex-presidente Lula arrastou 10 mil simpatizantes pelas ruas da capital em apoio a Cabral. Antes, vários ministros de Dilma Rousseff foram à cidade. A presidente gravou mensagem especial para Ludio. No outro lado, o governador pernambucano Eduardo Campos (PSB) e o ex-jogador e deputado Romário (RJ) reforçaram o palanque de Mendes. "Aqui, não dá para cravar quem vai ganhar", avalia o analista Alfredo Mota Menezes. E dá um exemplo: Mendes tinha, segundo a Gazeta Dados, rejeição de 41%. E reduziu o índice a 33% antes de 7 de outubro. "Agora, subiu para 37%".

A disputa por apoios federais é feroz: na TV, ambos usam Dilma para "garantir" aos eleitores recursos da União à cidade. "Ludio é do meu time", diz a presidente no programa de Ludio, coligado ao PMDB do governador Silval Barbosa. No palanque, Lula emendou: "Cuiabá tem a oportunidade de eleger um prefeito que conta com o apoio do governador, do vice-presidente Michel Temer e da presidenta Dilma Rousseff. Isso significa que vai ficar muito mais fácil as coisas acontecerem aqui em Cuiabá".

Na resposta, Mendes, apoiado pelos senadores Blairo Maggi (PR) e Pedro Taques (PDT), tentou neutralizar a tese do alinhamento obrigatório com palavras da própria Dilma: "Jamais olhamos a cor da camisa do prefeito, do governador. Sempre garantimos recursos", disse a presidente em uma cena de discurso antigo. E, em uma referência velada ao julgamento do mensalão, a campanha de Mendes arrematou com Eduardo Campos em seu palanque: "Ele tem time, está cercado de pessoas do bem".

No horizonte, estão claras as eleições de 2014. A sucessão estadual já começou. Tem Maggi, Taques e Silval como protagonistas. E dependerá do controle da capital. Um dado relevante foi percebido no Estado em 2012: apenas 31 dos 80 prefeitos que tentaram a reeleição perderam a disputa. Todos os políticos captaram o desejo de "mudança" dos eleitores. Cuiabá será sede da Copa de 2014, o que lhe deu visibilidade nacional. E pôs Mato Grosso no mapa das eleições presidenciais.

Mas o embate entre os partidos aliados no plano nacional causou desconforto à presidente. E Lula tocou no tema. "Ludio, quando você encontrar com a presidenta Dilma, agradeça a ela, porque depois da vinda do ministro Gilberto Carvalho, ela me ligou e falou para eu vir a Cuiabá te apoiar. Por circunstâncias políticas, ela não podia vir, mas eu estou aqui representando ela", disse Lula em praça pública.

A briga eleitoral ganhou contornos de novela com o episódio do "beijo polêmico". No intervalo de um debate, na semana passada, Mauro Mendes disse, em tom jocoso sobre um beijo de Ludio na esposa, que sua mulher era mais bonita que a do opositor. Ludio deixou de lado o figurino "paz e amor" inspirado no Lula de 2002, reagindo duramente. "Me respeite e fique no seu lugar", disse. As cenas, captadas pelas câmeras, foram parar no horário eleitoral da TV. E ajudaram a reforçar a imagem de arrogante colada no adversário e a desgastar sua imagem com as mulheres. Mendes foi obrigado a pedir desculpas ao casal na TV.

O episódio coroou o fim da fase "paz e amor" de Ludio. Hoje, um debate na afiliada da "TV Globo" pode ser decisivo para uma eleição tão disputada e sem um claro favorito.